» Cristiana Andrade
Enviada especial
Copenhague - Criar um fundo de no mínimo US$ 300 bilhões para que os países em desenvolvimento consigam se adaptar aos desafios impostos pelas consequências do aquecimento global; reduzir drasticamente o desmatamento de florestas; estabelecer um conjunto de ações nacionais de mitigação para os estragos já existentes e compartilhar tecnologias de ponta com quem não as detém. Esses são alguns dos principais desafios que começam a ser discutidos hoje em Copenhague, na Dinamarca, durante a 15ª Conferência das Partes da Convenção das Mudanças Climáticas. O desafio da Organização das Nações Unidas (ONU), que preparou o encontro entre os chefes de Estado, vai além de criar um fórum adequado para o debate sobre um tema de vital importância. A maior expectativa é de que dali saiam instrumentos e um cronograma para a implementação de planos com a meta de garantir a própria sobrevivência da humanidade.
[SAIBAMAIS]Está em jogo o comprometimento de cada país com o futuro - seja do ponto de vista ambiental, para assegurar condições mínimas de segurança alimentar aos mais de 6 bilhões de famintos ou para evitar que avancem as possibilidades de escassez de água potável. É preciso também se debruçar sobre a saúde pública, no que tange ao ressurgimento de doenças até então erradicadas em alguns locais, mas que com as mudanças climáticas voltam a assolar comunidades inteiras. Além disso, há a difícil tarefa de lidar com a pobreza extrema e as desigualdades sociais gritantes, em países que ainda estão se desenvolvendo economicamente como o Brasil, a Índia, a Indonésia, tendo que falar ao mesmo tempo em manter as árvores de pé. O desafio é dantesco. Muitos interesses políticos e econômicos estão envolvidos.
Otimismo
Para o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, nem tudo será decidido em Copenhague. "Mas estou bem mais otimista do que estava há dois meses. Acho que o Brasil teve um papel importante nas duas últimas semanas, quando anunciou suas metas, pois na sequência vieram os Estados Unidos e a China (que respondem juntos por 40% das emissões mundiais de gases causadores do efeito estufa, principalmente o dióxido de carbono), que estavam dando o abraço dos afogados, anunciando o naufrágio do encontro antes da hora e acabaram recuando; depois vieram as metas da Índia, da Indonésia e da Coreia. Fomos uma peça essencial, como no jogo de xadrez, provocando uma reação em cadeia. Agora, acho que ninguém vai tirar seus números, mas promover um avanço nessa discussão", diz.
Segundo a diretora de Mudanças Climáticas do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Branca Americano, vai estar tudo na mesa, principalmente a visão compartilhada que deve haver entre os países desenvolvidos e os em desenvolvimento, de mitigar os danos, adaptar às mudanças e à meta de redução, financiar nações mais pobres e compartilhar tecnologias de desenvolvimento limpo com quem precisa. "É preciso que a conferência crie uma sinalização mundial de mudança", comenta.
Os líderes europeus têm sido dos poucos a falar em dinheiro para financiar as adaptações necessárias às mudanças no clima. Recentemente, eles concordaram em defender uma "contribuição pública internacional" de até US$ 75 bilhões anuais até 2020, para financiar o combate ao aquecimento global nos países em desenvolvimento.
De acordo com o secretário-executivo do Fórum Mineiro de Mudanças Climáticas, Milton Nogueira, as convulsões no planeta podem ser irreversíveis se não forem adotadas metas agregadas de no mínimo 40% em termos de reduções de emissão de gases e medidas que evitem o aumento da temperatura na terra em mais 2ºC. "Como de 1990 para cá as emissões aumentaram muito, a redução real deve ser entre 60% e 70%. A nova regulação em relação ao Protocolo de Kyoto precisa sair dessa conferência", argumenta. As cartas estão na mesa. As organizações não governamentais vão pressionar, e muito, os chefes de Estado que estarão em Copenhague. Resta aos que decidem pensar globalmente, e não de forma imediatista, mas para as futuras gerações.
Entenda quais os principais pontos em discussão durante a COP-15
Redução de emissões
» O maior desafio é conseguir compromissos de redução de emissões de gases causadores do efeito estufa até 2020, um passo importante no objetivo fixado para 2050 de reduzir em 50% a emissão anual de dióxido de carbono (CO2). Reduzir essas emissões implica um custo econômico em termos de eficiência energética e de mudança para tecnologias menos poluentes, medida que a crise econômica mundial tornou ainda mais polêmica. Os países industrializados são responsáveis pela atual situação, mas também deve ser levado em conta o futuro papel das economias emergentes, como Brasil, China e Índia, que hoje são fonte de metade das emissões de CO2.
Financiamento
» A meta é angariar fundos para ajudar os países em desenvolvimento a migrarem para uma economia com menos emissões de carbono, além de medidas de adaptação às inevitáveis consequências das mudanças climáticas. Os países pobres querem que os industrializados prometam 1% de seus Produtos Internos Brutos (PIB) por ano. A União Europeia (UE) considera que serão necessários US$ 150 bilhões anuais. Em Copenhague, os países participantes tentarão encontrar uma solução provisória, com um princípio de financiamento de bilhões de dólares no início de 2010. Outro tema espinhoso é definir quais instituições serão encarregadas da gestão desses recursos. Os países pobres já expressaram suas críticas contra o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial.
Status legal
» Apesar dos vários encontros preparatórios, ainda não se chegou a nenhuma conclusão sobre o problema do status legal do futuro acordo. Os países em desenvolvimento querem que o Protocolo de Kyoto de 1997 seja estendido além de seu vencimento, em 2012. Entretanto, os Estados Unidos abandonaram esse protocolo, porque ele só é juridicamente vinculante para os países desenvolvidos, deixando de fora os emergentes e em desenvolvimento. Diante desse quadro, são duas as possibilidades: ampliar Kyoto, estabelecendo relações com os Estados Unidos, ou abandonar o Protocolo e adotar um novo acordo que inclua o país presidido por Barack Obama.
Desmatamento
» Os países com vastas florestas tropicais pressionam por um acordo que os ajude financeiramente a preservar os "pulmões" do planeta contra as emissões de CO2. No entanto, essa proposta enfrenta problemas técnicos, como, por exemplo, maneiras eficazes de medir a preservação e prevenir a corrupção e o desvio de dinheiro, garantindo que os recursos sejam de fato empregados para ajudar os países em desenvolvimento.