Acusado de promover violência, sedentarismo e alienação entre crianças e jovens, o videogame foi finalmente absolvido pela ciência. Graças ao Wii, console sem fios da Nintendo, que permite detectar movimentos em três dimensões, médicos e pesquisadores passaram a considerar o equipamento um grande aliado da boa forma. Recentemente, o Reino Unido deu o selo NHS Change4Life à plataforma de exercícios, reconhecendo, pelo Departamento de Saúde, que o Wii incentiva a prática de atividades esportivas e hábitos saudáveis. Agora, escolas britânicas pretendem incluir o game na grade de educação física, para alunos que, habitualmente, se sentem excluídos dos jogos tradicionais.
O grande atrativo do Wii é o controle remoto sem fio, conectado ao console por bluetooth. Os movimentos do jogador são captados e transmitidos por um sensor, fazendo com que a pessoa participe do game com seu próprio corpo, em vez de ficar apenas apertando botões. De olho nos potenciais esportistas virtuais, a gigante japonesa lançou o Wii Fit, com uma plataforma que permite se exercitar de diversas formas ; vai da ioga ao boxe ;, ao mesmo tempo em que se brinca.
Um grupo de pesquisadores da Liverpool John Moores University, no Reino Unido, resolveu testar o efeito do game nas crianças. Descobriram que a quantidade de calorias gastas por aqueles que adotaram o Wii é bem maior, se comparada a de meninos e meninas que jogam nas versões tradicionais ou preferem passar horas na frente da televisão. De acordo com o professor Tim Cable, principal autor do estudo, o uso regular do Wii ajuda a perder cerca de 13kg por ano. ;Ficou claro que o sensor que capta os movimentos pode ter impacto na saúde cardíaca das crianças, no seu gasto de energia e na quantidade de calorias queimadas;, disse ao Correio.
No estudo, ele analisou o impacto da brincadeira entre crianças de 13 a 15 anos. Quinze minutos de jogo no console tradicional fizeram com que a taxa de energia gasta pelos meninos subisse 60% em relação ao estado de sedentarismo. Já com os que usaram o Wii, o índice foi de 156%. No mesmo período de tempo, o primeiro grupo registrou, em média, 85 batimentos cardíacos por minuto. Os adeptos do Wii registraram 130. Considerando que as crianças britânicas ficam, em média, 12,2 horas jogando videogame, Cable calculou que o potencial de gasto calórico é de 1.830 kcal por semana ; 40% a mais que os consoles tradicionais.
Cable acredita que videogames com tecnologia semelhante ao Wii podem motivar crianças menos ativas a se movimentarem mais. Porém, ele lembra que isso não basta. ;Os pais devem encorajar seus filhos a fazerem outros exercícios e atividades ao ar livre para que as crianças levem uma vida bem balanceada;, diz.
A mesma opinião tem o professor de musculação e personal trainer da Companhia Atlhetica de Brasília Victor Reys. Há um ano, por insistência da namorada, ele comprou o Wii e aprovou. ;Você participa, interage, põe o corpo em movimento;, diz o professor, que gosta de jogar vôlei e futebol com os amigos na tela da televisão. ;Mas nunca vai substituir uma atividade física. Ele tira o conceito de sedentarismo do videogame, mas sempre é necessário ter um acompanhamento, alguém que te oriente e corrija seus erros. Se você fizer algo de errado, pode ter uma lesão;, lembra.
Colega de Victor, a professora Kamila Cabral experimentou o aparelho pela primeira vez na última sexta-feira e ficou empolgada. ;Achei muito legal, convidativo e divertidíssimo;, avaliou. ;É bom para crianças obesas, pelo fato de você não ficar sentado, de ter de se movimentar;, diz.
O gerente de tecnologia da informação Marcelo Almeida Gonçalves, 28 anos, faz natação e, mesmo depois de comprar o Wii e o Wii Fit, diz que não troca a atividade aquática pelo equipamento. Porém, reconhece que o esforço físico exigido pelo videogame é grande: ;Você sua mesmo;, conta. O que ele mais gosta é de jogar boliche com a mãe, de 56 anos. ;Nunca imaginei ver minha mãe jogando videogame. Agora ela até me chama;, diverte-se.
Febre britânica
Na Grã-Bretanha, a febre doWii chegou às aulas de educação física. Nesta semana, uma escola em Kent anunciou que vai adotar o videogame para alunos que não se adaptam aos jogos tradicionais. Apesar de receber uma enxurrada de críticas de especialistas e pais, o professor Aaron Brown, autor da ideia, explicou que, entre os 950 alunos da escola ; todos do sexo masculino ;, muitos não se sentem confortáveis em participar das atividades tradicionais, seja por causa do alto peso ou devido ao baixo desempenho nos esportes.
;Além disso, temos alguns estudantes que não podem fazer educação física por causa de deficiências físicas. Tem sido muito bom vê-los se exercitar novamente;, declarou ao jornal Daily Mail. A brincadeira, porém, não vai durar para sempre. A ideia da escola é que os alunos resistentes às aulas habituais façam uma espécie de treinamento no Wii durante seis meses, até que se adaptem à prática de esportes e passem a integrar os jogos tradicionais, disputados com outros colegas.
Já o ortopedista Fabio Ravaglia, membro do corpo clínico do Hospital Albert Einstein, é um entusiasta do equipamento. ;Principalmente as pessoas da terceira idade que não costumam se exercitar podem melhorar o equilíbrio e recompor a musculatura com o Wii;, diz. Apesar de considerar a atividade uma coadjuvante para jovens que, segundo ele, devem fazer exercícios ao ar livre, Ravaglia afirma que, levado a sério, o jogo é um aliado do organismo.
Há um ano, o médico comprou o console e gosta de correr, fazer ioga e boxe usando a tecnologia. ;Mas tem de fazer a atividade habitualmente;, diz. Ele lembra que, antes de começar, é preciso procurar um médico para avaliar possíveis lesões musculares e problemas cardíacos que impeçam a prática de exercícios.