Jornal Correio Braziliense

Ciência e Saúde

Começa na Espanha o último encontro preparatório para a COP 15

Barcelona ; Acabou o tempo de negociação. O aviso foi dado ontem pelo secretário executivo da Cúpula das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, Yvo de Boer. Em entrevista coletiva sobre a última reunião informal antes da 15; Conferência das Partes (COP 15) ; a ser realizada em dezembro, em Copenhague ;, ele afirmou que é inadmissível chegar à Dinamarca sem um acordo fechado. ;Imagine que você está fazendo uma construção. Em Copenhague, será preciso ter a planta pronta, para depois levantar o prédio;, disse.

;Nós temos apenas cinco dias para concluir as negociações. Somente cinco dias para acertar o texto final. Mas estou convencido de que isso pode ser feito;, afirmou, referindo-se ao evento em Barcelona, que se encerra na sexta-feira. Mas, para isso ser feito, de Boer lembrou que é necessário um compromisso sério dos países desenvolvidos, no sentido de traçar metas mensuráveis de redução das emissões de carbono na atmosfera.

O recado foi claramente para os Estados Unidos, que rejeitam, desde a assinatura do Protocolo de Kyoto, em 1997, um tratado internacional que obrigue os norte-americanos a perseguirem um percentual de reduções. ;Os países desenvolvidos precisam apresentar metas. E isso inclui os Estados Unidos;, destacou o secretário executivo. ;A comunidade internacional quer ver um resultado e, para isso, os Estados Unidos têm de aderir.;

Yvo de Boer também criticou as nações desenvolvidas por apresentarem propostas tímidas. De acordo com o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), os países industrializados deveriam reduzir entre 25% e 40% os níveis de emissão de carbono até 2020, comparado a 1990. Em 2005, o percentual necessário seria 50%. Mas, até agora, ninguém se comprometeu com isso. A União Europeia concorda com 30% nos próximos 10 anos, desde que os Estados Unidos entrem na cota. ;As metas dos países industrializados colocadas na mesa são claramente pouco ambiciosas;, alertou.

Ele ressaltou, porém, que, ao contrário da década passada, os Estados Unidos parecem mais dispostos a colaborar. Coisa que o chefe da delegação norte-americana, Jonathan Pershing, endossou. ;Os Estados Unidos vão se comprometer com um acordo ambicioso. Nos últimos 10 meses (período da gestão Barack Obama), nós fizemos mais pela busca de energia limpa e redução da poluição do que já havia sido feito na história do país;, afirmou.

Pershing observou que não é possível ;ignorar os avisos da ciência; sobre a necessidade de se combater imediatamente as emissões de carbono na atmosfera e garantiu que seu país tem pressa. Ele afirmou que o Congresso norte-americano está discutindo uma meta, que será apresentada em Copenhague. Mas, ao mesmo tempo, sustentou a ideia de que outros países devem fazer o mesmo ; a posição oficial dos EUA é que nações em desenvolvimento também se comprometam com metas mensuráveis. Já Yvo de Boer discorda: ;Precisamos de diferentes abordagens para diferentes grupos de países;.

Financiamento
O secretário executivo da Cúpula das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas também ressaltou a necessidade de se chegar a Copenhague com valores fechados para a criação de um fundo internacional pelo qual os países desenvolvidos financiarão tecnologias de baixo carbono para as nações em desenvolvimento, incluindo Índia, China e Brasil. O tema é um dos mais polêmicos da COP 15, porque ainda não se sabe de quanto será a conta ou quem exatamente a pagará.

A Espanha, que sedia o evento, saiu à frente e anunciou, ontem, que vai investir 100 milhões de euros nos próximos três anos para ajudar os países menos desenvolvidos a adaptar suas economias para um modelo de baixo carbono. A vice-presidenta, María Teresa Fernández de la Vega, anunciou o financiamento na abertura do congresso de Barcelona. Em seu discurso, ela disse que ;um futuro terrível; aguarda o planeta caso não se tomem medidas urgentes contra as mudanças climáticas.

O chefe da delegação norte-americana, Jonathan Pershing, também afirmou que os Estados Unidos pretendem colaborar com o fundo, embora não tenha citado cifras. De acordo com Pershing, o dinheiro sairia de fonte pública. ;Além disso, precisamos investir em inovações para ajudar os países menos desenvolvidos;, destacou. A flexibilidade das patentes de produtos e tecnologias limpas, porém, não foi discutida.

A ministra de Clima e Energia da Dinamarca, Connie Hedegaard, deixou claro que quer ver todas essas questões resolvidas rapidamente. A próxima presidenta da Conferência das Partes foi enfática em seu discurso de abertura: ;O mundo não pode mais esperar. Eu sei que fechar um acordo não será fácil agora. Mas alguém acredita que será mais fácil na próxima primavera, no próximo ano ou no seguinte? Vocês sabem que não;.

A repórter viajou a convite da organização da COP-15

; Tira-dúvidas

Por que é importante chegar a um acordo em dezembro, em Copenhague?
Segundo o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), as emissões de carbono na atmosfera estão aumentando e, se alcançarem um ritmo duas vezes maior que o do período pré-industrial ainda neste século, o mundo sofrerá os efeitos de um aumento médio de 3;C na temperatura. Esse cenário terá repercussões graves, como o aumento do nível do mar, mudança na vegetação e uma frequência e intensidade crescentes nos fenômenos climáticos extremos, como tempestades, secas e inundações. Chegar a um acordo na COP 15 é fundamental para a transição mundial de uma economia baseada em baixo carbono.

Por que todos os países precisam atuar em comum acordo?
Segundo a Organização Internacional de Energia (OIE), a demanda mundial de energia crescerá 55% em 2030. Se não for possível alcançar tecnologias para fontes energéticas limpas, as emissões de carbono subirão 50%, em vez de cair para 40%, como aconselham os estudos científicos. Copenhague deve estabelecer um marco jurídico e normativo que permita ao mundo fazer a transição para o desenvolvimento que resista às mudanças climáticas. Para isso, os governos precisam agir em cooperação.

Quais os principais elementos políticos essenciais para se chegar a um acordo em Copenhague?
Os países desenvolvidos devem aceitar reduzir as emissões de gases de efeito estufa, assumindo metas ambiciosas. Segundo o IPCC, a diminuição deve ser de 25% e 40% em relação aos níveis de 1990. Além disso, é preciso desenvolver ações de mitigação voltadas aos países em desenvolvimento. Para tanto, as nações mais ricas deverão financiar tecnologias de baixo carbono. Estimativas apontam que seriam necessários US$ 250 milhões por ano até 2020. Em Copenhague, será negociado um financiamento de US$ 10 milhões a um fundo voltado aos países em desenvolvimento.

Fonte: Organização das Nações Unidas

; Brasil define hoje proposta

Hoje é um dia decisivo para o Brasil em relação à sua participação na Conferência das Partes das Nações Unidas para Mudanças Climáticas (COP 15). O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai se reunir com o Itamaraty, ministérios do Meio Ambiente e de Ciência e Tecnologia e representantes da Casa Civil para definir o plano que será apresentado em Copenhague. Ontem, em Barcelona, organizações não governamentais brasileiras pressionaram o presidente a distância. ;Lula tem a chance de entrar para a história das Nações Unidas como vilão ou herói;, afirmou Gaines Campbell, representante da ONG Vitae Civillis.

[SAIBAMAIS]Enquanto o ministro Carlos Minc (Meio Ambiente) defende que o documento brasileiro apresente metas mensuráveis ; ele é favorável à redução de 40% do total de carbono que o país emitiria até 2020, além de 80% de queda no desmatamento ;, o Ministério das Relações Exteriores prefere que o país não se comprometa com números. Para o Itamaraty, o ideal é citar oficialmente a questão das florestas, deixando metas sobre CO2 para os países desenvolvidos.

As ONGs divulgaram uma carta na qual pedem o empenho de Lula em Copenhague. ;O Brasil tem um grande potencial de ser líder na economia verde, então devemos tomar uma posição que ajude a fortalecer um acordo eficiente;, afirmou o superintendente de Conservação do WWF-Brasil, Carlos Alberto de Mattos Scaramuzza.

O coordenador da campanha Amazônia do Greenpeace no Brasil, Paulo Adário, lembrou que o Congresso deve votar hoje a reforma do Código Florestal Brasileiro, defendida pela bancada ruralista. ;Lula é frequentemente citado como uma liderança internacional e, agora que o Congresso está conspirando contra a Amazônia, ele precisa mostrar que é também um líder interno;, disse. (PO)


; Protesto

Além das delegações oficiais de 175 países, o encontro preparatório para a 15; Conferência das Partes iniciado ontem em Barcelona é acompanhado atentamente por organizações não governamentais ambientalistas. O Greenpeace aproveitou o primeiro dia de reuniões para fazer um protesto em um dos principais monumentos da cidade. A entidade internacional pendurou nas torres do Templo Sagrada Família, projetado por Antoni Gaudí, faixas nas quais apelam aos líderes mundiais um compromisso maior com o meio ambiente e com o combate às mudanças climáticas.