Jornal Correio Braziliense

Ciência e Saúde

Ioga reduz significativamente os níveis de depressão e ansiedade nos praticantes

Há oito anos, a terapeuta Thais Godoy teve síndrome do pânico e, na tentativa de se livrar do problema, procurou a ioga. Gostou tanto que, de praticante, virou instrutora. Agora, ela acaba de comprovar, num estudo apresentado na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), que a atividade milenar surgida na Índia reduz significativamente os níveis de depressão e ansiedade.

Durante três meses, a pesquisadora do Instituto de Medicina Comportamental do Departamento de Psicobiologia da Unifesp comparou dois grupos de funcionários da mesma empresa, com idades entre 20 e 45 anos e com diferentes ocupações. Entre os que praticaram ioga, 68% apresentaram melhora na depressão e 76% relataram estarem menos ansiosos. Eles realizaram a atividade duas vezes por semana, durante 40 minutos. A técnica escolhida foi a ashtanga, na qual as posturas físicas preparam o corpo para a meditação e a respiração corretas.

Antes de os funcionários começarem as aulas de ioga, a pesquisadora mediu o nível de ansiedade, qualidade de vida e depressão de cada um deles com base em questionários de avaliação clínica. O grupo que iria praticar a atividade apresentou 24% de ansiedade no grau mínimo, 52% no moderado e 4% no grave. Depois de três meses, os índices caíram para 19%, 6% e 0%, respetivamente. Ao mesmo tempo, no outro grupo, que manteve a rotina, sem a prática da ioga, somente 7% relataram melhora nesse quesito. Para ter certeza de que os benefícios estavam ligados diretamente à ioga, Thais Godoy excluiu pessoas que tomavam medicamentos controlados e faziam psicoterapia.

;Eu sempre tive os relatos pessoais dos alunos de que estavam mais calmos e tranquilos, mas faltava a comprovação científica;, diz a pesquisadora, sobre a motivação para realizar o estudo. Ela explica que a ioga traz a melhoria na qualidade de vida dos praticantes por dois motivos essenciais: a respiração e a concentração. ;A respiração é a grande porta para acalmar fisiologicamente o organismo. Isso porque, quando a pessoa está irritada, o corpo trabalha em estado de alerta. A respiração adequada ativa o sistema parassimpático, diminuindo a frequência cardíaca;, diz.

Localizado no cérebro, o sistema parassimpático é responsável por estimular o organismo a reagir de forma calma diante das adversidades. Além da diminuição dos batimentos, também reduz a pressão arterial, a adrenalina e a concentração de açúcar no sangue. Por outro lado, a ioga, segundo Thais Godoy, melhora a concentração e, ao fazer isso, ajuda a organizar o fluxo de pensamento. ;Mesmo quem não acredita nos benefícios da ioga melhora com a prática, porque é uma resposta fisiológica do organismo. Mas é claro que o comprometimento da pessoa faz muita diferença;, diz.

Equilíbrio
A empresária Valéria Pereira da Silva, 43 anos, pode ser encaixada no grupo dos praticantes comprometidos com a ioga, atividade que descobriu em 2005. Ela conta que estava passando por problemas familiares e financeiros e decidiu se matricular num curso para tentar enfrentá-los. ;Minha vida mudou completamente. Mudei meu estilo de vida, alimentação, até mesmo as amizades ficaram melhores;, conta. Valéria diz que a ansiedade diminuiu pelo menos 60%, principalmente por causa dos exercícios de respiração. Ela gostou tanto que indicou a ioga para o amigo e também empresário Paulo Mello, 49. ;Na época, eu estava buscando um ponto de equilíbrio. Mas procurei mais a ioga porque tinha sofrido um acidente e precisava fazer alongamentos. Acabei descobrindo coisas mais profundas;, conta Paulo.

Instrutora de ioga há 40 anos, Margot Shalders conta que é comum receber em suas aulas pessoas deprimidas e ansiosas que, depois da primeira sessão, já relatam melhoras. ;A ioga foi criada por nossos ancestrais, pessoas que eram muito ligadas à natureza e ao universo. Elas tinham uma facilidade maior de ouvir seu interior. E é isso que a ioga faz com as pessoas;, explica. Margot, que começou a praticar com apenas 8 anos, conta que um de seus alunos conseguiu diminuir a dosagem de antidepressivo e que outro praticante que sofria de depressão e insônia gostou tanto que levou toda a família.

Complementar
A coordenadora de eventos Tatiana Curado, 29 anos, diz que também curou sua depressão por causa da ioga. ;Tentei várias terapias, mas foi com a ioga que comecei a sair do buraco onde estava. Me transformei em outra pessoa, tanto na parte física quanto no relacionamento com a família e com meu filho;, diz. A pesquisadora da Unifesp Thais Godoy lembra, contudo, que a atividade deve ser um complemento terapêutico e não uma substituição ao tratamento convencional. ;A ioga não cura, ela apenas ajuda. Por isso, as pessoas não devem deixar de tomar os medicamentos nem abandonar o tratamento de depressão;, alerta.

Mesmo para pessoas que não sofrem da doença, a ioga traz melhoras comportamentais, segundo a psiquiatra e neurologista da Universidade de Boston Chris Streeter. Ela fez um estudo comparando os níveis do neurotransmissor Gaba entre praticantes e não praticantes da ioga. Ao analisar o cérebro das pessoas que participaram da pesquisa com ressonância magnética de última geração, ela percebeu que, depois de uma hora de sessão de ioga, o cérebro apresentava níveis mais altos do neurotransmissor Gaba que, quando está baixo, associa-se à depressão e à ansiedade. O estudo foi publicado na revista especializada Journal of Alternative and Complementary Medicine.

;Nós detectamos um incremento de 27% nos níveis de Gaba daqueles que fizeram ioga, um aumento realmente significativo;, diz. No outro grupo, porém, nenhuma modificação foi identificada pelo aparelho de ressonância. Para ela, a prática pode, portanto, ser um excelente auxiliar no tratamento de depressão e ansiedade. ;Não estou dizendo para as pessoas chutarem suas medicações, mas aconselho que as utilizem em associação com a ioga e observem a melhora;, diz.

 

 

Ouça entrevista com a instrutora de ioga Margot Shalders :