Jornal Correio Braziliense

Ciência e Saúde

Cientistas americanos encontram fóssil do Raptorex kriegsteini, que habitou o planeta há 125 milhões de anos

Descoberta muda teoria sobre a evolução dos dinossauros carnívoros

Faltavam 55 milhões de anos para que os primeiros exemplares de Tiranossauro rex semeassem o terror entre suas presas no planeta. Na região onde hoje se localiza a Mongólia Interior, no norte da China, um animal até recentemente desconhecido da ciência já desempenhava esse papel. As dimensões reduzidas ; 3m de comprimento e 65kg ; não eram obstáculo à máquina de matar. Pelo contrário, até tornavam o grande réptil mais ágil na caçada a pequenos mamíferos e a outros dinossauros. ;Ele era bastante ágil ao perseguir sua presa de pé. Literalmente, corria, para então se abaixar e matar a presa com as mandíbulas alinhadas ao dente, como se fossem um facão;, contou ao Correio, por e-mail, o paleontólogo norte-americano Paul Sereno, cientista da Universidade de Chicago que detém 95% do fóssil do Raptorex kriegsteini. Naquele tempo, o clima na região era bastante morno e úmido. A geografia, repleta de grandes lagos, rodeados por florestas.

Para chegar até os restos do raptorex, foi preciso sorte e negociação. ;Um caçador de fósseis chinês descobriu o esqueleto em uma rocha no leito de um antigo lago. Os ossos foram transportados ilegalmente e comercializados nos Estados Unidos. Eu encontrei a pessoa que comprou o fóssil (o colecionador Henry Kriegstein) e a convenci a doá-lo para a ciência;, relatou Sereno. ;Em breve, o devolverei à China;, garantiu o especialista. A descoberta do antepassado do Tiranossauro rex ; uma versão compacta do réptil gigantesco ; provocou uma mudança nos paradigmas da paleontologia, especialmente no que diz respeito à evolução dos grandes dinossauros carnívoros.

De acordo com Sereno, o Raptorex kriegsteini tinha todas as características que permeiam seus grandes descendentes. ;Ele possuía dentes especializados em destroçar, a grande cabeça apresentava poderosos músculos das mandíbulas, os minúsculos membros dianteiros eram compensados pelos fortes e compridos membros traseiros;, afirmou. ;Ele também tinha um bulbo expandido no cérebro, que lhe permitia farejar a presa;, acrescentou o paleontólogo. A equipe de Sereno conseguiu recuperar 95% do fóssil ; a ossada estava em excelente estado de conservação e apenas o fim da cauda não foi encontrado. Enquanto o raptorex habitou o planeta há 125 milhões de anos, o ;neto; tiranossauro viveu entre 68 milhões e 65 milhões de anos atrás.

Inesperado

Até então, a ciência imaginava que os primeiros exemplares de Tiranossauro rex moldaram suas próprias características, à medida que se tornavam maiores. O animal mais famoso do período cretáceo pesava entre 4t e 8t e media 14m. ;Agora, sabemos que os tiranossauros eram parte de um amplo padrão predador, que surgiu, primeiro, em um corpo pequeno;, explicou Sereno. Tal padrão incluía pequenos membros dianteiros e um imenso e perigoso conjunto de mandíbulas. ;Os dinossauros carnívoros não podiam ter tudo o que queriam. Por isso, diminuíram seus membros dianteiros, de forma a reduzir o peso e a massa durante a perseguição à presa.;

Esse mecanismo evolutivo era ignorado pela paleontologia. O tiranossauro ganhou 100 vezes em tamanho e herdou os membros quase atrofiados do raptorex. Além da Ásia, o ;novo dinossauro; dominou o nicho ecológico predatório na América do Norte até ser extinto e jamais coabitou o planeta com seu sucessor. Paleontólogo do Museu Americano de História Natural de Nova York e coautor do artigo publicado na revista científica Science, Steven Brusatte disse ao Correio que o fóssil era completamente inesperado. ;Ele mostra que as proporções do corpo do Tiranossauro rex e de outros tiranossaurídeos ; a cabeça grande, a mandíbula poderosa e os braços pequenos ; estavam presentes em animais muito pequenos, que viveram 55 milhões de anos antes;, comentou.

Segundo Steven, os cientistas imaginavam que todos os padrões dos tiranossaurídeos surgiram como consequência de um grande corpo. ;À medida que se tornaram colossais, eles teriam de redesenhar seu esqueleto, a fim de funcionar em um corpo enorme e se alimentar de presas grandes;, teorizou. A teoria, no entanto, mostrou-se falsa: o grupo dos tiranossauros se compôs de animais muito pequenos durante a maior parte de sua história evolutiva. ;Os grandes tiranossaurídeos não evoluíram até cerca de 80 milhões de anos atrás.;