A proposta do biossurfactante é eliminar manchas provocadas por vazamentos de petróleo ou qualquer produto derivado dele de maneira eficiente, e com vantagens ambientais. Em contato com o alvo, o detergente cumpre seu papel sem agredir a natureza, pois vira comida de bactéria em no máximo três dias. ;Ele age como uma solução emulsionante (que faz o óleo se dispersar), produzindo pequenas gotículas que, aos poucos, vão ficando dispersas e, com o tempo, são digeridas biologicamente;, explica Cristiano Borges, um dos coordenadores do estudo e pesquisador do Instituto Alberto Luiz Coimbra (Coppe), ligado à UFRJ.
Porém, até chegar ao produto final, os pesquisadores descobriram que as bactérias precisavam ser alimentadas com nutrientes e de forma balanceada. ;Nesse caso, elas passaram a desenvolver o detergente em abundância. Isso só foi possível depois do estudo de diversos parâmetros, como fontes de carbono, de nitrogênio, do PH do meio e da temperatura;, explica a professora responsável pela pesquisa, Denise Freire, do Instituto de Química da UFRJ.
Durante os cinco primeiros anos de pesquisa, os cientistas se dedicaram ao desenvolvimento do melhor meio para que as bactérias conseguissem excretar o produto da forma desejada (veja abaixo). A ideia, depois disso, era iniciar a aplicação do detergente em larga escala e não apenas em laboratório. Um dos testes também chegou à conclusão de que o uso da glicerina como substrato para a produção do biossurfactante se justificou pela relação custo-benefício. ;Ela é um subproduto da produção do biodiesel e pode ser encontrada em abundância, o que acabou reduzindo custos. A bactéria aceitou bem a glicerina e, depois de alimentada, passou a produzir bastante biossurfactante;, explica ela.
A intenção de aumentar a quantidade desse detergente ; feito a partir da fermentação de bactérias ; fez com que os pesquisadores percebessem que o excesso de espuma produzida pelo líquido, em estado bruto, era um problema a ser resolvido. ;Isso porque a produção inicial era de 10l, em escala laboratorial. Com o tempo, passamos a usar equipamentos maiores como os reatores e hoje passamos a produzir 200l por semana;, afirma o pesquisador do Coppe Frederico Kronemberger.
A partir daí, entrou em cena um contactor de membranas, resultado da tese de doutorado de Kronemberger. O equipamento passou a ser usado para o controle da concentração de oxigênio dissolvido naquele meio e conseguiu reduzir a espuma. ;Superamos o problema da oxigenação do processo, a solução encontrada para a produção em larga escala. Sabemos que quanto maior é a produção, mais baixos são os custos;, conta. As pesquisas ainda revelaram que o uso de biossurfactante para outras finalidades é possível. ;A indústria de cosméticos poderia ser uma das beneficiadas. Porém, é bom lembrar que, antes disso, o produto deve passar por um processo de purificação;, esclarece Denise.
Desastres
Acidentes ambientais envolvendo derramamentos de óleo são frequentes no Brasil e no mundo. A própria Petrobras já foi responsabilizada por alguns episódios, incluindo um vazamento de 4 milhões de litros de óleo de uma refinaria da empresa, no Paraná. Ocorrido há nove anos, o acidente foi considerado um dos maiores desastres ecológicos do país.
O material escapou de um duto na refinaria Presidente Getúlio Vargas, no município de Araucária, e espalhou-se pelos rios Barigui e Iguaçu até chegar à cidade de Balsa Nova. Segundo informações, as manchas negras chegaram a cobrir o leito dos rios. Algumas aves e mamíferos ficaram com o corpo todo coberto por óleo. Hoje, a Petrobras esclarece, em sua página na internet, que possui infraestrutura adequada para combater o derramamento de óleo no mar. Para isso, a empresa conta com centros de combate à poluição e defesa ambiental.
Depois de um incidente na Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, também ocorrido em 2000, a empresa tomou novas medidas e mantém embarcações que patrulham as águas da baía. O Correio entrou em contato com a Petrobras, mas até o fechamento desta edição não havia recebido retorno.
Ouça entrevista com a pesquisadora Denise Freire, da UFRJ, sobre a criação do detergente biodegradável: