O Instituto Nacional de Câncer (Inca) relata que os tipos de tumores malignos relacionados aos hábitos alimentares estão entre as seis primeiras causas de mortalidade relativa à doença no país. Nutricionistas e médicos alertam que o brasileiro perdeu a referência do que é saudável. As crianças são reféns de papinhas, sucos industrializados, biscoitos e salgadinhos. Os jovens são campeões no consumo de hambúrgueres, salsichas e batatas fritas ; produtos que oferecem riscos por terem em sua composição níveis significativos de agentes cancerígenos. Os idosos são levados pelo turbilhão da má alimentação, não apreciam nem reconhecem o sabor do que está a disposição nas prateleiras dos supermercados e em grande parte dos restaurantes, mas acabam comendo o mesmo que filhos e netos.
Para Fábio Gomes, nutricionista da Coordenação de Prevenção e Vigilância do Inca, a alimentação industrializada está no cardápio mesmo em localidades remotas ou interioranas, onde o consumo de legumes e frutas regionais costumava ser maior. ;O apelo da publicidade da indústria alimentícia é devastador. E isso pode ser observado tanto nas classes sociais mais abastadas quanto nas menos favorecidas. Na cabeça das pessoas, os produtos industrializados simbolizam o desenvolvimento. Elas esquecem apenas que o custo para a saúde é muito alto;, pondera.
Gomes explica que o sal, os nitritos e os nitratos que compõem os alimentos processados têm ação carcinogênica e mutagênica. Em palavras simples, eles expõem o organismo ao câncer e outras doenças. ;Exatamente o oposto ocorre no corpo de quem ingere frutas, legumes e cereais em quantidades ideais. ;Por diversos mecanismos, esses itens inibem a mutação de células que desencadeiam o câncer ou atuam de forma a dificultar a multiplicação delas;, revela.
A vida mudou
O especialista lembra ainda que os hábitos alimentares dos brasileiros já foram melhores. ;O acesso aos produtos processados era muito menor, por isso consumíamos mais alimentos frescos e saudáveis. As refeições eram preparadas em casa e as pessoas dedicavam tempo a elas. Almoçar e jantar era prazeroso, e não apenas um pit stop;, afirma. Hoje, os hábitos que comprometem a saúde começam muito cedo. Estudo recente da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) com 270 famílias constatou que, antes de completarem 2 anos, 67% das crianças já tinham o costume de tomar refrigerantes e 70% comiam biscoitos recheados regularmente.
A nutricionista do Hospital de Apoio de Brasília Marta Evangelista concorda com o colega do Inca. ;A vida mudou, está muito corrida e as pessoas se alimentam fora de casa. Fibras, verduras, frutas e hortaliças foram substituídas. Com isso, alimentos mais ricos em gorduras, açúcares e conservantes vão para o prato com mais frequência. A saúde paga o preço. Notamos que, cada dia mais, as doenças que atingiam a terceira idade surpreendem indivíduos muito jovens;, aponta ela.
O economista Adriano Pereira de Paula, 45 anos, acaba de se livrar de um câncer. Ele confessa que a qualidade dos itens que iam para o prato não era uma prioridade em sua vida. ;Comia poucas frutas e verduras e a variedade era negligenciada. Quando soube da doença, passei a cuidar melhor da alimentação. Foi um dolorido processo de aprendizagem, mas tenho certeza de que a ingestão de alimentos saudáveis contribuiu no combate à doença. Hoje, estou curado e o meu cardápio está cada dia mais colorido, principalmente com alimentos que fortalecem as minhas defesas;, diz.
Para os especialistas, quase sempre há tempo para se correr atrás do prejuízo. ;É difícil porque, quando falamos em prevenção, buscamos qualidade de vida a longo prazo, mas é mais cômodo enxergar somente o presente;, lamenta o nutricionista Fábio Gomes. Segundo ele, carnes processadas, refrigerantes e biscoitos industrializados deveriam ser banidos do cardápio.
"O acesso aos produtos processados era muito menor, por isso consumíamos mais alimentos frescos e saudáveis. As refeições eram preparadas em casa e as pessoas dedicavam tempo a elas. Almoçar e jantar era prazeroso, e não apenas um pit stop;
Fábio Gomes, nutricionista da Coordenação de Prevenção e Vigilância do Inca
O número
400 gramas - Quantidade diária de frutas, verduras, hortaliças, grãos e cereais recomendada pela OMS