Jornal Correio Braziliense

Ciência e Saúde

Laboratório-residência na Amazônia se torna exemplo de habitação ecológica

A preocupação com o meio ambiente deixou de ser exclusividade de ambientalistas, ecologistas e cidadãos conscientes. Na busca por um mundo melhor, a sustentabilidade se tornou uma opção viável para diversos setores de atividade, com destaque para a construção civil, que, há algum tempo, vem fazendo uso de materiais ecologicamente corretos em vários projetos. Um bom exemplo das alternativas ;verdes; existentes para o setor é o mais novo laboratório flutuante do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (IDSM) na Amazônia. Ancorada desde junho passado na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Amanã, localizada entre os rios Negro, Japurá e Solimões, a casa ; uma das 16 bases do instituto na região ; se tornou a primeira sede de pesquisa ecológica na área, de 2,3 milhões de hectares.

Telhado produzido a partir de garrafas PET, estrutura toda feita de madeira certificada pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e de Recursos Naturais Renováveis (Ibama), energia 100% solar e aproveitamento da água das chuvas são alguns dos recursos usados no projeto do laboratório-residência (veja arte). Desde a inauguração, pelo menos 50 especialistas que se dedicam a estudos na reserva, além da própria comunidade local, tiveram a oportunidade de usufruir da casa, que tem quartos, cozinha, banheiro, sala para computadores e estudos.

A cada 20 dias, a pesquisadora do IDSM Priscila Pereira sai de Tefé (AM), sede do instituto ; vinculado ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) ; e vai até a reserva de Amanã para dar continuidade ao censo e monitoramento da fauna local. Durante o tempo que fica na reserva, Priscila percorre as cinco trilhas existentes, coletando informações que mais tarde serão comparadas com o trabalho desenvolvido por moradores das comunidades ribeirinhas, que também colaboram com projetos do instituto. Segundo a pesquisadora, grande parte da população vive da caça e da pesca de animais, por isso a importância de um monitoramento eficaz no local. ;A casa recém-inaugurada tem condições de proporcionar uma excelente estada. A construção ainda desperta a curiosidade e também conscientiza os moradores da região sobre a correta destinação do lixo;, afirma.

Estudo de mamíferos aquáticos e projetos de educação ambiental voltados para os moradores da região, conduzidos por funcionários do Ibama, também são ações em andamento na reserva. ;Além disso, a própria casa flutuante acaba sendo uma grande pesquisa, pois tudo nela é monitorado. Fazemos a medição da energia e coleta de dados no sistema de captação de água, por exemplo. Dentro de seis meses, teremos resultados comparativos;, afirma o coordenador de operações do instituto, Josivaldo Modesto. De acordo com ele, a casa foi construída em Tefé e, depois de pronta, conduzida por três embarcações até a reserva, num percurso de 80km pelos rios Solimões e Japurá. ;No momento, estamos testando a possibilidade de levar o sinal da internet para o local. Inicialmente, ele seria transmitido de Tefé com equipamentos específicos;, conta.

Paliativo
Construções ecologicamente corretas se tornaram mais comuns com o alerta lançado por ambientalistas e cientistas a respeito dos danos causados pelo acúmulo do lixo e alterações no clima. No entanto, segundo o professor da faculdade de arquitetura da Universidade de Brasília (UnB) Jaime de Almeida, a área carece de regulamentações. ;Há uma boa aceitação sobre a aplicação de materiais não convencionais em projetos arquitetônicos. Porém, ainda falta normatização, assim como acontece com os produtos que estão no mercado;, diz Almeida, também diretor do Centro de Pesquisas e Aplicação do Bambu e Fibras Naturais.

De acordo com ele, a qualidade de um telhado feito com garrafas PET, assim como o que foi usado na casa flutuante da Amazônia, é a mesma de um telhado convencional, produzido com o barro. Apesar de defender o uso desses materiais, o arquiteto chama a atenção para uma necessidade maior: a mudança de hábito da população mundial. ;As pessoas estão acostumadas a consumir desenfreadamente e não percebem que o acúmulo do lixo está diretamente ligado a esse hábito. Por isso, a reciclagem acaba sendo uma medida paliativa, que não deveria ser tão necessária nos dias de hoje;, afirma.