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Visual bonito e boa comida

Nos 60 anos de vida, o Cota Mil inova ao criar o Trust-Gastronomia Segura para esses tempos de pandemia. São 40 cabines montadas à beira do lago, com todo o protocolo de segurança e higienização


Há mais de um século que o lago foi pensado. O agrônomo e engenheiro Luis Cruls em seu relatório sobre o Planalto Central, escrito em 1896, recomenda “uma obra de arte” para represar as águas do Rio Paranoá, transformando-o em um lago de até 25 quilômetros de comprimento. Apesar de trazer umidade e hidratação para uma região tão seca, houve gente que foi contra, detonando a ideia da construção de um lago artificial nos anos 1950. Como o escritor Gustavo Corção, surpreendido por um telegrama, enviado pelo próprio presidente Juscelino Kubitscheck, avisando-o sobre o fim da empreitada. O texto, bem ao estilo de JK, dizia: “Encheu, viu?”.

E quando encheu, depois de um trabalho intenso de centenas de candangos — muitos perderam a vida na edificação da barragem —, que tiveram ainda de desmatar o cerrado para que a madeira apodrecida debaixo d’água não empesteasse o meio ambiente. A cota máxima de água chegou a mil metros acima do nível do mar, daí surgiu o nome do clube Cota Mil.

Nova experiência

Fundado em novembro de 1959 (antes da inauguração de Brasília), o Cota Mil Iate Clube está vivenciando os 60 anos com um duplo papel, ligado à gastronomia, e bastante diferente dos outros clubes, que se fecharam em copas, devido à pandemia.

Desde meados de julho, funciona lá um restaurante de cabines isoladas chamado Trust-Gastronomia Segura, que serve todos os dias, mas só à noite, a partir das 18h, um menu enxuto de apenas três opções — carne, massa e frutos do mar — levado até o cliente, na bandeja, por um garçom que não entra na cabine. O cardápio foi desenvolvido pela técnica em gastronomia formada no Iesb Ketty Carvalho, a mesma chef que atua no bufê do clube.

Destaque para a entrada de camarão empanado na farinha panko, o prato de bacalhau confitado no azeite com legumes e batatas ao murro e uma sobremesa de musse de chocolate com nozes. Ainda tem um filé ao vinho do porto com risoto de grana padano e ravióli com queijo e damasco ao molho de tomates frescos. Os pratos podem harmonizar com cerveja ou com vinhos da Del Maipo, presentes no menu. Os proprietários Mauricio Rodrigues e Ygor Brito acertaram em oferecer confiança, as 40 cabines montadas junto ao lago (para duas ou quatro pessoas) estão com reversas lotadas até a metade de agosto. Além do menu, você paga R$ 11 pela taxa de higienização. Segundo Maurício, a experiência durará quatro meses. As reservas podem ser feitas pela Bilheteria Digital.

Retomada

Desde que levou uma estocada potencialmente fatal na crise desencadeada pela covid-19, a gastronomia brasiliense tenta retomar o rumo e uma das ferramentas é o Brasil Sabor Delivery, no qual participam 122 restaurantes com cardápios diversificados até 20 de agosto. No festival, há ainda uma atraente programação que é a Cozinha Show. Nela, oito renomados chefs da cidade exibem suas artes culinárias de uma forma bem didática para que você aprenda e consiga desenvolver em casa a receita da aula.

E onde foram gravadas as aulas? No promontório do Cota Mil, aquele mirante de onde se tem uma bela vista do Paranoá, a partir do embarcadouro lotado de lanchas e iates. A Abrasel, promotora do festival, representada pelo presidente Beto Pinheiro, se sente agradecida pelo apoio do clube numa época que “está difícil obter qualquer patrocínio” e também pelo apoio do Iesb, que montou uma equipada cozinha para gravar as aulas.

O resultado está no ar e começou com a mais inquieta dama da gastronomia brasiliense, Mara Alcamim, ensinando um clássico filé-mignon acebolado com alho crocante e seguiu com o cobiçado ceviche de peixe-branco cozido no limão à moda peruana de Lui Veronese. A imbatível bacalhoada portuguesa de Renata La Porta, que está sendo apontada como um dos destaques do festival do delivery, encerra o trio de aulas, que prossegue com o jovem chef Diego Badra focando o tema “a vaca atolou no mangarito”.
 
 
 
Mais história

Os vídeos não mostram toda a locação. Mas foi ali que tudo começou. A origem do clube não é náutica, como se poderia supor. O lugar serviu para abrigar o desmembramento do Clube de Cinema, tocado por um grupo de pioneiros que tinha à frente a jornalista Talita Aparecida de Abreu, primeira colunista social do Correio Braziliense, que assinava com o pseudônimo de Katucha. A primeira sede foi uma pequena casa de madeira que ficou embaixo d’água quando o lago subiu, daí os cinéfilos terem pedido para Sérgio Bernardes fazer o projeto. Quando estava pronta a obra, que não tinha seguido fielmente a concepção, o arquiteto se irritou ao ver a casa e bradou: “Isto aqui não é Cota Mil. É Cota Três.”

Todas essas histórias foram contadas nas edições comemorativas ao aniversário do Correio, que é o mesmo da cidade. Brasília, aos 60 anos, pode-se dizer que está completa, até mesmo em relação à gastronomia, com a presença de importantes chefs que, por esses dias, compartilham técnicas e segredos sem qualquer custo ao espectador. Amanhã, Gil Guimarães ensina receita de “arroz com ingredientes típicos do cerrado, com carne de lata, linguiça e ovo caipiras, cogumelos e vinagrete de limão capeta e por cima coloco castanha de baru para dar uma crocância, tá bem gostoso o prato”, garantiu.

Outra pegada forte do cerrado, quem dá é o chef Leo Hamu ao preparar costelinha suína, que já é de sua lavra, com molho barbecue de jabuticaba e batatas ao murro no vídeo do dia 9 de agosto. Na última semana, irá se apresentar dia 14, o chef Zé Carlos que, apesar de mineiro, sabe preparar um bom sushi. Ele começou como chapeiro no Maki San e agora está ensinando como preparar um combo com as pequenas delícias japonesas.

Professor consagrado, o argentino Sebastian Parasole veio a Brasília integrando a equipe de gastronomia no lançamento do curso do Iesb. Atualmente, ele é o coordenador geral e fará uma receita de feijão-verde, caldo de cebola, pimenta-de-cheiro com purê de batatas e raspas de mexerica no domingo, 16 de agosto. Para conferir os vídeos é só acessar o canal YouTube da Abrasel.

Turma de fora

Outra força grande que recebeu a Abrasel foi do Sebrae, que tomou a iniciativa de promover uma sequência de lives com a participação de grandes chefs fora de Brasília, além de ofertar consultorias gratuitas para “apoiar a retomada do segmento em meio à crise econômico provocada pelo novo coronavírus”, explicou Beto Pinheiro, dirigente da entidade que congrega bares e restaurantes no Distrito Federal.

Tendo como tema Inspire, tempere e experimente, cinco chefs de peso protagonizarão lives a partir de hoje, com a estreia, às 20h, de Henrique Fogaça, criador da grife Cão Véio e famoso jurado do Masterchef. Quinta-feira, dia 6, às 16h, será a vez do paulista Alex Atala, cujo restaurante D.O.M. está sempre presente no ranking dos 50 melhores do mundo. Dia 10, às 19h30, iguaria francesa terá o passo a passo compartilhado por Erick Jacquin, outro jurado do Masterchef e dono do novo restaurante Président, em São Paulo.

Dia 12, às 16h, se apresenta o chef multimídia Edu Guedes e no dia 18, uma terça-feira, encerra a sequência o chef Felipe Bronze, conhecido pela cozinha de vanguarda. A transmissão das lives é gratuita e para acompanhá-las, os interessados precisam acessar o site www.minhapalestra.online/sebraedf e preencher um formulário. Por meio da plataforma também será possível encaminhar perguntas que serão respondidas pelos especialistas.