Cidades

Discussão sobre cobrança avança

O projeto Zona Verde prevê tarifa de até R$ 5 para quem estacionar veículos em áreas de Brasília. Ontem, a medida foi tema de audiência pública e será apresentada, na próxima semana, para procuradores do MPDFT e para deputados distritais



A cobrança em estacionamentos públicos no Plano Piloto caminha para tornar-se realidade na capital. O projeto, de autoria do Governo do Distrito Federal (GDF), passou por audiência pública on-line, na manhã de ontem, conduzida pelo próprio Executivo local. Os principais objetivos da medida são incentivar o uso do transporte público e desafogar os pontos de aglomerações de veículos. A proposta será avaliada pelo Legislativo, Tribunal de Contas (TCDF) e Controladoria-Geral do DF (CGDF), antes da publicação do edital de licitação, que segue sem previsão. Apesar da fase inicial, a possibilidade de cobrança de tarifa gera controvérsia entre os brasilienses, que divergem de opinião sobre o tema.

O projeto, batizado de Zona Verde e conduzido pela Secretaria de Transporte e Mobilidade (Semob), divide os estacionamentos do centro da capital em quatro grupos e estabelece um valor, de até R$ 5, para cada um deles. Além disso, os pontos terão regras específicas, como a duração de permanência dos veículos (veja Detalhes). Uma empresa privada será responsável pela implementação do sistema, e a estimativa da pasta é de que todos os ajustes para que a tarifa comece a ser cobrada fiquem prontos em três anos.

Ontem, durante a audiência pública, representantes da Semob apresentaram o plano de execução da Zona Verde. No período de implementação, serão investidos R$ 300 milhões pela concessionária. O montante será utilizado para a criação das zonas, compra de equipamentos, pintura e revitalização de alguns trechos. A outorga inicial será de R$ 785,8 milhões. A expectativa é de que, após entrar em funcionamento, o projeto gere R$ 250 milhões. O contrato com a empresa vencedora da licitação será de 30 anos, sem possibilidade de prorrogação. Além disso, a ganhadora pagará taxas de fiscalização e cederá 20% das receitas não-tarifárias ao Poder Público.

De acordo com o secretário executivo de Mobilidade, Luiz Felipe Carvalho, após a audiência pública, o projeto será discutido com outros órgãos da capital. “Agendamos uma reunião com procuradores do MPDFT (Ministério Público do Distrito Federal e Territórios) na quarta-feira. Na semana que vem, vamos fazer uma apresentação para todos deputados distritais e estamos marcando com a bancada federal do DF. Nossa intenção é receber o maior número de contribuições”, frisa.

Ao Correio, a Semob informou, por meio de nota oficial, que o projeto faz parte de uma proposta mais ampla de melhoria do sistema de transporte da capital. Entre as medidas, estão a implantação do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), a modernização e aumento da capacidade do metrô, a reforma da Rodoviária do Plano Piloto, obras de construção, reforma ou revitalização de calçadas, estacionamento e ciclovias. A pasta esclareceu que não há data para a licitação da Zona Verde.


Investimento

O professor de engenharia de tráfego da Universidade de Brasília (UnB) Paulo Cesar Marques explica que o projeto é necessário no Distrito Federal, entretanto, precisa de ampla discussão, antes que possa sair do papel. “A reação tem sido muito negativa da população. Isso mostra que é preciso que o tema seja debatido com muito tempo. A proposta precisa de um período de maturação”, reforça. De acordo com ele, a essência da Zona Verde é positiva: cobrar por um espaço público, que é usado como privado.

O estudioso ressalta que o transporte público de Brasília não é de boa qualidade, comparado com outros países. Segundo Paulo, o ideal seria que o dinheiro arrecadado com a cobrança em estacionamentos fosse revertido em investimento na mobilidade urbana da capital. “O dinheiro não deveria ser usado para outra coisa. O projeto, entretanto, será conduzido por uma empresa privada, que fica com a maior parte do recursos”, critica.

Para o especialista, a população deve ter o sentimento de responsabilização pelo espaço ocupado pelo próprio veículo. “Só porque tenho carro, não quer dizer que posso usar o espaço público de graça”, argumenta. Paulo, entretanto, avalia que o momento pode não ser o ideal para a discussão. “Devido à pandemia, o transporte público, por conta de condições, como a lotação, apresenta um grande fator de risco. É necessário que se mostre as vantagens do projeto para ganhar o apoio da sociedade. Agora, o governo precisa aproveitar a ideia, pensar em prazos que sejam razoáveis e debatê-la profundamente”, aconselhou.

Debate


Entre os brasilienses, a possibilidade da cobrança de tarifas em estacionamentos públicos gerou divergência de opiniões. A estudante Isabela Souto, 21 anos, afirma que, se a taxa implicar em melhoria para a cidade, a proposta pode ser positiva. “O ideal é, a partir da arrecadação, trazer pistas e estacionamentos melhores, com mais segurança, além de investir no transporte público. Caso siga essa linha, será uma ideia boa”, destacou. A moradora da Asa Norte considera que há pouca oferta de coletivos no Distrito Federal.

Por outro lado, a servidora pública Waleska Loureiro, 32, diz que a cobrança vai fazer diferença no bolso do brasiliense. “Vão ser mais de R$ 10 por dia e, ainda, tem os custos com a gasolina. É capaz que fique mais caro que uma visita ao shopping”, protesta. Entretanto, a moradora de Águas Claras reconhece que, se ocorrerem melhorias na segurança e na infraestrutura da cidade, a medida pode ser válida. “Trabalho no Setor de Autarquias e enfrento muitos problemas de estacionamento”, lamenta.


Tombamento protegido
A Secretaria de Transporte e Mobilidade do Distrito Federal (Semob) garantiu que a empresa responsável pelas obras da Zona Verde deverá respeitar o tombamento de Brasília. Ao Correio, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) informou que a instalação de parquímetros, por exemplo, como elemento mobiliário urbano, não fere o tombamento. Entretanto, a entidade ressaltou que “será necessário analisar, oportunamente, as repercussões que esta ação pode gerar no sistema viário existente”.