O Distrito Federal ultrapassou, esta semana, os cem mil casos confirmados do novo coronavírus. No mesmo período, a capital registrou também a maior média móvel de diagnósticos positivos da doença: 2.092. Um valor 18% maior que o pico anterior, do dia 30 de junho, que foi de 1.978. Ainda chama a atenção, durante os mesmos dias, a quantidade de casos ativos do vírus. Nesta sexta-feira (31/7), são mais de 16 mil infectados que ainda estão com o vírus ativo.
As informações são dos doutores Breno Adaid e Thiago Nascimento, pesquisadores da Universidade de Brasília (UnB), do Departamento de Ciência do Comportamento, e coordenadores do mestrado em Administração do Centro Universitário Iesb. Os dois, junto ao estudante de estatística César Galvão, acompanham os números da pandemia no DF.
“Tivemos um crescimento da média móvel máxima de novos casos nas últimas semanas, após a reabertura dos bares e restaurantes em 15 de julho. O DF atingiu um novo topo histórico na terça-feira (28/7), o que elevou o valor para 2.092. Apesar de uma queda nos três dias seguintes (29/7, com 2069; 30/7, com 2062; e 31/7, com 1985), ainda continua maior que a semana anterior e maior que o recorde anterior, de 30 de junho, que foi de 1.978”, afirmou Adaid.
Especialista em análise de dados quantitativos, Adaid explicou que houve uma aceleração clara entre as semanas de 21 e 28 de julho. “E, nos últimos três dias, caiu levemente essa média móvel de novos casos. Contudo, ainda não podemos cravar que temos uma descendência ou mesmo dizer que estamos diante de uma nova aceleração nos casos. São precisos mais dias para configurar uma tendência”, complementou.
Analisando o gráfico, Adaid mostrou que, por exemplo, a queda de novos registros nos dias subsequentes a 30 de junho indicavam uma desaceleração. “Mas esse indício não se confirmou. Então, não posso usar o mesmo indício. Hoje, temos um aumento no número de casos seguido por um indício de ondulação”, acrescentou. O ideal é que os próximos dias e, principalmente, a próxima semana, registrem menos casos na média.
O que é a média móvel?
A média móvel é um artifício usado estatisticamente a partir do qual você soma os dados do dia com o dos últimos seis dias e divide por sete. É uma forma que tem sido usada no mundo para suavizar variáveis como a subnotificação da covid-19 e o intervalo entre o contágio e a notificação. Adaid comentou que o ideal seria que, a partir de agora, esse número estivesse entre 1.600 e 2.000 para configurar uma tendência de queda ou lateralização.
O especialista também pontuou que é preciso ficar atento para um possível colapso da rede de saúde. “Quando os hospitais estão trabalhando no máximo da capacidade ou bem próximo disso, o que vimos em outras cidades, como Manaus, foi um aumento na taxa de mortalidade. O pico de casos onerou as UTIs agora, mas não houve um tempo suficiente para liberar leitos. Se continuar assim, com um acúmulo de muitos casos novos em um curto prazo, consequentemente, você terá mais pessoas precisando de UTI, diante de um sistema já saturado."
Taxa de transmissão
Um dos coordenadores do Observatório de Predição e Acompanhamento da Epidemia Covid-19 da Universidade de Brasília (UnB), o matemático Paulo Angelo Alves Resende, informou que a média móvel da taxa de transmissão do novo coronavírus no DF registrou uma tendência de aumento. No último boletim do observatório, esse número, que representa a capacidade que uma pessoa tem de contaminar outras, estava exatamente igual a um.
“Agora, ele deu uma subida. A média móvel está em 1,06. No entanto, não dá pra saber se isso corresponde a uma oscilação ou a um aumento sustentado de casos. Com o que temos agora não dá para concluir por si só se está aumentando”, ponderou. Diante da forma como a pandemia evolui, dos complexos processos de testagem e da subnotificação, por exemplo, existem variáveis que podem interferir.
Apesar da instabilidade, tanto Angelo quanto Adaid comentaram que os indicadores de isolamento e distanciamento social na cidade não sofreram tanta alteração. “Precisamos centrar os esforços na inteligência epidemiológica, nas medidas de vigilância para suprimir a disseminação do vírus”, ressaltou Angelo.
O epidemiologista Walter Massa Ramalho também defende o rastreamento e o acompanhamento dos casos. “Em decorrência de uma desarticulação que houve, chegamos de forma exaurida no pior cenário, que é o aumento no número de casos da covid-19. É uma situação preocupante. A nossa taxa de incidência, ou seja, a probabilidade de uma pessoa vir a adoecer, é uma das maiores, e tem crescido nos últimos dias. Ao mesmo tempo que economicamente e socialmente, atingimos uma exaustão”, detalhou.
Para Ramalho, é preciso estruturar o sistema que temos, para que a vigilância epidemiológica converse com a atenção básica. “É preciso controlar melhor as pessoas e suas comunidade. Também falta uma comunicação de risco, alertando as pessoas."
Fiscalização
Questionado na última entrevista concedida ao Correio sobre uma relação, mesmo que indireta, entre a reabertura do comércio e o aumento de casos, o secretário de Saúde do DF, Francisco Araújo Filho, disse que o governo não tem poupado esforços. “Não só com abertura de leitos, mas com contratação de mais profissionais, campanhas educativas, organização, toda a parte pedagógica. Mas o mais importante agora é a população fazer a parte dela, independentemente do que abra. A gente sabe que houve um grande problema social do ponto de vista de manter as pessoas isoladas. Não adianta você dizer para a pessoa ficar isolada se ela não quer ficar isolada. O governo precisa fazer sua parte e a população também. O importante agora é cada cidadão ter cuidado consigo mesmo, com uso da máscara, álcool em gel, distanciamento, não abrir mão da autoproteção. Se vai entrar num ônibus, por exemplo, e ele está lotado, não vá. Evite aglomeração. 'Ah, o bar abriu, o restaurante abriu, o parque abriu.' Ok, mas você pode ir ao parque adotando todo o protocolo, você pode ir ao restaurante aberto e manter o distanciamento, todos aqueles cuidados que são necessários. Eu aqui não estou defendendo abertura ou fechamento, eu estou defendendo a vida das pessoas."
Em nota enviada nesta sexta-feira, a Secretaria de Saúde informou que faz o monitoramento epidemiológico da evolução no novo coronavírus em todo o DF e que o alerta da pasta continua sendo para que a população esteja atenta aos cuidados e às orientações sanitária para evitar o contágio - uso de máscara, higienização frequente das mãos e o distanciamento social, evitando aglomerações.
“A pasta ressalta que a Divisão de Vigilância Sanitária (Divisa) aumentou as fiscalizações nos estabelecimentos comerciais ao longo das últimas semanas. Por dia, 300 ações são realizadas em todo o Distrito Federal para verificar o cumprimento dos decretos durante a pandemia, sendo que 20% dessas ações são feitas a partir de denúncias encaminhadas à Divisa. De março a junho deste ano, a Divisa realizou cerca de 40 mil ações e instaurou 79 processos referentes à lavraturas de Autos de Infração dos estabelecimentos por descumprimento dos decretos e sobre as medidas sanitárias de enfrentamento à Covid-19 (valor das multas variam de R$2 mil a R$7 mil). Foram realizadas também 22 interdições de estabelecimentos”, destacou.