Segundo a Secretaria de Saúde (SES), até 10 de julho, mais de 46 mil profissionais da rede pública, além de 2.637 terceirizados que trabalham nas unidades de saúde, fizeram testes para covid-19. Ao todo, 1.237 servidores, e 63 terceirizados tiveram resultado positivo para a doença. Em nota oficial, o órgão esclarece que, aqueles infectados, são afastados das funções, e cumprem quarentena de 14 dias. “Todos do núcleo familiar são orientados a permanecer em isolamento e, se apresentarem sintomas, devem procurar a unidade de saúde mais próxima para avaliação”, destaca o texto.
Além disso, todos os trabalhadores da área passam por treinamento nas unidades em que atuam. “Aqueles que prestam assistência diretamente aos pacientes com covid-19 seguem os fluxos de atendimento preconizados no Plano de Contingência da SES”, garante a pasta. “As equipes recebem orientações periodicamente quanto ao uso adequado dos Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e são treinadas para prevenir a contaminação e disseminação da covid-19.”
O Correio conversou com familiares e amigos de heróis que se foram, assim como aqueles que, depois de quadros graves, conseguiram sobreviver.
Generosidade e cuidado
Sonhar com um mundo melhor e poder ajudar o próximo foi o que fez Antônio Júnior Araújo Silva, 50, buscar a enfermagem. Do front de batalha, no Hospital Regional do Guará (HRGU) dedicou-se a ajudar pacientes, doando os conhecimentos em saúde, mas também o apoio fraternal. Em 20 de junho, após uma batalha interna contra o coronavírus, ele não resistiu e acabou falecendo.
No próximo dia 27, completaria 18 anos de casado com a advogada Viviane Theodoro, 45, a quem conheceu ainda na infância. Juntos, tiveram um menino. “Eu costumava dizer que, com ele, nosso filho conseguia tudo. Eu era a rigorosa, e ele, o coração mole. Júnior sempre foi parceiro demais”, emociona-se. Ela lembra do marido como alguém generoso e apaixonado pela profissão. “Veio ao mundo para fazer o bem. Amava a enfermagem e trabalhava com prazer. O que melhor fazia era cuidar, e morreu no exercício do dever.”
Os dois contraíram a doença na mesma época, mas como o caso dele foi mais grave, ficaram separados durante os 17 dias em que ele esteve internado. Em casa, o casal tinha rigor nos cuidados higiênicos. “Ele não chegava perto de mim antes de tomar banho, já na porta, tirava as roupas contaminadas e deixava de molho. Mas foi inevitável”, lamenta. “É uma doença muito difícil de lidar, e as pessoas não se conscientizam, enquanto profissionais da saúde estão dando a cara a tapa para salvar vidas, muitos não estão nem aí.” Em meio ao luto e a dor, ela destaca a generosidade do enfermeiro. “Ele era puro amor, daqueles que fazia o bem, sem olhar a quem. Vai fazer muita falta.”
Comprometimento e seriedade
Uma mão sempre disposta a ajudar. Assim era o técnico em enfermagem do Hospital Regional da Asa Norte (Hran), Hiram Rodrigues Lima, 47 anos. Aqueles que o conheceram são unânimes: prestatividade em pessoa. “Quando eu via que ele estava na nossa escala de plantão, já ficava tranquilo, porque sabia que a coisa iria fluir com comprometimento”, recorda Atoniel Queiroz, 46, colega de trabalho de Hiram.
A amizade dos dois nasceu no box de emergência do hospital. “Era um camarada focado no trabalho. Sempre o primeiro a chegar, e o último a sair. Está sendo um desafio sem ele, mas a nossa profissão não nos dá tempo de juntar os cacos. As demandas falam mais alto.” Também técnica em enfermagem, Yaskara Cavalcanti, 49, lembra do carinho do amigo com colegas e pacientes. “Era alto-astral. Nunca o vi reclamando de trabalho, nem de nada.” Para afastar as preocupações diante da pandemia, ele brincava. “A gente tem essa frase boba: não pego. No meu corpo, esse vírus morre”, lembra a amiga. “Era uma piada. Falar que era invencível, como uma válvula de escape.”
Fora do trabalho, era esposo e pai dedicado. Do casamento de mais de 10 anos, a vendedora Rosecleia Gerônimo da Silva, 28, guarda na memória a dedicação de Hiram. Juntos, eles tiveram duas filhas. “Ele nunca deixou faltar nada em casa. A gente não tinha uma vida de luxo, mas estava sempre preocupado se tinha leite e pão em casa para as meninas”, declara. “Ele era meu refúgio quando tinha algum problema. Sempre foi a pessoa com calma para conversar. Não era de falar muito, mas quando falava, todos admiravam”, emociona-se.
Quando voltava do trabalho para casa, em Águas Lindas (GO), tinha o cuidado de se higienizar primeiro e manter distância da família. Mesmo assim, contraiu o vírus e precisou dar entrada no Hran. Durante o processo de internação, ele e Rosecleia conversavam por videochamada. A última comunicação, aconteceu na madrugada em que ele foi entubado, em 17 de junho. “Ele me mandou mensagem, pedindo desculpas pelas vezes que discutíamos, e dizendo que nos amava. Eu liguei para ele e pedi calma, porque tudo daria certo.”
Sem o companheiro, ela agora tenta ser forte para as filhas. “Elas têm esperança de que todo dia ele vai chegar em casa. Voltei a trabalhar na semana passada e está sendo difícil sorrir e conversar. Sou pai e mãe ao mesmo tempo.” Enquanto isso, ela espera o auxílio-funeral, que até hoje não foi pago pelo governo. Segundo a Secretaria de Saúde, para obter o ressarcimento, é necessário ir à gerência de pessoas da unidade em que o servidor trabalhava e apresentar nota fiscal da despesa. “Sobre a aposentadoria, a viúva deve fazer o requerimento também na Gerência de Pessoas. A documentação será enviada ao Iprev que faz a análise da legitimidade do benefício e autoriza a concessão”, informou o órgão.