A advogada Luana Vieira, a mãe, de 72 anos, e dois cachorros da família, viveram um momento dramático na manhã de domingo, no Parque da Cidade. Eles foram atacados por um exame de abelhas à altura do Estacionamento 7. Tufão, um dos cachorros, não resistiu e morreu. Provavelmente, salvou a família de consequências mais graves. Luana tem razão em um ponto: a administração do Parque deveria avisar aos frequentadores sobre o perigo das abelhas.
Senti-me na pele da família, pois, durante a adolescência, vivi experiência semelhante. Meu pai era um sertanejo pernambucano impulsivo, voluntarioso e temerário. Certo dia, resolveu instalar uma colmeia em um armário no quintal, bem próximo à casa. Alertei para o perigo, mas ele era teimoso. De fato, chegaram à colher muitos favos saborosos de mel.
No entanto, numa tarde, um enxame de abelhas africanas misturou-se com a colmeia da casa e provocou o caos. A gente ouvia o zumbido rascante e as nuvens de insetos movendo-se furiosamente no espaço aéreo. Atacavam tudo que encontrassem pela frente. Galinhas tombavam estateladas. Com a impulsividade de sempre, meu pai apanhou gasolina e ateou fogo ao armário.
Aí é que elas se assanharam mesmo. Investiram contra nós, picaram a família inteira, atacaram as pessoas que passavam na rua. Misturaram-se com a fumaça. Mas, finalmente, tudo serenou. E, neste momento, vivemos um lance que parece extraído diretamente de uma trama de realismo fantástico de Gabriel García Marquez.
Enterramos no quintal algumas galinhas que quedaram desfalecidas. Todavia, para nossa estupefação, de repente, elas emergiam sujas de terra, renascidas do chão. Julgávamos que elas estivessem mortas, mas estavam apenas anestesiadas pelo veneno inoculado pelas abelhas.
Entretanto, voltemos a Brasília. Já foram 60 acidentes com abelhas de janeiro a junho. Para tentar entender um pouco do que está acontecendo, telefonei para Thiago Roure, vizinho de condomínio, que acaba de concluir doutorado sobre como a fertilização afeta a comunidade de plantas do Cerrado. E uma parte da pesquisa foi sobre os efeitos no comportamento das abelhas na polinização de plantas e de flores.
O aumento da incidência de ataques de abelhas nas cidades é sinal de quê? A resposta é de uma obviedade humilhante. De desmatamento, de queimadas, de destruição do meio ambiente, constata Thiago: “Não sou eu que está dizendo isso, são os cientistas de todo o mundo”.
Grande parte das frutas que comemos ou mesmo de plantas não comestíveis é polinizada pelas abelhas. Quando existem abelhas, a semente tem mais qualidade e o fruto é mais saudável. Elas ajudam a manter os ambientes nativos do Cerrado. É a vegetação que controla a qualidade da nossa água. O que é preciso fazer? Parar de desmatar, parar de destruir o meio ambiente, brada Thiago.
Bicho depende de planta: “A natureza não é composta de caixinhas isoladas. No ecossistema, cada elemento conversa com o outro. Estamos destruindo a casa dos bichos. Com isso, aumenta a quantidade de bicho vindo para a cidade. Isso afeta, inclusive, pandemias como é o caso do coronavírus. Pode provocar a contaminação por outros vírus. A culpa não é do morcego, é nossa. O morcego é um polinizador importantíssimo, além de controlar os insetos”.