Cidades

Covid-19: Com curva de casos em ascensão, DF tem letalidade de 1,4%

Especialistas analisam estatísticas, desde as primeiras infecções no Distrito Federal, em março, e afirmam que cenário atual é crítico. Letalidade da covid-19, no entanto, é uma das menores do país. A taxa de mortes provocadas pela doença, no DF, está em 1,4%

Correio Braziliense
postado em 16/07/2020 06:00
Medidas de relaxamento do distanciamento social impactaram no aumento de casos na capitalO Distrito Federal chegou ao quarto mês de combate ao novo coronavírus desde os primeiros casos da covid-19, enfrentando o desafio de lidar com um alto pico de infecções. Atualmente, são 75.379 casos registrados na capital, sendo 66.901 de moradores do DF e 6.201 de outras regiões, que se tratam em unidades de saúde locais, e 1.001 mortes (83 eram pessoas que viviam em outros estados). O cenário fica mais preocupante quando se observa a evolução da doença. Utilizando como base o dia 15 de cada mês, o DF registrou 14 ocorrências em março, 688 em abril, 3.787 em maio, 23.684 em junho e 75.379 em julho.

ilustração de dados

A estatística é a soma dos casos de pessoas que tiveram contato com o vírus e estão recuperadas e aqueles que ainda lutam contra a covid-19, que são, atualmente, 12.760 pessoas no DF. A porcentagem de ocupação de unidades de tratamento intensiva (UTI) chega a mais de 90% em hospitais da rede privada e mais de 70% na rede pública. Ontem, somente sete unidades de saúde tinham leitos disponíveis para casos graves em que há necessidade de suporte para hemodiálise. A Defensoria Pública do Distrito Federal (DPDF) levantou que, em junho, 61 pessoas entraram na Justiça com pedidos por vagas em leitos de UTI.

“Quando observamos o aumento do número de casos e a ocupação dos leitos, concluímos que a situação não está controlada, e que a previsão é ruim para as próximas semanas ou meses”, avalia a infectologista e professora universitária Joana D’arc Gonçalves. A médica afirma que a evolução das infecções depende do comportamento da população e das medidas de contenção da pandemia, que vão determinar, por exemplo, o grau de distanciamento social, eficaz no combate ao novo coronavírus. Porém, o descumprimento das recomendações e a dificuldade de se testar cada vez mais pessoas deixam o DF em situação crítica.

“A curva dos próximos dias vai depender de como vamos aderir às medidas de combate (à pandemia). Se o comércio reabrir todo e sem respeitar as normas (sanitárias), o cenário fica ainda mais complicado. O ideal, neste momento, seria conseguir testar o maior número de pessoas possível”, diz Joana D’arc. Ontem, as unidades básicas de saúde (UBS) ficaram sem testes rápidos para a população. Para a infectologista, a falta desses exames não permite visualizar a realidade da pandemia no DF. “Testando o maior número de pessoas possíveis, os dados seriam mais confiáveis. Também seria ideal o procedimento de testar, pelo menos, duas pessoas que tiveram contato com alguém infectado, porque sabemos que cada infectado pode passar o vírus para mais dois, então isso identificaria os dois e quebraria a cadeia transmissora”, explica.

Decretos


Primeira unidade da federação a adotar medidas de distanciamento para prevenir a escalada de casos do novo coronavírus, o Distrito Federal, agora, está em fase de flexibilização do isolamento, com bares e restaurantes abertos e cronograma de retorno às aulas presenciais. Cada medida adotada pelo governo tem impactos diretos na evolução de ocorrências. Mas, especialistas explicam os reflexos estatísticos não são instantâneos, levando de uma a duas semanas para aparecer em forma de dados.

Epidemiologista e professor do departamento de Medicina da Universidade de Brasília (UnB), Walter Massa Ramalho avalia que o Distrito Federal está melhor, em relação à média nacional, por ter sido a primeira unidade da federação a iniciar a quarentena. “Acharam que o governador era autoritário, mas ele conseguiu diminuir muito a transmissão do coronavírus no DF. Porém, setores continuaram interagindo e, com isso, houve aumento do número de casos, especialmente na periferia”, pondera. Atualmente, a taxa de letalidade da covid-19 — número de mortes pelo total de casos — está em 1,4% no Distrito Federal, um dos menores índices do país. No Rio de Janeiro, a efeito de comparação, a taxa era 9% na última semana.

Flexibilização


“Ibaneis teve um desempenho muito interessante no momento que ele discutiu e implementou determinado distanciamento”, considera Walter. Em 11 de março, o governador publicou o primeiro decreto com ações de combate ao vírus, suspendendo aulas e proibindo eventos. À época, a Secretaria de Saúde havia confirmado dois casos da covid-19, sem óbitos. De lá, para cá, houve avanço na disseminação do novo coronavírus. Uma semana após o primeiro decreto, o DF somava 42 infectados, o que representou um aumento de 2.000%. Com isso, vinha o segundo decreto, que fez com que bares e restaurantes fechassem as portas, podendo funcionar, apenas, por sistema de entregas. Os registros seguiram aumentando e, na semana seguinte, 171 pessoas estavam infectadas. A evolução percentual, no entanto, tinha a primeira diminuição: 307,1%.

A queda continuou até 23 de abril, quando houve crescimento de 40,6% nas ocorrências, em relação à semana anterior. Na data, o Governo do Distrito Federal (GDF) publicou no Diário Oficial do DF, o decreto estabelecendo o uso obrigatório de máscaras. Uma semana depois, o DF acumulava mais de 1,3 mil casos e 30 mortes pela covid-19. Em maio, o governador começou a flexibilização do isolamento, com a reabertura de lojas de roupas e calçados, em decreto publicado em 16 de maio, quando havia 3,7 mil pessoas infectadas e 55 óbitos. Seis dias após, foram reabertos os shoppings e grande parte dos demais estabelecimentos comerciais. Após uma semana, o número de casos sofreu incremento de 43,5%.

O relaxamento das medidas de isolamento, das últimas semanas, deve ser sentido até o fim de julho, quando será possível realizar uma melhor leitura das reaberturas. De acordo com o último boletim do observatório de Predição e Acompanhamento da Epidemia Covid-19 (PrEpidemia) da UnB, entre amanhã e 29 de setembro, o DF deve começar a enfrentar o pico de hospitalizações. O levantamento indica que o cenário mais pessimista para este mês é de 1.511 óbitos em decorrência da doença, até o dia 21. O cenário típico, porém, mostrava 417 mortes, número já ultrapassado. Apesar disso, o grupo considera que, conforme divulgado no boletim, “não é recomendada, para o momento, a imposição radical de medidas de isolamento e interrupções de atividades sociais, já que essas medidas não são sustentáveis por longos períodos e a pandemia deverá continuar por mais alguns meses”.

Três perguntas para

Joana D’arc Gonçalves, médica infectologista

Assim como o H1N1, teremos que nos vacinar todos os anos contra o coronavírus?

Ainda não é possível falar sobre vacina, porque é muito cedo. Existe a possibilidade de que ela seja eficaz na primeira dose, existe a possibilidade da variabilidade. Talvez, ela possa valer pela vida toda, por anos ou meses, é muito precoce para dizer.

Uma pessoa infectada, em média, pode infectar quantas outras?

Sabemos que uma pessoa infectada pode levar o vírus para cerca de duas pessoas, atualmente.

A lotação das UTIs, em cerca de 90%, é motivo para um lockdown?

A decisão de lockdown é do gestor. Tecnicamente falando, quanto menos pessoas circulando, melhor. Onde as pessoas seguiram, o fechamento foi eficaz. Mas, teve a palavra lockdown em alguns locais e não houve fiscalização e conscientização. As pessoas continuaram em atividades normais, isso não é o ideal.

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