Mesmo com decisão judicial suspendendo a retomada das aulas presenciais e novo decreto do governador Ibaneis Rocha (MDB), que derruba qualquer data prevista para a reabertura das escolas, o debate sobre o tema ganhou força ontem. Representantes do Sindicato dos Professores (Sinpro/DF) reuniram-se com o chefe do Buriti e com o secretário de Educação, Leandro Cruz, para pedir que o retorno não ocorresse em 3 de agosto, como previsto inicialmente pelo GDF. O governo esclareceu que, embora a data tenha sido estipulada para que escolas, universidades e faculdades públicas voltassem a funcionar, isso não significaria que os alunos estariam em sala, efetivamente.
Samuel Fernandes, diretor do Sinpro, destacou que será realizado novo encontro com o secretário de Educação. “É preciso garantir os equipamentos de proteção individual para todos os profissionais e alunos, além de bebedouros adequados, testagem dos professores, e desinfecção das salas”, detalha. “Mais do que isso, é necessário diminuir o número de infectados por dia, assim como o de mortes. Neste momento, é impossível voltarmos. E, se em agosto acontece uma nova explosão de casos?”, questionou.
Ao Correio, o secretário Leandro Cruz informou que, a partir de 3 de agosto, seria possível o retorno das atividades, mas pedagógicas. “Nós testaremos os professores, prepararemos todos os protocolos e teremos uma volta gradual e segura para toda a comunidade da educação”, explicou, horas antes de o novo decreto do GDF ser publicado à noite. Segundo ele, será divulgado um calendário do retorno presencial, baseado em dados científicos e mantendo escalonamento. Todas as medidas previstas no decreto serão seguidas rigorosamente (veja Adaptações).
Em nota divulgada ontem à noite, a Secretaria de Educação informou que “cumprirá o que estiver determinado nos decretos assinados pelo governador Ibaneis Rocha. Pelo decreto em vigor, no momento, as aulas estão suspensas por tempo indeterminado. No entanto, a pasta segue trabalhando nos preparativos para a retomada das aulas de forma gradual e segura, quando for permitido e possível.”
Como professora e mãe, Isabela Alves, 50 anos, considera que o momento não é propício para o retorno. “Os casos estão frequentes, nem começaram a cair. Pensando na segurança e na saúde dos meus filhos, acho que a volta às aulas deveria ser prorrogada, mesmo que isso traga prejuízo para eles”, avalia. O filho mais velho, Mateus, 17, está no 2º ano do ensino médio e enfrenta dificuldades na aprendizagem virtual. “Ele tem deficit de atenção, então, é mais difícil se manter focado. As aulas presenciais para ele são melhores”, disse. Mesmo assim, a mãe defende o isolamento social por mais tempo.
A filha mais nova, Isadora Alves, 12, assim como o irmão, deseja retornar ao convívio com colegas e professores, mas acredita que não é o momento ideal. “Não sei como será esse retorno e ainda não me sinto segura para a situação. As escolas vão conseguir diminuir o número de alunos dentro das salas de aula e possibilitar um revezamento? Como será a questão do recreio? Como garantir segurança a todos?”, perguntou a professora. “O ano letivo está prejudicado, não adianta voltar agora, sendo que ele vai ter de se estender para 2021”, refletiu Isabela.
Rede particular
Quando voltarem as aulas escolas particulares — até ontem, estavam autorizadas a retomar o ano letivo em 27 de julho — a fiscalização dos protocolos de segurança será feita pela Secretaria de Educação, além da Vigilância Sanitária e do DF Legal. Está marcada para hoje uma reunião entre o secretário-chefe da Casa Civil, Gustavo do Vale Rocha, e representantes da Associação de Pais e Alunos das Instituições de Ensino do Distrito Federal (Aspa/DF) e do Sindicato dos Professores de Entidades de Ensino Particulares do Distrito Federal (Sinproep).
Rodrigo de Paula, do Sinproep, explica que um dos questionamentos a ser colocado durante o encontro é referente à testagem dos professores. “A gente precisa de um protocolo mais rígido, com retorno escalonado”, argumentou. “Queremos também a garantia de que o professor que seja contaminado não será demitido, porque, na rede particular, não temos essa estabilidade da rede pública”, acrescentou.
Alexandre Veloso, presidente da Aspa, defendeu que o governo precisa explicar o que levou à definição das datas estipuladas no decreto. “Pedimos, desde a semana passada, dados que fundamentaram o retorno e não recebemos. Isso é importante para passar para os pais para que eles possam definir o que acham melhor, mas com dados corretos e transparentes”, ressalta. Segundo Alexandre, muitas famílias estão divididas sobre mandar ou não os estudantes às escolas. “Alguns acham perigoso tanto para os filhos quanto para a coletividade. Eles entendem que ali é um espaço de contaminação comunitária sem controle. A baixa letalidade da criança não é a questão, mas eles entendem que ela passa a ser um vetor da doença.” Mas, até mesmo entre os que defendem a volta, as opiniões mudam. “Existem pais que querem, porque estão trabalhando de novo, mas também não têm certeza, porque estão vendo a lotação das unidades de terapia intensiva (UTIs).”
A Secretaria de Educação reforçou que, depois de resolvido o imbróglio judicial, “publicará um novo calendário, baseado em fatos científicos, com cuidados e protocolos necessários, mantendo o escalonamento, que é necessário para um retorno gradual e seguro. Tudo o que está sendo feito do ponto de vista da preparação estrutural da secretaria e de um planejamento para garantir a segurança de toda a comunidade de educação do Distrito Federal.”
O presidente do Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do Distrito Federal (Sinepe/DF), Álvaro Domingues, ressaltou que os colégios particulares estão preparados para reabrir as escolas. “Sabemos que a rede privada é composta por 570 escolas e atende a 165 mil alunos, e a rede pública, 660 escolas, com 460 mil alunos. São muito diferentes e muito complexas. É natural que voltem em momentos diferentes, de maneira lenta, gradual, progressiva e segura. Lembramos que, no caso das escolas particulares, nós estamos devidamente habilitados para poder implementar política segura de retorno e, principalmente, estar contribuindo com a sociedade, acolhendo aqueles que desejarem ir para escola de forma segura e respeitando o direito daqueles que querem permanecer em casa”, detalhou.
O vendedor Diego Pereira, 30, pai de Valentina, 5, e Yasmin, 9, entende que o retorno é necessário, principalmente para a aprendizagem das filhas, mas admite que se sente inseguro. “A gente quer que elas voltem porque têm de aprender, mas ficamos com medo dessa doença”, afirma. Para ele, o mais prudente é esperar. “Temos de avaliar a situação e quais os cuidados que serão tomados nas escolas. As atividades devem voltar, mas é necessário reaprender hábitos comuns de higienização para combater o vírus.”
Adaptações
Quando as datas de retorno forem decididas, as escolas deverão se adaptar para a reabertura. Veja as normas
• Higienizar as cadeiras e mesas de uso coletivo regularmente
• Disposição das carteiras, cadeiras e mesas à distância de 1,5 metro entre elas
• Proibido o funcionamento dos bebedouros
• Privilegiar a ventilação natural do ambiente. Janelas e portas dos ambientes devem permanecer permanentemente abertas durante as aulas. No caso do uso de ar-condicionado, realizar manutenção e limpeza dos filtros diariamente
• Priorizar reuniões e eventos a distância
• Suspensão da utilização de catracas e pontos eletrônicos com biometria
• Delimitação, por meio de sinalização, da capacidade máxima de pessoas em salas de aula, bibliotecas, ambientes compartilhados e elevadores, respeitando o distanciamento mínimo obrigatório
• Escalonamento de horários de intervalo, refeições, saída e entrada de salas de aula, bem como de horários de utilização de ginásios, bibliotecas, pátios etc. a fim de preservar o distanciamento mínimo obrigatório entre pessoas e evitar aglomeração nas áreas comuns
• Atividades esportivas devem ser realizadas ao ar livre ou em ambientes ventilados
• Limpeza geral e desinfecção das instalações antes da reabertura da escola
• Testagem para covid-19 dos profissionais da educação
• Disponibilização de locais para a lavagem das mãos com sabão e toalhas de papel descartáveis ou disponibilização de dispenser com álcool em gel
• As turmas devem ser reorganizadas de modo a reduzir o número de estudantes em sala de aula, promovendo a alternância entre o ensino presencial e o ensino mediado por tecnologias
• Devem ser evitadas aglomerações de pais/responsáveis e estudantes em frente à escola, estabelecendo-se escalonamento para a entrada e saída dos estudantes
• Jogos recreativos, esportivos e outros eventos que criem condições de aglomeração devem ser cancelados
• Estudantes e professores que se enquadram no grupo de risco atuarão exclusivamente por meio do ensino mediado por tecnologias
• Deve-se restringir o uso de objetos que possam ser compartilhados pelos estudantes
• Limpeza e sanitização dos ambientes escolares com maior frequência
• As escolas deverão adotar programas de conscientização do uso de máscara, do distanciamento e das demais medidas de prevenção ao novo coronavírus