Cidades

Crônica da Cidade

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As duas Brasílias

A batalha contra o novo coronavírus é terrível em qualquer circunstância. Mas, se ela tem como aliados os comandantes da guerra, a luta se torna ainda mais difícil e dramática. E é isso que estamos assistindo em vários estados do país.

A responsabilidade não é só do presidente, que lançou no ar a falsa dicotomia entre saúde e economia. Alguns governadores e prefeitos julgam que podem combater a pandemia com os mesmos métodos de esperteza que utilizam para ludibriar os eleitores. Colocam-se na condição do homem que enganou o coronavírus e ainda pediu troco.

Brasília parece viver duas dimensões: a oficial e a real. Na oficial, há uma oferta confortável em leitos de unidades de terapia intensiva (UTIs). No entanto, na real, alguns pacientes enfrentam dificuldades para a internação e só conseguem ser encaminhadas mediante ações judiciais.

Disparidade semelhante ocorre em relação aos profissionais de saúde. Enquanto eles reclamam da falta de equipamentos de proteção e de testes, o governo afirma que está tudo em ordem. Com o aumento avassalador de casos do coronavírus, o governador decretou estado de calamidade pública.

Ao mesmo tempo, em plena escalada ascendente da doença, declarou que pretende retomar todas as atividades e que a covid 19 “deveria ser tratada desde o início como uma gripe”. Uma gripe que, no mundo, já infectou mais de 10 milhões e matou mais de 500 mil pessoas. E, no Brasil, já infectou mais de 1,4 milhão e matou 58 mil pessoas.

O governador afirmou também que as pessoas estão cansadas de estarem confinadas e ninguém aguenta mais o isolamento. É verdade, mas é preciso combinar com o vírus. Se os governos tivessem adotado um isolamento mais severo, como recomendavam os cientistas, a volta da economia seria mais rápida e confinamento menos extenuante.

Ouçamos o que tem a nos dizer Joseph Stiglitz, professor da Universidade de Columbia, Prêmio Nobel de Economia de 2001, sobre a falsa dicotomia entre economia e saúde, em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo: “O fato é que, se você não salvar as pessoas, a economia será devastada. Pessoas não irão ao restaurante, ficarão nervosas quando forem ao trabalho, não irão voar por aí, haverá medo no bar. Basicamente, a economia se encaminhará para a paralisia se não pararmos a pandemia. Por isso, é uma boa decisão colocar a prioridade nas pessoas e controlar a pandemia”.

E, para finalizar, Stiglitz comentou a situação dos países que negam a ciência: “No Brasil e nos Estados Unidos, temos governos que não acreditam na ciência. E nós vemos as consequências.”