Correio Braziliense
postado em 25/06/2020 06:00
Uma bicicleta, sacos plásticos e resíduos sólidos são instrumentos necessários para a rotina de quem trabalha como catador de material reciclável. São essas pessoas que, por vezes, vivem em terrenos baldios no Distrito Federal e, com a coleta, encontram uma forma de sustento, gerando renda às comunidades vulneráveis socioeconomicamente.É fácil encontrá-los pelas ruas da capital federal. Foi o que aconteceu quando a cineasta Carol Matias, 30 anos, fazia, diariamente, trajetos de bicicleta entre a Asa Norte e o Noroeste. Durante os percursos, ela começou a perceber a invisibilidade desses trabalhadores para a sociedade e a situação precária de trabalho em que vivem. “Parecia algo muito isolado. Vi um senhor, em uma bicicleta cargueira, e comecei a observar que se tratava de uma comunidade que usa esse veículo para desenvolver o ofício”, comenta.
Carol identificou, então, uma forma de contribuir para que a profissão (que ajuda a cuidar do meio ambiente) e essas pessoas tivessem reconhecimento. Assim surgiu o projeto No rastro das cargueiras, um longa-metragem de 71 minutos que será lançado, hoje, no Rastro — Festival Cinema Documentário.
O filme foi gravado em uma ocupação no setor Noroeste e conta a história de pessoas que trabalham com a reciclagem. Segundo a idealizadora do projeto, antes de as gravações começarem, ela percebeu a necessidade de criar laços com a localidade para compreender a realidade desses trabalhadores.
Dona Caçula, 54, é uma das personagens de No rastro das cargueiras e diz enxergar uma importância social por trás da documentação do dia a dia desse público. “Muita gente recrimina por trabalharmos na lixeira, revirando o lixo. Chamam a gente de porco, esculhambam, nos chamam de imundos... Espero que esse filme faça as pessoas olharem com mais amor para nós e, também, motive a sociedade a nos ajudar, por exemplo, separando o lixo antes de descartar”, admite a catadora.
Francisco Sousa, 37, conhecido por Dadá, conta que aceitou a proposta de participar do documentário porque trabalha desde muito novo na profissão e, até então, nunca teve espaço para falar da sua realidade. “As pessoas sabem pouco sobre a reciclagem. Muita gente nem se interessa em entender o trabalho do catador. Nós, além de conseguirmos sustentar nossas famílias, contribuímos com o meio ambiente e com o ecossistema. Precisamos falar sobre sustentabilidade”, afirma.
Lado social
Além de colocar luz sob essas pessoas, o filme tem, ainda, um papel de responsabilidade social. A equipe criada para o desenvolvimento de No rastro das cargueiras elaborou uma campanha de arrecadação de doações que serão entregues à comunidade que vive nas proximidades do Noroeste e que também enfrenta a crise social causada pelo novo coronavírus.
“Levamos 216 cestas básicas, 45 cestas de hortaliças do MST, 210 máscaras de tecido, 25 luvas, mais de 40 cobertores e outras doações de roupas e calçados. Contamos com a ajuda de muitas pessoas, mas precisamos de mais doações para continuar a levar mantimentos enquanto durar a pandemia”, explica Carol Mathias.
As contribuições para a ocupação podem ser feitas por meio de transferência bancária para a conta do projeto e, também, quem quiser contribuir, pode entrar em contato com a equipe responsável pelo Instagram @norastrodascargueiras.
Outras ações
O coletivo Banho do Bem atua há dois anos e meio na Rodoviária do Plano Piloto. A função do projeto é disponibilizar um ônibus adaptado com chuveiros para que pessoas em situação de rua possam tomar banho. Além da higienização, a ação oferece corte de cabelos e um trailer que funciona com máquinas de lavar roupas.
Com o momento delicado de quarentena, a idealizadora do projeto Adriana Amorim, 54, explica que as ações do banho foram interrompidas. No entanto, a equipe responsável criou uma campanha para arrecadar materiais para esta população também vulnerável. “Até agora, entregamos mais de 11 mil refeições prontas e, pelo menos, 900 cestas básicas”, conta ao Correio.
Os locais escolhidos pelo Banho do Bem para entregar as doações são em ocupações nas regiões administrativas do Distrito Federal. “Famílias que moram nestes locais e antes da pandemia não estavam em situação de rua, agora têm a necessidade de ir para as ruas, muitas vezes para pedir doação”, ressalta Adriana. Para doar, basta entrar em contato com o telefone 9 9556-5433.
O coletivo No Setor montou um ponto de atendimento para auxiliar a população mais vulnerável, que tem sentido ainda mais os impactos gerados pelo isolamento social, como a diminuição da oferta de emprego e a crise econômica. O projeto, intitulado Campanha de arrecadação, conta com o recolhimento e a distribuição de materiais de higiene e limpeza, luvas descartáveis, equipamentos de proteção individual (EPIs), bem como alimentos, agasalhos e outros itens de frio. “Foram mais de 20 mil itens recebidos, incluindo roupas, produtos de higiene, alimentos e todos foram destinados às pessoas que passam ou vivem pelo SCS”, explica o diretor do No Setor, Ian Viana, 24.
Para doar, basta checar os pontos de coleta nas redes sociais do No Setor @nosetor, ou contribuir com alguma quantia em dinheiro pela conta bancária do instituto. “Como dizia um velho poeta, nenhuma força na terra é suficientemente poderosa para deter uma ideia quando seu tempo chega. É chegado o tempo da solidariedade. Urgente. Imediata. Desesperada. Doe e nos ajude a garantir dignidade. Autoestimas. Salvar vidas”, alerta Ian.
*Estagiária sob supervisão de José Carlos Vieira
Como ajudar
Campanha No rastro das cargueiras: entre em contato pelo Instagram @norastrodascargueiras.
Banho do Bem: entre em contato pelo telefone
9 9556-5433. Campanha de arrecadação do No Setor: entre em contato pelo Instagram @nosetor
Onde assistir
O documentário No rastro das cargueiras será exibido hoje pelo site www.festivalrastro.com. O filme fica disponível por 24 horas em acesso gratuito.
Festival on-line
O festival brasiliense Rastro — Festival de Cinema Documentado (www.festivalrastro.com) teve início ontem. A idealização do projeto ficou por conta da produtora Três Produz, composta por Bethania Maia, Rafaella Rezende e Renata Schelb. O festival ocorre até 28 de junho e presta uma homenagem à cineastas piauiense radicada em Brasília, Dácia Ibiapina. O evento é on-line e contará com a exibição de sessões competitivas de longas e curtas-metragens. Além disso, serão disponibilizadas oficinas e conversas com convidados especiais, como os documentaristas Alice Lanari e Luiz Carlos Oliveira Jr.
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