Os hospitais do Distrito Federal são a linha de frente no combate à covid-19, mas a assistência das pessoas que chegam às unidades de saúde pública, muitas vezes começa bem antes. Em meio a sirenes e equipamentos de proteção individual (EPIs), profissionais do Serviço de Atendimento Médico de Urgência (Samu) correm contra o tempo, em um socorro que muitas vezes começa por telefone, antes mesmo de a ambulância sair da base. Assim, como os profissionais das unidades de saúde, os servidores do Samu são heróis nesse momento tão conturbado.
A enfermeira Cristina Ayako, 45 anos, está no Samu há 14 anos. Todo dia, ela sai de casa, deixando a mãe idosa e os dois filhos, de 14 e 15 anos, um deles asmático. Com acessórios de proteção, ela carrega, principalmente, a fé e o comprometimento em ajudar o próximo. “É uma missão prestar socorro e ajudar o próximo”, destaca. Cristina trabalha em uma viatura equipada para o atendimento de crianças — Unidade de Suporte Avançado e Neonatologia. Como mãe, uma motivação ainda maior de prestar o serviço da melhor maneira possível. “Já pegamos bebês com suspeita de covid-19. Ajudar me dá força também. Eu sou mãe e, se meu filho precisar, quero que ele tenha uma garantia de assistência. O fato do nosso serviço fazer bem para alguém nos fortalece, além de saber que, se algum familiar precisar, ele também vai ser atendido”, ressalta.
No fim do expediente, Cristina sai com a certeza de ter dado o seu melhor. E assim, deixando os aparelhos que a manteve em segurança durante o serviço, volta para a família. Em casa, o banho vem antes de entrar na residência. “Tenho um banheiro na varanda. Lá, eu tiro a roupa de serviço, tomo um banho, antes de entrar em casa. Graça a Deus, tenho esse privilégio de chegar e ir direto para o banho”, destaca. O cabelo também é lavado diariamente. Tudo para manter ela e a família em segurança.
Desafio
Atualmente, o Samu tem 960 servidores. Desses, 630 lidam diretamente com os pacientes. Uma equipe administrada pelo diretor do serviço, Alexandre Garcia Barbosa. “É um desafio enorme, mas também uma honra poder colaborar em um momento em que a saúde precisa dar uma resposta de forma mais assertiva aos usuários”, ressalta Barbosa. Para ele, uma das maiores tarefas é prestar todo atendimento necessário durante uma pandemia com a mesma quantidade de recurso de tempos comuns. “A gente tem um número de servidores dimensionado pelo Ministério da Saúde. A pandemia está fazendo com que gerenciemos os recursos ainda mais, para potencializar e otimizar o trabalho, utilizando o mesmo número de pessoas e viaturas”, explicou.
O Samu tem 38 ambulâncias: 30 de suporte básico — com um motorista e um técnico de enfermagem — e oito de suporte avançado — com um motorista, um médico e um enfermeiro. Durante a pandemia, o serviço recebe cerca de 60 mil chamadas mensais. Antes, a média era de 78 mil ligações pelo 192, por mês, exceto em período de férias. Para Alexandre, o número de ligações diminuiu devido ao isolamento social, além do medo da população em chamar uma ambulância para quadros de saúde leves. No entanto, a transferência de pacientes entre unidades hospitalares dobrou. Se antes a média diária era de 12 mudanças, durante a pandemia, o Samu já chegou a fazer 26 por dia. Com quadros de covid-19, só em junho foram 162 transportes. O número representa mais que a somatória desse tipo de atendimento entre março, abril e maio, três, 34 e 124, respectivamente.
Os cuidados para evitar contaminações vão desde a higienização das ambulâncias à paramentação da equipe. A cada atendimento de covid-19, é trocado todos os equipamentos descartáveis de EPI e o veículo passa por uma higienização durante cerca de 40 minutos. Mas, apesar do cuidado, 10 profissionais do Samu testaram positivo para covid-19, segundo Alexandre Barbosa. O diretor explica que, quando algum servidor sente os sintomas da doença, ele é automaticamente afastado do serviço, até que seja feito o teste. Ao todo, 31 funcionários foram afastados por quadro provável da doença. Desses, nove ainda aguardam resultados.
Proteção
Uma roupa comum, um macacão, um coturno impermeável, um capote, uma máscara N95, óculos, uma máscara face shield e luvas. É possível enumerar, pelo menos, oito equipamentos, entre roupas e acessórios na rotina de trabalho da médica Ana Luiza Ribeiro Diogo, 30. Todo esse aparato é o que separa ela do risco de contaminação da covid-19, ao sair para atender um paciente com suspeita da doença, além dos protocolos como higienização da ambulância.
“Eu tenho conversado comigo mesma: vou entubar pacientes com covid, vou transportar pacientes com covid e eu preciso estar bem. Se eu for me desesperar ou tiver medo, não vou conseguir fazer o meu trabalho. A minha prioridade é o paciente”, diz. Para se proteger, os protocolos de segurança são fundamentais, mesmo sendo, algumas vezes, desconfortáveis. “Eu saio do plantão e estou toda suada dentro do macacão”, comenta. No fim do serviço, os cuidados continuam. O uniforme é retirado ainda na base do Samu e colocado em um saco no carro. “O porta-malas do meu carro é só para o Samu. Não coloco mais nada lá que não seja do trabalho”, afirma. Ana também deixa o coturno no local de serviço e em casa vai direto para o banho.
Para a médica, o apoio e o reconhecimento da população também têm sido um importante fator de fortalecimento para os profissionais. Atitudes como entrega de cartas, agradecimentos são demonstrações de afeto daqueles que reconhecem importância do serviço. “É bom saber que estamos sendo mais valorizados. A gente tem notado, inclusive, mais pessoas abrindo espaço para as ambulâncias passarem. Muitos não davam importância. Além disso, temos os agradecimentos ao final dos atendimentos”, destaca.
A estrutura
960: servidores
38: viaturas em serviço
10: trabalhadores contaminados
O crescimento
» Chamadas para transporte de pacientes confirmados de covid-19
Março: 3
Abril: 34
Maio: 123
Junho (até dia 19): 162
Serviço
Número para chamadas de emergência: 192