No momento em que a economia do Distrito Federal caminhava a passos lentos rumo à recuperação e animava o setor produtivo, a chegada do novo coronavírus ao país conteve expectativas e reverteu o cenário do início do ano. Os efeitos da pandemia atingiram empresas e também o bolso dos consumidores. De janeiro a maio, os preços de produtos básicos caíram no DF, mas isso não significa que a situação econômica se tornou mais favorável para a população. O período é de incertezas e os efeitos da crise a longo prazo ainda são indeterminados.
Na capital federal, a inflação oficial, verificada pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), está em ritmo de queda desde março, mesmo mês em que as medidas de isolamento social entraram em vigor. A mudança nos hábitos de consumo da população teve forte impacto sobre os resultados acumulados, e a redução de preços, puxada principalmente pelo grupo dos transportes, só não foi maior por causa da alta demanda por alimentos e bebidas.
Em março, o medo de um possível desabastecimento gerou insegurança entre os brasilienses e correria aos supermercados. Como consequência, os preços de produtos como frutas, verduras, legumes, carnes e alimentação fora do domicílio foram os que mais subiram. Em abril, a situação continuou parecida — exceto pelas carnes, que registraram pequena queda. Essa pressão sobre as finanças dos brasilienses só se atenuou no mês passado, quando alimentos e bebidas tiveram a primeira variação negativa desde o início da pandemia.
Moradora da Asa Sul, Sumara Gallo, 45 anos, não sentiu muito a queda nos preços e percebeu a falta de mais promoções no varejo, especialmente para frutas, verduras e legumes. Para tentar economizar, a servidora pública passou a dar preferência para feiras locais. “Elas estão bem melhores do que os mercados. Algumas mercearias até mantiveram preços, mas os mercados estão superando muito. A meu ver, o impacto maior foi em (produtos de) hortifrúti”, comenta.
Sumara acrescenta que os gastos em casa subiram principalmente porque a família não tem comido fora. “Estamos comprando mais vezes e voltando para casa com menos produtos. Antigamente, conseguíamos passar todo o mês com as compras. Agora, nem até a metade do mês elas chegam”, afirma. Em relação à diminuição das promoções nas redes de mercados, Sumara acredita que a mudança ocorreu pelo fato de haver menos clientes nas lojas físicas. “Costumávamos ir a um mercado diferente a depender do dia da semana por causa disso. Mas, desde que começou a pandemia, nunca mais vimos essas ofertas.”
Sazonalidade
Gerente de contas e estudos setoriais da Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan), Jéssica Milker considera que os efeitos do momento são, primordialmente, deflacionistas. “A redução da oferta não foi tão grande quanto a redução da demanda. Isso fez com que víssemos em março e abril uma contração dos preços”, observa. “O comportamento dos preços nos dois primeiros meses estava de acordo com a sazonalidade do período. A partir de março, tivemos menos circulação de pessoas e, por isso, redução no consumo de bens não essenciais, além da suspensão de atividades econômicas. Houve demissões e diminuição da carga horária, com a contrapartida da redução de salários. Isso reduz o poder de consumo das famílias.”
O panorama impacta o bolso dos consumidores de maneiras bem diferentes. Enquanto alguns não sentiram mudanças significativas no orçamento doméstico desde que o novo coronavírus chegou ao DF, 333 mil brasilienses enfrentam essa fase sem um emprego. Além disso, uma parcela das pessoas teve de contar com auxílio de algum programa temporário de transferência de renda para conseguir se sustentar.
Doutora em economia e professora da Fundação Getulio Vargas (FGV), Virene Matesco destaca que há muita incerteza em torno das projeções para os próximos meses. Porém, ela lembra que o movimento econômico atual é “relativamente esperado”. “Não há demanda, as pessoas estão muito comedidas, elas não sabem se amanhã terão emprego. O que elas podiam cortar (de gastos) já cortaram e estão fazendo ajustes. Tem muita gente em casa ganhando menos do que ganhava, outros não sabem se voltarão para o trabalho na mesma posição. Estamos todos cautelosos”, pontua.
Sobre o cenário de queda nos preços, Virene avalia que ainda não é possível considerá-lo como uma fase de deflação, ainda que essa seja a direção. “Por enquanto, estamos com uma queda acentuada de preços. Mas não é o Brasil, é o mundo inteiro. Só consideramos deflação quando há acúmulo de três trimestres. Tivemos dois meses de queda de preços (no IPCA do Brasil), e a tendência é essa. Mas não se pode dizer que estamos em deflação. No acumulado de 12 meses, a inflação ainda é positiva. É muito baixa historicamente, mas não podemos dizer isso, ainda”, completa.
Oscilação
Confira as flutuações nas médias de preços na Ceasa-DF nos últimos seis meses:
Em queda
» Abacate
» Abacaxi
» Beterraba
» Cará
» Coco verde
» Couve-flor
» Inhame
» Maracujá azedo
» Pepino
Pouca variação no período
» Abóbora
» Abobrinha
» Alface
» Banana-nanica
» Banana-prata
» Batata-doce
» Brócolis
» Cenoura
» Chuchu
» Couve
» Jiló
» Laranja pera
» Maçã nacional
» Mandioca/aipim
» Mandioquinha
» Manga
» Melancia
» Milho verde
» Morango
» Pera estrangeira
» Pimentão verde
» Repolho
» Tangerina
» Tomate
» Uva Itália
» Uva Niágara
» Uva rubi
» Vagem
Em alta
» Alho
» Batata
» Berinjela
» Cebola
» Goiaba
» Limão Tahiti
» Mamão Formosa
» Mamão Havaí
» Melão amarelo
» Ovo
» Quiabo
Fonte: Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), em 15/6/2020