Após uma série de reviravoltas e de um imbróglio que se arrastou desde o início dos atuais governos local e federal, o reajuste para as forças de segurança do Distrito Federal se concretizou. O presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), editou, ontem, medida provisória que concede a recomposição salarial para policiais civis e militares, além de bombeiros. Pagos com recursos do Fundo Constitucional (cujos recursos provêm da União), os profissionais dependiam do aval da Presidência para que a medida saísse do papel.
O texto prevê que o aumento seja de cerca de 8% para as categorias. Para se chegar a um percentual similar para todos, foi preciso estabelecer método distinto para militares e civis, pois a composição salarial das forças é diferente. Por isso, o acréscimo será linear e de 8% para policiais civis. No caso de bombeiros e PMs, a saída para equilibrar foi conceder reajuste de 25% sobre a vantagem pecuniária especial (VPEs). Na prática, o valor final dos contracheques será cerca de 8% maior para todos.
Hoje, as VPEs da PM variam de R$ 1.498,95 a R$ 7.279,17, e passarão a ser de R$ 1.873,69 a R$ 9.098,96. Na Polícia Civil, agentes recebem salários entre R$ 8.698,78 e R$ 13.751,51. Com o reajuste, os números serão de R$ 9.394,68 a R$ 14.851,63. Para os delegados, os salários saem da margem de R$ 16.830,85 a R$ 22.805 para R$ 18.177,32 a R$ 24.629,40. O impacto estimado, de acordo com estudo da área econômica do governo federal, é de R$ 504,97 milhões.
O reajuste ficou próximo de se efetivar no ano passado (leia Linha do tempo). Em dezembro, o presidente assinou medida provisória com teor similar ao da que foi publicada ontem. No entanto, não havia previsão orçamentária na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) deste ano e foi preciso enviar um projeto de lei ao Congresso Nacional para a inclusão.
A medida provisória foi assinada pelo presidente no início da tarde de ontem no Palácio do Planalto. Hospitalizado, o governador Ibaneis Rocha (MDB) foi representado pelo vice-governador Paco Britto (Avante), que defendeu a necessidade do reajuste por causa da defasagem salarial das categorias. “Foi uma correção para a melhor polícia do país. Não é um aumento, é uma equiparação dos salários dessas corporações e um reconhecimento da qualidade delas”, afirmou Paco.
Além dele, estiveram no Planalto para a assinatura da MP o secretário de Segurança Pública do DF, Anderson Torres, o ex-deputado federal Alberto Fraga (DEM-DF), o senador Izalci Lucas (PSDB-DF), a deputada federal Paula Belmonte (Cidadania-DF) e o presidente do Senado, Davil Alcolumbre (DEM-AP).
“Foi um processo de mais de 1 ano de busca de uma recomposição salarial extremamente justa para as carreiras da segurança pública. Isso é uma grande vitória em um momento difícil e que não tem sido diferente para as forças policiais”, ressaltou o secretário de Segurança Pública do DF, Anderson Torres.
Justificativa
Um dos que participaram ativamente da articulação do reajuste, o senador Izalci Lucas defende a importância do aumento mesmo no cenário de crise, causado pela pandemia do novo coronavírus. “Por mais que as pessoas se perguntem por que dar um reajuste nesse momento, é preciso lembrar que isso era pra ter sido feito há muito tempo. Estávamos autorizados desde 2019 e ficamos presos em questões operacionais. É, ainda, uma pequena recomposição, mas muito justa”, defende.
Apesar de ter validade imediata, a MP precisa ser referendada pelo Congresso Nacional para a mudança continuar ativa. O prazo para isso é de 60 dias, prorrogáveis por igual período. Izalci acredita que o texto passará pelos parlamentares sem dificuldade. “É uma medida que a gente vai votar rapidamente, porque, como o projeto de lei que mudava o orçamento foi aprovado, não tem razão não votar a MP que vai no mesmo alinhamento.”
A articulação para que a MP fosse editada com rapidez por Bolsonaro se justificou pelo fato de que o presidente deve sancionar, em breve, texto que garante auxílio para estados e municípios, com previsão de congelamento do salário de servidores. O Congresso retirou algumas categorias, como os profissionais da segurança, da restrição, mas Bolsonaro, a pedido do ministro da Economia, Paulo Guedes, anunciou que vetará os destaques. Por isso, era fundamental que o reajuste para as corporações do DF fosse aprovado antes do veto do presidente que impossibilitaria completamente a recomposição em 2020.
Salários
Impacto
R$ 504,97 milhões
Total do reajuste para as forças de segurança do DF
R$ 364,29 milhões
Valor previsto para o aumento a policiais militares e bombeiros
R$ 140,68 milhões
Recursos destinados para reajuste dos policiais civis
Salários
Polícia Militar e Corpo de Bombeiros
Atualmente
De R$ 1.498,95 a R$ 7.279,17
Com o reajuste
De R$ 1.873,69 a R$ 9.098,96
(Valores referentes à vantagem pecuniária especial)
Polícia Civil
Agentes
Atualmente
De R$ 8.698,78 a R$ 13.751,51
Com o reajuste
De R$ 9.394,68 a R$ 14.851,63
Delegados
Atualmente
De R$ 16.830,85 a R$ 22.805,0
Com o reajuste
De R$ 18.177,32 a R$ 24.629,40
Linha do tempo
2019
26 de fevereiro
GDF encaminha para o governo federal a proposta de aumento de 37% para a Polícia Civil, com equiparação do salário da corporação com a Polícia Federal.
8 de outubro
Bolsonaro afirma que só autorizaria a recomposição caso o reajuste fosse o mesmo para policiais militares e bombeiros.
20 de novembro
O Executivo local manda a proposta para militares, de cerca de 31,5%. A resposta do Planalto é a de que só seria possível conceder 8% para todos.
24 de dezembro
Ibaneis e Bolsonaro se reúnem e o presidente assina medida provisória que permitiria o reajuste imediato de 8%.
27 de dezembro
O presidente é alertado pela equipe econômica de que a MP poderia ferir a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e recua.
2020
3 de fevereiro
Presidência encaminha o projeto de lei que inclui a previsão na Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2020.
13 de maio
Congresso Nacional aprova projeto que inclui a possibilidade do reajuste no orçamento.
26 de maio
O presidente Jair Bolsonaro assina a medida provisória que autoriza a recomposição.
Categorias comemoram
Na visão das entidades representativas das corporações, a assinatura da medida provisória é uma vitória e recompensa o trabalho efetuado na capital federal. A defasagem salarial é um dos argumentos para defender a importância e a necessidade do reajuste mesmo em um momento de crise.
“É uma justa recompensa. Isso só vem para aumentar o ânimo dos policiais militares e bombeiros que estão na rua no combate à pandemia, distribuindo máscaras, cestas, colocando em risco a própria vida e a família. Só vem ratificar também o respeito pela PMDF”, diz o tenente-coronel Jorge Eduardo Naime, presidente da Associação dos Oficiais da Polícia Militar (Asof-PMDF). “Na realidade, é uma recomposição por termos sido o estado mais prejudicado com a previdência dos militares”, acrescenta.
O presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia Civil do Distrito Federal (Sindepo-DF), Rafael Sampaio, destaca que o reajuste é resultado de uma luta que vem de muito tempo. “Aguardamos algum sinal em relação salarial há anos. Estamos sem nenhuma recomposição desde 2013. Apesar de o valor não ser o que esperávamos, diante do cenário atual, consideramos que é uma grande vitória.”
A articulação inicial era de que o reajuste para a Polícia Civil fosse de 37%. O percentual garantiria paridade com os salários da Polícia Federal — as duas instituições eram unificadas e depois foram desmembradas. Rodrigo Franco, presidente do Sindicato dos Policiais Civis do Distrito Federal (Sinpol-DF), também avalia que o aumento é um vitória, mas destaca que a paridade não será deixada de lado. “Essa medida recompõe parcialmente as perdas salariais dos policiais civis. Nos últimos dez anos, a inflação corroeu o salário da categoria em mais de 60%.”