Com o movimento mais intenso de flexibilização do comércio, o aumento da circulação de pessoas nas ruas e a queda no índice de distanciamento social, os casos de coronavírus no Distrito Federal devem aumentar, avaliam especialistas. Para evitar o colapso na rede de saúde, é fundamental que o momento seja de avaliação constante, recomendam, e de implementação de medidas de seguranças que possam garantir que o cenário na capital permaneça sob controle.
Atualmente, o DF está longe de figurar entre as unidades da Federação (veja Em comparação) com maiores dificuldades no combate ao coronavírus. Com letalidade muito abaixo do que a média nacional, e número de leitos e de equipamentos até o momento suficientes para atender à demanda, a capital federal conseguiu retardar a disseminação do vírus e o agravamento de casos mais sensíveis.
A avaliação, no entanto, é de que o DF precisa manter-se em alerta constante para evitar que a situação se agrave e os resultados obtidos até agora sejam perdidos. O momento atual, explica o especialista em doenças infecciosas e médico do Hospital de Base e das Forças Armadas (HFA) Hemerson Luz, é reflexo das medidas iniciais mais drásticas que prepararam o sistema local para a covid-19.
“O distanciamento social precoce foi muito importante e a baixa letalidade está ligada ao acesso ao suporte clínico. Sem isso, nosso índice de mortes seria muito mais alto. Temos acesso a exames, suporte clínico e vagas abertas. Tudo isso contribuiu”, explica. “Mas, o momento ainda é delicado e precisa ser avaliado constantemente, o que o governo local tem feito até agora.”
A flexibilização das atividades comerciais, para o infectologista, deve ser interpretada como uma medida que pode ser revista a qualquer momento, a partir da análise do quadro atual. “Ela é um caminho de duas vias. Assim como se flexibiliza, se ameaçar nossa capacidade de atendimento, podemos reverter a decisão. Se chegar a uma ameaça de perder o controle e a demanda de atendimentos ultrapassar a capacidade de suporte, pode haver até a implementação de medidas mais duras.”
O aumento no número de casos, com a abertura de parte do comércio e a queda no distanciamento social, é certo, afirma o infectologista Alexandre Cunha, do Hospital Brasília. “A grande questão é se a velocidade desse aumento consegue ser suportada pelo sistema de saúde”, pondera. “Nós tínhamos UTIs vazias há poucas semanas e hoje não é mais assim. Apesar de não haver lotação, a ocupação é muito maior. Então, essas questões mudam.”
Por essas razões, defende também Cunha, é importante que as autoridades mantenham monitoramentos para avaliar o impacto das novas medidas. “Essa análise tem que ser feita de 10 a 15 dias. As pessoas começam a ter contato e ocorre o contágio, o período de incubação é de cerca de cinco dias e o de agravamento, de cinco a 10 dias. Então, só vai dar para avaliar esse reflexo entre 10 e 15 dias”, detalha. “Por isso, esse movimento tem que ser gradual, para permitir decidir se há a necessidade de reverter.”
Contenção
Com o aumento de casos considerados como certo, especialistas destacam que algumas medidas podem ser tomadas em busca de contenção. “Muito já tem se falado sobre questões como o uso da máscara e a oferta de álcool em gel nos estabelecimentos, que são importantes. Também é preciso pensar na estrutura de suporte, mas esses dois primeiros meses ajudaram a melhorar o sistema”, destaca Alexandre Cunha.
Cada setor precisa ter regras específicas, recomenda Hemerson Luz. “Isso pode garantir o controle no número dos clientes, o espaçamento entre as pessoas, além de medidas como o controle de temperatura nas entradas e o uso de máscaras”, frisa. “O distanciamento também deve ser respeitado o máximo possível”, complementa.
A Secretaria de Saúde reforça que a recomendação de distanciamento social permanece e constitui a principal medida para a diminuição do contágio. “Se comparado com as projeções iniciais, sem as medidas de distanciamento social, houve uma redução na velocidade do crescimento no número de casos de infectados, internados e mortes”, informa a pasta. “A projeção para o mês de abril era de 15 mil casos graves que, possivelmente, necessitariam de UTI. Com a adoção dessas medidas, a avaliação é de que tenhamos um total de casos críticos, no pico da pandemia, em torno de 700 registros.”
Não há, segundo a secretaria, sobrecarga no sistema de saúde atualmente e ações, como os testes em massa, são prioritárias. Até 19 de maio, quase 80 mil brasilienses passaram por exames e a pasta assinou contrato emergencial para a execução de serviços laboratoriais e de análise clínica de mais 100 mil testes rápidos, no período de 15 dias.
Regras
Com a liberação de mais atividades, o GDF endureceu a fiscalização de regras contra a disseminação da covid-19. Passou a valer, na última segunda-feira, multas — a partir R$ 2 mil — para quem não utilizar máscaras. Dez equipes com representantes de vários órgãos atuam no controle.
A Secretaria DF Legal também apertou o cerco contra os estabelecimentos não autorizados que voltem a funcionar. “Desde o fim de março, tem realizado fechamentos e interdições de comércios, que em função da covid-19 não estão autorizados a funcionar. Até o momento, cerca de 23 mil foram fechados compulsoriamente, e 971 interditados e 23 multados”, informou a pasta.
“A projeção para o mês de abril era de 15 mil casos graves que, possivelmente, necessitariam de UTI. Com a adoção dessas medidas, a avaliação é de que tenhamos um total de casos críticos, no pico da pandemia, em torno de 700 casos”
Nota da Secretaria de Saúde