Não deu, o caminho ficou pra um dia qualquer, se ainda estivermos por aqui. O coronavírus atropelou os seus e os meus sonhos; devorou a inútil sensação de domínio sobre os meus atos e planos. Penso: como estaria agora chegando a Compostela com a Vieira na mochila, o cansaço físico, a histórica experiência, as fotos extraordinárias e a sensação de dever cumprido? Feliz? Muito provavelmente. Ou não. Poderia não ter conseguido cumprir as metas em todos os níveis, poderia ter ficado ainda mais frustrada do que com a covid-19. Poderia.
Essa sensação de impotência, de finitude, de poucas certezas tem, sim, seu lado bom. Porque nos põe no lugar e nos impõe o tamanho que devemos ter. Somos aquilo que a vida nos deixa ser. Um grande e amado amigo, hoje na sala inóspita de uma UTI, me diria, se estivesse ao meu lado tomando um vinho: programe-se para ir assim que isso tudo acabar, pare de querer escanear o futuro, vá e experimente enquanto há tempo. Torço, meu amigo, para que você em breve me diga pessoalmente que suas palavras fazem todo o sentido. E prometo que, se eu tiver a oportunidade, vou agradecer e celebrar em Cascia, na Itália, a sua vitória na luta pela vida.
Viver é agora, meus caros. Com essa terrível realidade da covid-19, vamos vivenciar cada pedacinho do que nos resta. Enxergar por cada fresta de janela, falar por todas as telas que restam, amar com mais força o próximo e nossa família. E quanto a Santiago, eu garanto que um dia percorrerei o caminho, depois que a quarentena passar.