Ao contrário do cenário em outras unidades da Federação, como o Amazonas, a situação de cemitérios e funerárias do Distrito Federal se mantém controlada durante a pandemia do novo coronavírus. A taxa de letalidade — cerca de 2,5% — mais baixa do que a média nacional — por volta de 7% — é um dos fatores que contribuem para que a oferta de jazigos e de serviços assistenciais para os óbitos esteja longe do colapso. O DF registra, até então, 30 mortes causadas pela Covid-19.
Atualmente, há 1,7 mil jazigos construídos e disponíveis no seis cemitérios da capital federal. O total é suficiente, na demanda atual, para cerca de cinco meses — podendo chegar a seis —, de acordo com o consórcio Campo da Esperança, responsável pela gestão dos locais. Além disso, há 90 mil gavetas disponíveis. No entanto, elas são destinadas a famílias que compraram o espaço anteriormente. Essa quantidade é suficiente, de acordo com o consórcio, para oito anos.
A expectativa é de que o número de mortes no DF não chegue a um volume que possa causar a necessidade de abertura de mais jazigos. O consórcio, no entanto, afirma que a construção desses espaços é rotineira e que há diálogo constante com o governo local para avaliar a necessidade de expansão das áreas destinadas para os corpos. “Se necessária, o que esperamos que não aconteça, qualquer medida nesse sentido será definida em conjunto com o GDF”, diz nota encaminhada pela assessoria de imprensa ao Correio.
Apesar de não haver carência de jazigos, a Covid-19 alterou a rotina nos cemitérios do Distrito Federal. O GDF publicou um protocolo de manuseio de cadáveres e prevenção ao coronavírus, que deve ser seguido na preparação dos corpos. Os caixões de vítimas da doença chegam lacrados para o sepultamento e não há velório. As medidas se estendem também para segurança dos trabalhadores, que passaram a usar máscaras, luvas e óculos.
No início de abril, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) manifestou preocupação com a situação e recomendou ao Campo da Esperança que protocolos, como o limite de pessoas nas cerimônias, fossem seguidos. De acordo com a instituição, “todos os pontos da recomendação foram cumpridos”.
Atualmente, não há pontos de cremação no DF, mas, em dezembro de 2019, o Ibram liberou a atividade ao consórcio Campo da Esperança. O equipamento para esse tipo de procedimento foi adquirido e funcionará em um espaço ao lado da unidade da Asa Sul. A área precisa ser liberada pelo GDF para o início das reformas necessárias.
O Correio encaminhou, por e-mail, questionamentos sobre o tema para a Secretaria de Justiça do DF, responsável pelo acompanhamento e fiscalização de cemitérios e funerárias, em 23, 27 e 28 de abril. A pasta, no entanto, não se manifestou até o fechamento desta edição.
Mais espaço
Houve exumações recentes na unidade de Taguatinga do Campo da Esperança. A concessionária, porém, nega qualquer relação do processo com a pandemia do novo coronavírus. “Ele faz parte de um plano de reaproveitamento do espaço para novos sepultamentos iniciado há quatro anos, muito antes do surgimento do novo coronavírus. O procedimento é feito de acordo com a legislação”, destaca nota da concessionária.
As exumações são feitas em jazigos sociais, cedidos ao GDF para o sepultamento de pessoas em situação de vulnerabilidade, e os restos mortais são preservados no ossário do próprio cemitério ou entregues aos familiares que manifestarem esse desejo.
Funerárias mantêm estoques
Nas empresas funerárias da capital, não há, até agora, registro de aumento significativo da demanda ou dificuldades para atender por causa da Covid-19. Felismino Alves, presidente do Sindicato das Empresas Funerárias do DF, credita o ambiente de controle também à baixa taxa de letalidade registrada na capital federal. “Somos cerca de 45 empresas do ramo aqui no DF e não houve mudança nesse sentido ainda”, afirma.
O dirigente explica que a maior diferença se dá nas medidas de segurança tomadas para proteger trabalhadores e evitar a disseminação do vírus. “Nós, que estamos na ponta e trabalhamos com isso, precisamos ter um cuidado muito grande para não colocar nossas vidas em risco. Então, estamos tendo muita atenção com todo esse processo e com relação ao uso de EPIs (equipamentos de proteção individual)”, conta.
Alves acredita que, mesmo que o número de mortes seja maior do que o esperado, a estrutura de funerárias da capital será suficiente. “Hoje, nós temos cerca de 4,5 mil unidades dessas 45 empresas do ramo. Os nossos fornecedores também estão perto. Então, creio que se isso ocorrer, e esperamos que não venha a acontecer, estamos preparados.”
Distanciamento
Responsável pela situação controlada nos cemitérios e funerárias da capital — diferentemente do que se registra em outras regiões, a baixa letalidade no DF, de cerca de 2,5%, é resultado de ações restritivas no combate à Covid-19 como o distanciamento social. “Acredito, sim, que o isolamento social tenha contribuído para a situação que vivemos hoje, que é até cômoda quando comparada com outros lugares, como Amazonas, que já perdeu o controle, ou mesmo São Paulo. O DF fez o dever de casa”, avalia o especialista em doenças infecciosas e médico do Hospital de Base e das Forças Armadas (HFA) Hemerson Luz.
Ele destaca, também, como medida importante para conter a Covid-19, a preparação da estrutura do sistema de saúde. “Isso foi preparado, mesmo que não seja o ideal, para o aumento dos casos. Como pacientes têm acesso a medidas terapêuticas de forma mais fácil do que em outros lugares, chegamos a essa letalidade menor. Nós conseguimos conter um avanço esperado com todo o trabalho conjunto em cuidados operacionais, preparo das equipes, treinamentos, uso das EPIs”, argumenta.
O especialista ressalta que relaxar o isolamento, no entanto, pode trazer danos. “Será preciso fazer análise constante para saber se as decisões são certas ou devem ser revistas. Essa avaliação não é instantânea, porque os dados nos revelam um reflexo do que ocorreu dias atrás, mas precisamos tomar esse cuidado.” Ele elogia a obrigatoriedade do uso de máscaras, o que, de acordo com dele, pode contribuir para frear a disseminação, ao lado de outras medidas de higiene.