Esta matéria foi publicada originalmente na edição de 12 de fevereiro de 2010 do Correio. Sua republicação faz parte do projeto Brasília Sexagenária, que até 21 de abril de 2020 trará, diariamente, reportagens e fotos marcantes da história da capital. Acompanhe a série no site especial e no nosso Instagram.
Foi rápida a sessão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que determinou a prisão preventiva do governador José Roberto Arruda (sem partido) e outras cinco pessoas, todas acusadas de formar uma organização criminosa sem qualquer apreço ao Judiciário para destruir provas que incriminem o governador no escândalo que ficou conhecido como Caixa de Pandora. Em menos de duas horas, num julgamento sem precedentes na história brasileira, 12 ministros decretaram a prisão preventiva do chefe do Executivo local. Seguiram voto contundente do relator, ministro Fernando Gonçalves, que sustentou haver fortes indícios de tentativa de corrupção de testemunhas.
A prisão preventiva foi decretada com base na acusação de que Arruda utilizou um conselheiro do Metrô-DF, Antônio Bento, para subornar o jornalista Edmilson Edson dos Santos, o Sombra, com intuito de que ele fizesse um depoimento que desqualificasse provas sobre o esquema de corrupção no DF supostamente chefiado pelo governador. Segundo Gonçalves, esse fato mostra que as investigações da Operação Caixa de Pandora nem sequer foram capazes de paralisar ou inibir a “organização criminosa”. O relator defendeu em seu voto que a prisão é necessária para evitar que o grupo comandado por Arruda destruísse evidências sob pena de o Estado, mais uma vez, sucumbir ao poder da “criminalidade organizada” (leia abaixo trechos do voto do relator).
No julgamento do STJ, o ministro Nilson Naves tentou desqualificar o pedido de prisão preventiva argumentando que não era possível tal decisão sem autorização da Câmara Legislativa, mas acabou derrotado. Ele conseguiu despertar polêmica e seu voto foi seguido por outros três ministros: Teori Zavascki, João Otávio Noronha e Castro Meira. Fernando Gonçalves, no entanto, argumentou que se tratava de uma medida cautelar de prisão para evitar prejuízos ao futuro processo a ser aberto a partir do Inquérito nº 650. O presidente do STJ, César Asfor Rocha, não votou, mas demonstrou que, se fosse necessário, seguiria posição do relator.
Medida extrema
Vencida a preliminar sobre a participação da Câmara, o mérito do pedido de prisão foi decidido por 12 votos a dois. Além de Nilson Naves, que voltou a defender o governador, o ministro Teori Zavascki também deu o voto pró-Arruda. Ambos consideraram que prisão é medida extrema. O ministro Luiz Fux argumentou que impedir a prisão de Arruda para esperar uma autorização da Câmara seria o mesmo que não prender um agente político que cometeu assassinato à luz do dia. Para o ministro Massami Uyeda, seria conferir impunidade ao caso. O relator Fernando Gonçalves explicou o motivo da detenção: “A prisão preventiva é uma medida cautelar para proteger o processo”, disse. “Tem relação com a apuração do caso e não com a pena”, explicou.
Além de Arruda, o STJ determinou a prisão do suplente de deputado distrital Geraldo Naves; do ex-secretário de Comunicação Weligton Moraes; do ex-secretário particular de Arruda Rodrigo Arantes; e de Haroaldo Brasil Carvalho, ex-diretor da Companhia Energética de Brasília (CEB). A prisão preventiva do grupo foi pedida pelo Ministério Público e acabou acatada sob os crimes de ofensa à ordem pública e à instrução criminal.
Argumentação contundente
Confira pontos do voto do relator, o ministro do STJ Fernando Gonçalves
> “A organização criminosa instalada no DF continua valendo-se de dinheiro para impedir investigações”
>“Somando o fato que o paciente é membro e dos principais mentores da organização criminosa, tem grande poder de fuga”
>“Os monitoramentos telefônicos indicam sua pretensão de não se submeter à lei brasileira”
Hora a hora
Confira os principais momentos do dia em que o governador do Distrito Federal foi preso:
11h
O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, protocola no Superior Tribunal de Justiça (STJ) denúncia contra o governador José Roberto Arruda (sem partido). Entre as aleações, estão ofensa à ordem pública e à instrução criminal.
11h15
O relator do Inquérito nº 650, em tramitação no STJ, ministro Fernando Gonçalves, decreta a prisão do governador do ex-deputado Geraldo Naves, do ex-secretário de Comunicação do GDF Weligton Moraes, do ex-diretor da Companhia Energética de Brasília (CEB) Haroaldo Brasil de Carvalho e de Rodrigo Arantes, ex-secretário particular de Arruda. Também é decretada a prisão de Antônio Bento, conselheiro do Metrô-DF, que já estava detido na Papuda desde a semana passada.
13h40
O ministro relator pede ao presidente do STJ, Francisco Cesar Asfor Rocha, que seja convocada a Corte Especial - formada pelos 15 dos 33 ministros mais antigos do tribunal - para referendar a decisão.
15h
Os ministros da Corte Especial do STJ se reúnem em plenário. Primeiro, os magistrados votam se precisariam da autorização da Câmara Legislativa para pedir a prisão do governador.
15h30
Um carta escrita por Arruda é encaminhada à Câmara Legislativa.
16h45
Seis viaturas da Polícia Militar fazem a segurança na Residência Oficial do governador, em Águas Claras. Um helicóptero da Polícia Federal sobrevoa o local.
17h
Por 10 votos a 4, os ministros do STJ concluem que a licença do Legislativo não é necessária para que eles decretem a prisão e o afastamento de Arruda.
17h20
Seis carros pretos saem em alta velocidade da Residência Oficial do governador. Arruda está em um dos veículos.
17h30
É publicada no site do DEM a seguinte mensagem: “Seguindo a deliberação da sua Executiva Nacional e dos líderes das bancadas na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, o Democratas determina aos seus filiados a imediata saída dos cargos que ocupam no Governo José Roberto Arruda”.
17h45
A comitiva do governador à Superintendência da Polícia Federal, no Setor Policial Sul.
17h55
O Batalhão de Trânsito e a Rondas Ostensivas Táticas Motorizadas, ambos da Polícia Militar do DF, fecham os acessos ao Setor Policial Sul.
19h
Manifestantes do Movimento Fora Arruda se reúnem para uma vigília em frente ao STF. Eles querem pressionar os ministros da Corte a negarem habeas corpus ao governador do Distrito Federal.
19h40
Oficiais de Justiça entregam à PF os mandados de prisão. A detençã ode Arruda passa a ser oficial. Ele é levado à sala de Estado Maior.
20h30
Rodrigo Arantes, ex-secretário particular de Arruda se apresenta à Polícia Federal.