O avanço do coronavírus no Distrito Federal ligou o alerta no Ministério da Saúde. Em entrevista coletiva no Palácio do Planalto ontem, o titular da pasta, Luiz Henrique Mandetta, ressaltou a importância de a capital federal ter uma ação preventiva eficaz contra a Covid-19 porque concentra um grande fluxo de visitantes e recebe muitas pessoas vindas do exterior. O ministro disse que as peculiaridades de Brasília representam um desafio maior para as autoridades médicas e sanitárias. “O Distrito Federal tem uma característica toda ímpar, que é o fato de você ter uma concentração local e muita viagem ao exterior. É uma cidade que tem essa ida e volta de todo o país. Brasília tem que ter muita atenção por conta das suas características georreferenciais”, ressaltou.
A preocupação de Luiz Henrique Mandetta sobre Brasília tem respaldo nos dados divulgados pelo ministério da Saúde. No domingo, a pasta informou que a taxa mais elevada de incidência do novo coronavírus no Brasil está no Distrito Federal. O coeficiente do DF é de 10,2 por 100 mil habitantes, mais de quatro vezes acima da média do Brasil, de 2,2 por 100 mil habitantes. Neste ranking, o Distrito Federal está na frente do Rio de Janeiro e de São Paulo, os estados com mais casos e vítimas do Covid-19 no país.
O infectologista do Laboratório Exame, David Urbaez, explica que o coeficiente de incidência é importante na interpretação epidemiológica. “É um índice mais aproximado da realidade, de como o fenômeno atinge aquela população naquele território geográfico”, justifica. Segundo o especialista, um dos possíveis fatores para o aumento da taxa de incidência no DF é a quantidade de casos importados. Outra possibilidade que pode ter influenciado este número é uma maior eficácia na vigilância dos casos no Distrito Federal. “A capilaridade que a estrutura do SUS tem em Brasília consegue captar e notificar mais os casos do que em outros estados”, aponta o infectologista.
O ministro da Saúde também chamou a atenção para a vulnerabilidade do sistema de saúde brasiliense em caso de agravamento da pandemia. “Quando a gente for falar de movimentação urbana para as pessoas, a gente vai falar em função de quem está em risco maior e quem está em risco menor. Aqui em Brasília, os casos ainda não chegaram ao Entorno e às cidades satélites; a grande maioria está no Plano Piloto e Lago Sul. Então, muita atenção quando a gente fala em movimentar o Plano Piloto e as cidades satélites, porque o sistema de saúde de Brasília nos anos não foi devidamente estruturado para atender essa quantidade de gente que atende regularmente, que vem de todo lugar do país. (Brasília) já vem com o sistema sobrecarregado e além disso pode pegar uma onda dos casos do coronavírus e pode ter muita dificuldade para atender”, analisou Mandetta.
Alerta no centro
Ao comentar a situação de Brasília, Mandetta elogiou o trabalho do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB). “Está certo o governador de fazer o seu máximo trabalho”, disse. Ibaneis foi o primeiro governador do país a tomar atitudes mais contundentes para impedir o avanço do coronavírus. As medidas de isolamento social decretadas pelo governador incomodaram o presidente Jair Bolsonaro. Atento às recomendações do ministério da Saúde, o chefe do Executivo local comentou as considerações de Mandetta. “Correto como sempre. Atuando de forma profissional para um assunto profissional e importante como é a saúde”, disse Ibaneis ao Correio.
Um dia após o presidente Jair Bolsonaro passear por diversas cidades do DF, o Governo do Distrito Federal (GDF) decidiu ampliar as orientações para a população brasiliense respeitar o isolamento social e ficar em casa. Na praça do Buriti, em frente à sede do governo brasiliense, um telão transmitia diversos trechos com orientações do ministro Mandetta. Uma das partes veiculadas cita a crítica do ministro às manifestações populares contra o fim da quarentena. Ontem e na semana passada, eleitores do presidente Bolsonaro exibiram faixas nas quais defendiam o retorno ao trabalho, apesar de a prioridade no momento ser a vida das pessoas.
Hospital de campanha
O estádio que já recebeu jogos de futebol da Copa do Mundo, Olimpíadas, além de shows de astros da música internacional, como Beyoncé e Paul McCartney, passa a ser mais um braço do combate ao coronavírus no Distrito Federal. O Mané Garrincha vai se transformar em hospital de campanha, recebendo 200 leitos de retaguarda, conforme anunciado ontem pelo secretário de Saúde, Francisco Araújo Filho. “Serão 100 leitos ambulatoriais, sem suporte respiratório, no primeiro momento”, detalhou a Secretaria de Saúde. O gramado deve permanecer intacto, já que os equipamentos serão instalados no primeiro andar da construção, dando aos pacientes vista privilegiada das arquibancadas.
O espaço já havia sido cedido, na semana passada, pelo Arena BSB, consórcio que administra o complexo, mas, até então, só seria sido usado caso houvesse necessidade, conforme havia dito, em nota oficial ao Correio, a secretaria. Diante dos 311 casos de pacientes com Covid-19 (Veja números), o secretário fez, ontem, vistoria no estádio. Segundo ele, parte dos equipamentos estará disponível à população em até 15 dias. Com isso, a rede pública do DF soma 4,8 mil leitos de internação, e 500 de Unidade de Tratamento Intensivo (UTI).
Apenas pacientes em remissão, isto é, que tiveram alta das UTI, mas ainda não podem retornar para casa, serão atendidos ali. Por comunicado oficial, a Secretaria de Saúde informou que há, no momento, 50 leitos para pacientes com Covid-19, sendo 10 pediátricos no Hospital da Criança (HCB). “Na próxima semana serão disponibilizados mais 10 leitos em hospitais privados, já com suporte respiratório”, diz a nota. Outros 70 leitos de UTI serão colocados no Hospital Regional de Santa Maria, 30 no Instituto de Cardiologia do DF (ICDF), e 80 irão para o Centro Médico da Polícia Militar, que, a partir de 6 de abril, deixa de atender apenas servidores da corporação, e abre as portas à população.
A primeira paciente infectada, uma mulher de 52 anos, é moradora da cidade, e segue internada em isolamento na UTI do Hospital Regional da Asa Norte (Hran). Segundo o boletim médico divulgado ontem, o quadro de saúde dela continua gravíssimo, e ela respira por ventilação mecânica, em coma induzido.
Segunda morte no DF
O avanço do coronavírus no Distrito Federal fez mais uma vítima. No domingo, um idoso de 77 anos morreu, entrando nas estatísticas como o segundo óbito pela Covid-19 na capital federal. Maurílio José de Almeida estava internado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital Brasília desde 27 de março. O caso só foi notificado à Secretaria de Saúde ontem.
Conforme noticiado pelo blog C.B Poder, o paciente apresentava comorbidades como neoplasia (tumor), cardiopatia e doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC). Em nota oficial, o hospital informou que o caso havia sido notificado como suspeito ao Ministério da Saúde e à Vigilância Epidemiológica do DF. “O hospital se solidariza com a família e amigos e permanece cumprindo os protocolos estabelecidos pelos órgãos competentes”, diz o texto.
A primeira morte em decorrência de infecção pelo coronavírus aconteceu na última segunda-feira. A vítima é Viviane Rocha de Luiz, 61 anos, assessora técnica e responsável pela Câmara Técnica de Vigilância Sanitária do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass). Ela estava internada no Hospital Regional da Asa Norte (Hran). Segundo a Secretaria de Saúde, todos que fizeram contato com a mulher estão sendo monitorados.
Infectados
Confirmados: 311
Recuperados: 146
Óbitos: 2
Infecções leve: 212
Infecções graves: 18
Estado crítico: 12
Em investigação: 68
Homens: 176
Mulheres: 35
Regiões com mais casos
Plano Piloto: 91
Lago Sul: 53
Águas Claras: 32
Sudoeste: 32
Guará: 14
Lago Norte: 9
Por idade
60 anos ou mais: 40
Entre 51 e 59 anos: 47
Entre 41 e 50 anos: 73
Entre 31 e 40 anos: 99
Entre 21 e 30 anos: 41
*Colaborou Agatha Gonzaga