Em um piscar de olhos, um susto que poderia ter tirado a vida de Heitor, aos dois anos de idade. Ele estava brincando no quintal enquanto a mãe, Tainá Morais, 25, estendia a roupa no varal. Entretido, o menino começou a andar de velotrol com um pregador de roupa na boca. Sem perceber o que o filho estava fazendo, Tainá não viu quando o ferrinho que fica entre uma madeira e outra soltou. “De repente, só vi meu filho correndo, roxo e sem ar. Fizemos todas as manobras possíveis e o Heitor já estava desfalecido, não reagia, não dava sinais. No desespero, eu enfiei o dedo na garganta dele, porque estava no meio, entre a goela e garganta. Mas não consegui tirar”, relembra Tainá.
Ela chegou a ligar para o Corpo de Bombeiros, para o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e até para a polícia. “Mas não conseguimos atendimento imediato em casa. Eu não podia levá-lo para o hospital, porque estávamos segurando-o de cabeça pra baixo. Era a única posição que faria ele não morrer naquele momento”, relata. Então, ela começou a rezar junto à mãe, até que ele vomitou e o ferro saiu. “Chegou a rasgar a gargantinha dele, ele ficou uns dias com dificuldade para comer. Mas hoje está cheio de saúde”, conta.
Assim como ocorreu com Tainá, é muito comum acidentes domésticos envolvendo crianças. Uma distração é o suficiente. Nesse período de quarentena, em que todos estão dentro de casa, sem poder sair, o cuidado deve ser redobrado. O Corpo de Bombeiros alerta para algumas medidas que devem ser seguidas, a fim de evitar incidentes.
De acordo com o tenente Fábio Bohle, uma das ocorrências mais comuns é com os equipamentos ligados na tomada. “Nesse tempo tecnológico, a maioria das crianças tem acesso a tablets e celulares. O que mais acontece é acidente por descarga elétrica. A criança tira o aparelho do carregador e coloca o fio energizado na boca”, exemplifica. Uma das recomendações é os pais ou responsáveis evitarem deixar os carregadores conectados na energia e colocar uma tampa na tomada para evitar o choque.
Outra orientação é a rede de proteção nas janelas. Verificar se estão firmes e, se for possível, evitar colocar móveis que a criança possa subir e acessar a janela. “A criança não tem noção do perigo. É importante os pais estarem alertas”, ressalta Bohle. Segundo ele, os responsáveis devem restringir o acesso aos locais da casa que podem oferecer algum perigo, como a cozinha, a área de serviço e o banheiro. “A cozinha não foi feita para criança. Evite o acesso delas a esses espaços. E é sempre bom lembrar de deixar os cabos das panelas virados para a parte interna do fogão. Tirar do acesso objetos cortantes, como facas e garfos. Além dos utensílios de vidro, que podem cair e quebrar”, pontua.
Piscinas
Para as casas com piscina, é importante colocar uma rede de proteção ou algo que impeça a criança de entrar na água sem a supervisão de um adulto. A recomendação do Corpo de Bombeiros é que a criança não saia do campo de visão dos pais. Edilaine Rodrigues, 27, preparou a copa especialmente para os filhos brincarem. “Tirei a mesa, coloquei um tapete e os brinquedos deles. Assim conseguimos vigiá-los e ter mais controle do que eles estão fazendo”, conta Edilaine, que tem dois filhos, um de dois anos e outro de seis.
Ela ainda relata que já passou por alguns susto com eles. “Teve uma vez que meu filho mais velho levou um choque. Ele tinha três anos, na época. Queria colocar a luminária na tomada sozinho e levou uma descarga elétrica”, relembra. Há uns meses, ela passou por outra situação com o caçula, que tentou pegar uma garrafa que estava na beirada da mesa. “Ele se desequilibrou e caiu em cima dos cacos de vidro. Levou oito pontos na mãozinha. Agora, todas as garrafas são de plástico, aqui em casa”, comenta.
Mesmo com os cuidados redobrados dentro de casa, Kamylla Novais, 29, ainda passa por sufoco com Maria Luiza, 3, e Pedro, 11 meses. Ela segue todas as recomendações do Corpo de Bombeiros. Colocou uma portinha separando a sala da cozinha e a área de serviço, para restringir o acesso dos filhos. Todos os armários ganharam tranca, e as tomadas estão devidamente tampadas. “Eu tento prevenir ao máximo, mas mesmo assim acidentes acontecem. Na semana passada, uma cadeira caiu em cima do mais novo. Estava limpando a sala na hora, e coloquei todas as cadeiras emborcadas em cima da mesa. Os dois estavam no quarto. Fui na cozinha pegar o álcool, para passar no chão, e só vi quando os dois passaram por debaixo da mesa derrubando a cadeira em cima do Pedro. Foi um susto enorme”, conta.
Produtos químicos
Para Andrea Amoras Magalhães, médica do Centro de Informações Toxicológicas (Ciatox), um dos acidentes mais comuns é a ingestão de produtos químicos e medicamentos. “É essencial que os responsáveis deixem a caixa de medicamentos em local alto e fora do alcance de crianças”, explica. Outra questão é a automedicação, principalmente nesse momento em que as pessoas estão evitando ir aos hospitais. “Tem que ter muito cuidado. Não pode dar medicação sem orientação médica”, afirma.
Três perguntas // Andrea Amoras, médica do Centro de Informações Toxicológicas (Ciatox)
Como proceder quando a criança ingere algum produto químico?
A primeira coisa é identificar qual produto foi ingerido e a quantidade. De maneira alguma force o vômito ou dê leite ou água. Ligue imediatamente para Centro de Informações Toxicológicas nos números: 0800 644 6774 ou 0800 722 6001.
Há alguma diferença no que fazer a depender do produto?
Sim. Algumas substâncias podem piorar o quadro se provocar o vômito, como os ácidos e derivados de petróleo. Exemplo: soda cáustica, água sanitária, tiner e tinta.
Qual orientação para os pais?
Guarde os produtos de limpeza e medicamentos em locais com tranca ou em prateleiras altas a que as crianças não tenham acesso. Prevenção sempre é o melhor remédio.