No Distrito Federal, 43 mulheres são agredidas diariamente, em média. Isso significa que, a cada 34 minutos, ocorre o registro de uma violência doméstica na capital federal. Os dados, disponibilizados pela Secretaria de Segurança Pública, mostram que, de janeiro a fevereiro deste ano, houve 2.574 ocorrências no âmbito da Lei Maria da Penha. A legislação vem com o objetivo de oferecer mecanismos para coibir a agressão no âmbito familiar e impedir que essas situações evoluam para um feminicídio. No entanto, especialistas indicam que a prevenção dos assassinatos motivados pelo desprezo ao gênero feminino ainda representa um desafio, pois, majoritariamente, as vítimas não denunciam os casos às autoridades.
Ceilândia, a região administrativa mais populosa do Distrito Federal, lidera o número de ocorrências por violência doméstica. De 2018 a 2019, os casos aumentaram em 13%. Os dados levaram a Secretaria de Segurança a anunciar a criação de segunda Delegacia de Atendimento Especializado à Mulher (Deam) na cidade. Também apresentaram acréscimos no número de casos no mesmo período Planaltina (17%); Samambaia (20%); e Gama (14%). Já em Taguatinga e no Recanto das Emas, houve redução de 2% e 1%, respectivamente.
Na análise da jurista Ela Wiecko Volkmer de Castilho, ex-vice-procuradora-geral da República e professora na Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB), o crescimento dos casos também ocorre devido ao contexto social. “Esse aumento é percebido não apenas no Distrito Federal, mas no Brasil e em todo o mundo. Isso ocorre porque há um movimento misógino em escala mundial, que, infelizmente, impacta nessas violências sofridas pelas mulheres”, afirma.
Maria Carolina Ferracini, gerente de Prevenção e Eliminação da Violência contra as Mulheres da ONU Mulheres Brasil, afirma que o primeiro passo para transformar as estatísticas é enxergar como o machismo interfere nas relações amorosas. “Os homens percebem as mulheres como uma posse e se sentem no direito de tratá-las como objeto, como se o grau de proximidade da relação lhes concedesse permissão para agredir e controlar. Trata-se de uma dinâmica de desequilíbrio de poder típica das desigualdades de gênero, que autorizam e ‘justificam’ o (injustificável) uso da violência”, exemplifica.
A discriminação racial, acrescenta a especialista, tem papel na conformação da violência. “A taxa de homicídio de mulheres negras cresceu em 29,9% no país, um aumento de mais de 60% nos números absolutos de óbitos, enquanto que a taxa de homicídio de mulheres não negras aumentou 1,6%”, detalha Maria Carolina.
Novo complexo
A inauguração do espaço estava prevista para janeiro deste ano. No entanto, o projeto foi ampliado e tornou-se o segundo Complexo da Polícia Civil, que contará com a Deam e os institutos de Medicina Legal (IML), de Identificação (II) e Criminalística (IC). Com a mudança, os protocolos estipulados pelo Conselho Regional de Medicina (CRM) não foram cumpridos para a abertura no mês previsto pela corporação. A previsão é de que as atividades no local comecem ainda neste semestre, na área onde funciona a 15ª Delegacia de Polícia (Ceilândia Centro).
Para saber mais
Ações governamentais
A Secretaria de Segurança do DF informou que adota uma série de estratégias para o combate à violência contra a mulher, incluindo a capacitação dos servidores da segurança pública — Polícias Militar e Civil, Corpo de Bombeiros e agentes penitenciários —, em parceria com o Tribunal de Justiça do DF e dos Territórios (TJDFT). Do total de 1.815 profissionais capacitados, 724 eram policiais militares recém-ingressados na Polícia Militar do DF, que participaram de palestras com foco nas políticas públicas de enfrentamento à violência doméstica e familiar, e no atendimento não-revitimizador, com base na Lei Maria da Penha e temáticas correlatas. A corporação oferece ainda policiamento especializado para atendimento às mulheres por meio do programa de Prevenção Orientada à Violência Doméstica (Provid). O trabalho ajuda a prevenir, inibir e interromper o ciclo da violência doméstica, segundo a SSP. Este ano, o programa foi ampliado para 31 regiões administrativas e atendeu 587 mulheres vítimas de violência doméstica em janeiro.