Cidades

Crônica da Cidade

Abraços por e-mail

São muitos os prejuízos causados pelo coronavírus na saúde, na economia, nos esportes e na educação. Mas existe também uma outra perda, que não foi muito contabilizada: a afetiva. Com o coronavírus, os beijos, os abraços e até os apertos de mão estão interditados, pelo menos provisoriamente.

Quer dizer, além de todos os transtornos de saúde, ainda teremos de pensar duas vezes antes de manifestar a afeição fisicamente. Estava pensando na questão quando li uma linda crônica de Ana Miranda que trata precisamente do tema, e percebi que o assunto se impõe neste momento. As campanhas são muito claras: a distância regulamentar de segurança é 1 metro para evitar o contágio do coronavírus.

Matéria da editoria Mundo, do Correio, mostrou que o coronavírus tornou-se uma ameaça global porque os líderes das grandes potências não investiram em pesquisas para encontrar uma vacina quando surgiu o vírus Sars em 2002.

As pesquisas foram iniciadas sob o patrocínio da União Europeia. No entanto, as mudanças políticas no rumo do atraso bloquearam os investimentos. A cegueira dos números está nos empurrando para um mundo liderado por dementes e dominado cada vez mais por meia dúzia de bilionários, que têm mais dinheiro do que muitos países.

Antes do coronavírus, tive uma experiência de interdição afetiva. Peguei uma doença terrível chamada herpes zóster, que provoca manchas e dores cruciantes na pele. Fiquei um bom tempo de quarentena e proibi os familiares que chegassem perto de mim. Os meus netos, Judá, de 2 anos, e Aurora, de 6, sentiram muito. Cresceram dormindo ou movendo-se encarapitados em minhas costas.

Expliquei para Aurora, mas Judá ainda não compreende estas coisas, é muito afetuoso e não entendia aquele súbito afastamento físico.

Aurora gosta de segredos e, certo dia, chamou-me, pediu sigilo e soprou-me ao ouvido: “No dia 30, vou te dar um beijo”. Sussurrei de volta: “Valeu!”. Então, inspirado na fala dela, digo o mesmo às amigas, aos amigos, aos familiares e aos demais entes queridos: “Depois que essa onda de coronavírus passar, darei um abraço do lasca em vocês”.

Por enquanto, estamos em estado de guerra contra essa doença terrível e é preciso seguir mesmo os protocolos médicos. Beijos, abraços e apertos de mão, só por celular, e-mail ou zap.