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Festa desde a inauguração

Há registros de celebração do carnaval em Brasília no ano em que a cidade se tornou oficialmente capital do país. Mesmo na Cidade Livre, antes de 21 de abril de 1960, era possível ouvir o batuque típico do período





A história da folia de Brasília nos primeiros anos da cidade permanece viva na memória de pioneiros. Na década de 1960, engenheiros, operários e autoridades que viviam aqui em acampamentos formados por barracos de madeira agitaram a festa ao som das cuícas, dos surdos e dos tamborins. O primeiro carnaval da nova capital da República ocorreu oficialmente em 1961. Contudo, há relatos de que, antes mesmo da inauguração da cidade, em 21 de abril de 1960, era possível ouvir a batucada nas ruas da Cidade Livre, hoje Núcleo Bandeirante.

A celebração do primeiro carnaval de Brasília começou pelos bailes populares nos clubes do Plano Piloto, como o Iate, o Minas Brasília e a Associação Atlética do Banco do Brasil (AABB). A Rodoviária do Plano, o Teatro Nacional e o Brasília Palace Hotel também foram palcos do agito. “No início, a influência do espírito carnavalesco da capital veio do Rio de Janeiro. Era uma festa mais tímida, em que predominavam as marchinhas, que, com o tempo, começaram a ser substituídas pelo samba e o axé”, relembra o funcionário público aposentado Wellington Campos, 65 anos, conhecido como Vareta.

Wellington mora há 59 anos na capital, e no mesmo lugar: o Cruzeiro Velho. O amor pelo carnaval começou ainda na infância. “O Cruzeiro era e continua sendo o berço do samba (em Brasília). Lembro que, naquela época, as festas de carnaval começavam em um sábado à noite, apenas para os adultos. Mas, aos domingo à tarde, eram feitos os bailes para crianças, as famosas matinês”, relembra.

Atualmente, Vareta é responsável pela comissão de frente da Associação Recreativa Unidos do Cruzeiro (Aruc). Ele conta que, ainda criança, frequentava os bailes da escola de samba. “É impossível falar do carnaval de Brasília sem citar a Aruc. Fui criado dentro dela e permaneço até hoje. Aqui na escola, passei pelos cargos de tesoureiro, relações públicas e na bateria. Não há nada mais bonito do que você pesquisar, contar histórias, fazer um enredo e ver o resultado na apresentação na avenida. É gratificante”, conta.

A história da Aruc começa um ano após a inauguração de Brasília. Fundada em 1961, a escola de samba ganhou 31 dos 48 desfiles oficiais dos quais participou. Em uma sala reservada, os troféus e as fotografias da época enfeitam o espaço e reservam uma história digna de ser relembrada. Mesmo sem desfilar na capital há seis anos, os integrantes não desanimam e continuam fazendo a festa dos brasilienses. “É uma situação triste, mas sigo acreditando no melhor. As escolas têm as torcidas e nós temos a nossa. Estamos sempre em atividade, fazemos shows, feijoada e somos convidados para tocar em festas”, afirma Vareta.








Bailes

Mesmo sem ornamentação nas ruas, mas com muita animação nos salões, os bailes carnavalescos agitavam a cidade, e o reinado do Momo sempre foi respeitado. As festas promovidas nos clubes, na Rodoviária do Plano Piloto, no Teatro Nacional e no Brasília Palace Hotel atraíam inúmeros brasilienses, que faziam questão de vestir luxuosas fantasias.

Nelson Campos, 72, é diretor social do Iate Clube. Com carinho, ele relembra os festejos promovidos por lá. “No Iate, os bailes começaram no galpão de barcos da Náutica. Lembro que a primeira atração era a matinê das crianças e, quando chegava a noite, era a vez dos adultos, que se divertiam ao som das bandas musicais do Rio de Janeiro”, conta. “Eram feitas muitas premiações para os foliões mais animados da noite. O baile era tão alegre que ia até de manhã cedo. O clube servia um café da manhã no dia seguinte”, completa.

O produtor cultural Eduardo Monteiro, 60, chegou a Brasília no auge do carnaval na cidade, em 1965. À época, o principal evento momesco da capital levou 2 mil pessoas a lotarem os salões do Hotel Nacional. A grande atração, no entanto, era o concurso de fantasias, que trouxe 33 concorrentes do Rio de Janeiro, de São Paulo, de Belo Horizonte e de Recife, além dos participantes locais.

“Meu pai era presidente do Clube dos Funcionários na época, hoje o Clube da Polícia Militar, e lá era possível ver a fervença das pessoas nas festas. O engraçado era que, ainda no período de Natal, já podíamos escutar os discos das escolas de samba tocando nas residências. Então, ao passar pelas ruas, cada família escutava um samba diferente. Era algo bom, contagiante e alegre”, recorda Eduardo.