Cidades

Crônica da Cidade

Barbárie e educação

Mesmo sem ser ligado em carnaval, saudei com simpatia a invasão de inúmeros bloquinhos em Brasília, que transformaram as avenidas em sambódromos. Na verdade, a maioria deles é extensão de grupos que estão revitalizando a cidade com projetos, coletivos e festas, durante todo o ano. Eles ensaiam e insinuam uma tradição brasiliense.
Na sexta-feira, à noite, fui assistir a uma peça de teatro na 508 Sul e pedi um táxi na volta para a casa. Sempre gosto de puxar conversa com os motoristas de táxi, porque se movimentam, são ligados e têm muita informação sobre o que acontece na cidade.

Ele me disse que havia passado em frente à concentração no Museu da República e assistiu a cenas deprimentes. Grupos se formavam para fazer arrastões. Viu um rapaz aplicar soco em uma moça, que caiu no show enquanto ele pegava o celular e fugia. Meus filhos já passaram da idade de brincar carnaval. Mas eu fiquei pensando nas meninas e nos meninos que saem para brincar.

No outro dia, bateu o choque da notícia da morte de Matheus Barbosa Magalhães, 18 anos, assassinado a facadas durante o pré-carnaval de um bloco na área externa do Museu da República. Foi uma morte estúpida e gratuita. Ao que parece, ele não discutiu, não aceitou provocação e não se envolveu em briga. Tudo indica que o policiamento era insuficiente.

Na mesma edição de Cidades estão a cobertura da tragédia e o que poderia evitá-la. Reportagem de Isadora Martins e Millena Campello mostra que o Centro Educacional 6 de Ceilândia aprovou 69 alunos na UnB no primeiro semestre letivo de 2020.
Qual o segredo do êxito? A escola investe em apoio familiar, autoestima do aluno, afeto, trabalho de equipe do corpo docente e cultura. Não se atém apenas ao conteúdo oficial. Explora o teatro e atividades extracurriculares.

É possível imaginar que a escola teve atenção privilegiada e recursos para conquistar a qualidade de ensino e das relações humanas. Mas não ocorreu nada disso. Em 2003, ela ficou classificada como a pior escola do DF.

Em vez de afundar de vez, os professores, os alunos, as famílias e a comunidade se uniram para reverter a situação. Os alunos da periferia concorrem em condições desiguais em relação aos de classe média ou aos ricos.

Eles têm laços de pertencimento, acesso à cultura, estímulo para superar as dificuldades e apoio para estudar. É tudo o que falta à maioria das crianças e dos jovens das cidades-satélites do DF. Se tivessem, tudo talvez fosse diferente. É impensável que um jovem que estuda nessa escola cometa uma atrocidade como a perpetrada contra Matheus Magalhães. A solução é sempre educação.