Há alguns meses, quando ocupava o cargo de diretor da Funarte, Roberto Alvim ofendeu Fernanda Montenegro, chamando-a de “mentirosa” e “sórdida”. Seria uma agressão dirigida a qualquer pessoa, mas desfechada contra Fernanda foi um atestado de estupidez, porque ela é uma das brasileiras mais talentosas, elegantes (espiritualmente, inclusive), inteligentes, sensíveis e dignas desse país.
Ela paira além de qualquer questiúncula ideológica. Como escreveu Caetano Veloso, Fernanda é uma dama civilizada e civilizadora. É uma pessoa que nos engrandece. Em vez de ser demitido, Alvim foi promovido à condição de secretário especial de Cultura.
Então, Roberto Alvim considerou que estava liberado a alçar voos mais altos de estupidez. No fim de semana, publicou um vídeo institucional em que copiava, quase literalmente, um discurso de Joseph Goebbels, ministro e estrategista de comunicação do nazismo. Goebbels é autor de uma frase que o coloca como precursor das fake news na era da internet e explica muitas coisas que estão acontecendo na cena política: “Uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade”.
O texto de Alvim reza: “a arte brasileira da próxima década será heroica e será nacional, será dotada de grande capacidade de envolvimento emocional, e será igualmente imperativa, posto que profundamente vinculada às aspirações urgentes do nosso povo — ou então não será nada.”
Alvim defendeu-se afirmando se tratar apenas de “coincidência retórica”. Se houve “coincidência”, ele admite que pensa a mesma coisa que Goebbels. Se não, ele cometeu plágio.
Parte da mídia tem tratado esses fatos lamentáveis como “declarações polêmicas”. No entanto, eles nada têm de polêmicos; são simplesmente aberrações. O que Roberto Alvim fez foi propaganda aberta do nazismo e afronta os valores democráticos. É inaceitável que uma autoridade queira reproduzir a política cultural do regime nazista com o dinheiro público de um país democrático. Não importa se a tirania seja de esquerda ou de direita.
Existe uma escalada nesses ataques em razão da leniência, da complacência e da omissão das instituições responsáveis por zelar pela democracia. Elas têm falhado clamorosamente. Como diz o padre Vieira, a omissão é o pecado que se faz não se fazendo. E foi isso que abriu a porteira para o nazismo jeca, cópia grotesca do pensamento mais abominável da humanidade.
Não se trata apenas de uma declaração infeliz; o que está em jogo é uma ofensiva sistemática contra os valores democráticos. Mas, ao menos ficou uma lição do episódio sinistro: se os cidadãos, a classe política, o STF, a OAB e as instituições da sociedade civil se mobilizam em defesa da democracia, ela se fortalece.