Era 1985 e, em seis meses, a artista plástica e gravurista Lêda Watson abria as portas do Museu de Arte de Brasília (MAB), às margens do Lago Paranoá. O espaço está localizado no Setor de Hotéis e Turismo Norte, entre a Concha Acústica e o Palácio da Alvorada. Seduzida pelo Planalto Central e assumida brasiliense pela luta em favor das artes plásticas, Lêda reuniu ali um importante acervo.
Trinta e quatro anos depois, 12 deles em que o MAB está de portas fechadas, a artista volta ao local com o entusiasmo e a esperança da reabertura do museu, prometida pelo Governo do Distrito Federal. “Quando a gente é brasileira e brasiliense, qualquer coisa que alguém venha fazer em prol do nosso país e da nossa cidade, só não fica satisfeito quem é mau-caráter, e eu não sou. Existem pessoas que não ligam para o deterioramento (do MAB)”, comenta Lêda.
Ao lado do secretário de Cultura e Economia Criativa do DF, Bartolomeu Rodrigues, Lêda visitou as obras da instituição. Por recomendação do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT), o espaço ficou fechado por 10 anos e, desde 2017, está em reforma. “Criei esse museu. Foram seis meses de luta. A gente fica triste (com o fechamento), mas quando vem um gestor determinado a mudar (a situação), você fica emocionado. É um prêmio”, completa.
Apesar do atraso devido à complexidade da reforma — a entrega da obra estava prevista para o aniversário de 60 anos de Brasília — Bartolomeu afirma que os trabalhos não estão parados e não vão parar e que a reforma está sendo feita para dar condições adequadas ao museu. “Agora, vamos trabalhar na reinauguração. Para o artista, para quem faz arte em Brasília e as pessoas do mundo acadêmico, esse museu tem uma importância fundamental. Era o museu de Brasília, era a referência e, de repente, saiu de cena. A minha intenção é reunir esses (artistas) pioneiros que ainda estão vivos e dispostos a colaborar. Não vou fazer nenhuma exposição sem me reunir com eles. Quem vai desenhar inauguração desse museu será ela (Lêda), igual na inauguração. É algo deles (os pioneiros), serão os primeiros curadores dessa reinauguração”, assegurou o secretário.
Diante do pedido da gravurista para visitar o local, Bartolomeu conta que se sentiu lisonjeado e que não poderia perder a oportunidade. “A Lêda é uma referência. A vendo tão empolgada com o museu, me lembrou até uma reportagem do Correio quando o espaço estava fechado. Fiquei entusiasmado. É uma pessoa muito comunicativa e alegre”, descreve. Entre tantas histórias e experiências ali vividas, a gravurista relembra com satisfação o dia da inauguração, mas lamenta quando não pode concretizar o projeto da reserva técnica que desenvolveu.
Arte brasileira
Formado por obras de arte moderna e contemporânea, que vão da década de 1950 ao ano de 2001, o acervo do MAB é composto por 1.370 peças. Atualmente, esse acervo está descentralizado: a maioria se encontra no Museu Nacional da República, mas tem obras em outros pontos da cidade, como a própria sala do secretário e a residência oficial do governador em Águas Claras.
O custo da obra de recuperação do MAB, orçada em R$ 7,6 milhões em outubro de 2017, quando foi retomada, subiu para R$ 9 milhões, com recursos do Banco do Brasil. Depois de um longo processo para refazer questões estruturais, a construção se encaminha para ajustes de acabamento. O projeto de iluminação fotovoltaica, para captar luz solar, está pronto, bem como o de climatização do espaço; estão finalizando a ventilação da área de acervo; estão refazendo a catalogação das obras para reuni-las; a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) se prontificou a ajudar no plano museológico e, em breve, sairá a licitação da cafeteria.
Pelo planejamento, o prédio fica pronto entre o fim de junho e o início de julho e a reabertura será em setembro. “Mostraremos mostrar que o museu é recuperável e tem seu espaço dentro de uma cidade que respira arte. Vamos recuperar a ideia do museu, não como lugar que você vai ver o passado, não como puro lazer e entretenimento, mas como local para reflexão. Um ponto onde a gente pode promover o debate sem nenhum viés autoritário, onde a gente pode refletir sobre nós mesmos, sobre a nossa arte, sobre o futuro de Brasília. Qual futuro que nós queremos para Brasília? O MAB precisa ter esse papel se não faz sentido”, analisa Bartolomeu.
Mesmo com menos de um mês no cargo, o secretário demonstrou que a questão patrimonial será uma das linhas da gestão. Primeiro, Baretolomeus sinalizou negociações positivas para incluir (no projeto de recuperação) a sala Villa-Lobos do Teatro Nacional no convênio firmado com o Ministério da Justiça. Agora, está disposto a concluir a reforma do museu. “Brasília é uma cidade praticamente toda tombada. O tempo está passando, a capital tem 60 anos, mas não é mais uma criança. Nosso patrimônio está deteriorando. Se não cuidar, vai desmoronar e não podemos esperar desmoronar para fazer algo”, concluiu.
Para seguir esse caminho, Rodrigues parece ter conquistado uma aliada de peso. “Nesses 60 anos, dos quais 50 eu participei, era desilusão atrás de desilusão. A preservação de uma obra é essencial. A cultura é o que o povo faz, pensa e age desde que nasce. A cultura é a ação do povo e tem que ser preservada. Eu me orgulho de poder participar desse processo”, finaliza Lêda.
*Leia amanhã reportagem da série Brasília sexagenária sobre o Cine Brasília e o MAB