O Distrito Federal registrou quatro casos de feminicídios nesta primeira quinzena de janeiro. Este número é maior que o de todo o primeiro mês de 2019. Nesta terça-feira (14/1), três mulheres foram assassinadas em Samambaia. Pela manhã, Gabrielly Miranda, 18 anos, morreu com um tiro na cabeça, na Quadra 425. O marido dela, Leonardo Pereira, 32, foi preso. No fim da tarde, Edna Maria de Sousa, 40, foi esfaqueada na porta de casa, na Quadra 307. O principal suspeito é o ex-namorado dela, cujo nome não foi divulgado pela Polícia Civil. Um terceiro caso ocorreu no início da noite.
Leonardo e Gabrielly saíram juntos para um restaurante na QNL, em Taguatinga Norte, por volta das 22h. Ali, jantaram, tomaram dois copos de cerveja e decidiram retornar para a casa dele, onde continuaram consumindo bebidas alcoólicas. Ao amanhecer, o casal teria discutido, conforme relatou uma vizinha ao Correio.
“Eles estavam com música alta; mesmo assim, escutei a briga. Não consegui identificar o motivo, mas o relacionamento era marcado por violência constante. Diversas vezes, vi a Gabrielly ser agredida em eventos que ocorriam na praça (da região). Eles brigavam frequentemente”, informou a mulher, sob condição de anonimato.
Em decorrência das discussões recorrentes, a vizinha alegou não ter estranhado a situação, sobretudo porque não escutou o único disparo de arma de fogo que tirou a vida de Gabrielly, por volta das 5h. Leonardo entrou no carro e tentou fugir. Sem gasolina, ele abandonou o veículo na Quadra 427 e retornou para a residência a pé. Então, acionou a Polícia Militar, que o prendeu em flagrante.
Em um primeiro momento, em conversa informal com a equipe militar, Leonardo contou que estava brincando de roleta-russa com Gabrielly. Contudo, o delegado Eduardo Escanhoela, adjunto da 26ª Delegacia de Polícia (Samambaia Norte), esclareceu que o acusado não citou o termo durante depoimento.
“O suspeito relatou que a própria vítima pegou a arma de fogo e passou a manuseá-la, disparando. Depois, entregou o artefato para ele, que teria continuado a suposta brincadeira, momento em que atirou. A princípio, não acreditamos na possibilidade de o tiro ter sido acidental, como indicado nessa versão”, destacou o delegado.
O investigador acrescentou que Leonardo tem passagem de violência doméstica no âmbito da Lei Maria da Penha, contra uma companheira anterior a Gabrielly. Além disso, Leonardo respondeu por porte ilegal de arma de fogo e tráfico de drogas. Agora, ele foi autuado por feminicídio e posse ilegal de arma.
Apesar de Gabrielly não ter procurado a polícia para informar as possíveis agressões sofridas, ela confidenciou o histórico de agressões sofridas para uma amiga de infância, Larissa Marques, 20. De acordo com a jovem, o casal passou a se relacionar em meados de 2017. À época, a jovem tinha 15 anos; o homem, 28. Em poucos meses, eles passaram a viver juntos, na residência onde ocorreu o crime. “Ele batia nela quase todos os dias, mas não era apenas violência física, pois ele também a agredia com palavras e quebrava pertences dela, como o celular. Esse relacionamento sempre foi tóxico”, afirmou Larissa.
Segundo a mulher, a vítima decidiu colocar um ponto-final no relacionamento com o acusado e sair da casa, no fim de dezembro de 2019. “Ela até voltou a morar com a avó. Mas Leonardo não aceitava o término. Nos últimos dias, ele viajou para o Rio de Janeiro, mas fez contato com Gabrielly. Ele disse que, quando retornasse, iria à residência onde ela estava e, se minha amiga não saísse, ele daria tiros no portão”, acrescentou.
O delegado Eduardo Escanhoela frisou que a delegacia está apurando relataos de agressões contra a vítima. “Sabemos do histórico violento dele contra a companheira anterior e estamos investigando para comprovar se ele estava tendo o mesmo comportamento com a Gabrielly. Para isso, também precisaremos falar com os familiares. Não conversamos com eles ainda, pois estão muito abalados com o crime.”
Esfaqueada em casa
Edna Maria de Sousa, 41 anos, foi esfaqueada dentro de casa, por volta das 17h desta terça-feira (14/1). O principal suspeito do crime é o ex-namorado da vítima, com quem ela se relacionou por seis meses. Até o fechamento desta edição, ele não tinha sido encontrado para prestar esclarecimentos na 32ª DP (Samambaia Sul). O caso é investigado como feminicídio, em decorrência do protocolo da Polícia Civil do Distrito Federal, o qual determina que todo assassinato violento de mulher seja tratado como motivado por discriminação e menosprezo em decorrência do gênero feminino. A qualificadora pode ou não mudar.
Segundo a filha da vítima Keiciane Timóteo, 20, o relacionamento havia terminado há três meses. “Ela não quis mais continuar o namoro, mas nunca chegou a me relatar que era agredida. O que minha mãe falou, após o rompimento, é que ele não a deixava em paz. A todo momento, ficava atrás dela.”
O namorado de uma segunda filha da vítima, de 24 anos, sabia da rotina de violência sofrida por Edna. “Ela me contou que o ex a agredia recorrentemente. Eu a aconselhei a procurar ajuda na polícia, mas ela não queria se expor”, informou o rapaz, que preferiu não se identificar.
A família recebeu a notícia por meio de um grupo de Samambaia no Facebook, como contou Keiciane. “Quando vi, meu chão parecia ter caído. Não consigo descrever o que estou sentindo neste momento. Não consigo acreditar que minha mãe morreu assim, de uma forma tão violenta. Sequer conseguimos nos despedir, é muito sofrimento.”
Facada
Na noite desta terça-feira (14/1), um terceiro feminicídio teria ocorrido, em Samambaia Sul, no Conjunto 5 da Quadra 321. Segundo boletim de ocorrência, Ruth Paulina, 42 anos, foi esfaqueada na cozinha da casa do pai, pelo marido, de 40 anos. De acordo com o registro policial, o homem teria atingido Ruth no pescoço e fugido, em seguida.
Aos investigadores, o autor do crime afirmou ter ficado com medo de ser preso em Samambaia e ser linchado pela população. Por isso, se entregou na 15ª Delegacia de Polícia (Ceilândia).
Como os agentes da 32ª Delegacia de Polícia (Samambaia Sul) estavam em diligência tentando localizar o autor, a apresentação do homem não foi considerada espontânea, e ele foi autuado pelo crime em flagrante.
Primeiro de 2020
Larissa Francisco Maciel, 23 anos, pode ter sido a primeira vítima de feminicídio no DF neste ano. Em 6 de janeiro, a diarista foi assassinada por esganadura, sofreu um golpe na cabeça, tinha um pedaço de pano amarrado no pescoço e teve parte da roupa carbonizada. Até o fechamento desta edição, ninguém tinha sido identificado ou preso.
Janeiro de 2019
Dia 5
Vanilma dos Santos,
30 anos, no Gama
Dia 28
Diva Maria Maia da Silva,
69 anos, na Asa Norte
Dia 30
Veiguima Martins,
56 anos, na Asa Norte
Onde pedir ajuda
Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência — Presidência da República
Telefone: 180 (disque-denúncia)
Centro de Atendimento à Mulher (Ceam)
De segunda a sexta, das 8h às 18h
Locais: 102 Sul (Estação do Metrô), Ceilândia, Planaltina
Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam)
Entrequadra 204/205 Sul - Asa Sul (61) 3207-6172
Disque 100 — Ministério dos Direitos Humanos
Telefone: 100
Programa de Prevenção à Violência Doméstica (Provid)
da Polícia Militar
(61) 3910-1349 / (61) 3910-1350