Os usuários do transporte coletivo do Distrito Federal pagarão 10% a mais nas passagens de ônibus e metrô a partir de segunda-feira (13/1). O decreto que prevê o reajuste, assinado na noite de quinta-feira (9/1) pelo governador em exercício, Paco Britto (Avante), foi publicado na edição desta sexta-feira (10/1) do Diário Oficial do DF. A princípio, o aumento seria de R$ 0,50 para todas as linhas, conforme informou o secretário de Transporte e Mobilidade, Valter Casimiro, em entrevista coletiva na tarde de quinta. Contudo, Paco Britto entendeu que a porcentagem deveria ser a mesma para todas as linhas.
Em viagem internacional, o governador Ibaneis Rocha (MDB) afirmou ao Correio, por telefone, que, “pelos estudos realizados e levando em conta o reajuste da tarifa técnica, esse reajuste se mostra necessário para melhorar as contas e manter o sistema em pleno funcionamento”.
No total, todas as 826 linhas de ônibus, incluindo circulares internas (141), curtas (273) e longas/integração (412), passarão pelo reajuste de preço. De acordo com a avaliação de Paco Britto, desde o início do atual mandato, o governo conseguiu “fazer bastante pela mobilidade”, porém, a medida é precisa. Ele ressalta que qualquer alteração deve ter benefícios por meio das empresas de ônibus. “Nós pagamos quase R$ 1 bilhão por ano. Então, tem que ser revestido e cobrado das empresas”, afirmou.
Segundo o secretário Valter Casimiro, o aumento visa diminuir o desequilíbrio entre a tarifa-usuário e a relação do custo do sistema. “O cálculo do aumento, previsto no contrato, foi de 16,19%. O governo optou por não dar esse reajuste total para evitar maior impacto aos passageiros”, detalhou.
A novidade desagradou usuários do transporte público, principalmente aqueles o utilizam diariamente. Os universitários Lohany Kayná e Vinícius Pereira, ambos de 21 anos, reclamaram da medida. “Definitivamente, não tem ônibus de qualidade para toda a população. Querer aumentar é um descaso com o brasiliense”, opinou a estudante de pedagogia, que se desloca do Cruzeiro para a área central do Plano Piloto para o estágio e também para o câmpus da Asa Norte da Universidade de Brasília (UnB).
“Com mudanças nas férias escolares, a gente tem de se readaptar, ainda mais para se adequar aos horários do transporte. O custo-benefício não vale a pena”, completou Vinícius, que pega sete ônibus por dia para ir do Gama, onde mora, à UnB e ao estágio, na Esplanada dos Ministérios. “Mesmo com o passe estudantil, eu preciso pagar uma passagem todos os dias. Se pensar em quem está desempregado, é ainda mais difícil. A pessoa fica sem mobilidade”, destacou.
A promotora de vendas Joana dos Santos, 27, embarca em diferentes linhas de ônibus diariamente para sair do Recanto das Emas em direção a lojas de cosméticos na Rodoviária de Brasília, no Guará e em Taguatinga. Ela conta que, no trabalho, o valor do transporte é dividido, sendo uma parte dela e outra para os empresários. Segundo Joana, em casos de acréscimos no valor das passagens, os funcionários saem no prejuízo. “É cobrada uma porcentagem. Se o valor subir, a nossa parte na contribuição aumenta. Consequentemente, o desconto do salário será maior. A passagem é cara e não vai de acordo com o serviço que recebemos. Nunca consigo ir sentada em um ônibus e, em paradas, espero bastante tempo”, disse.
Francineide Magalhães, 43, foi mais uma das usuárias do transporte público a questionar o aumento de preço. Moradora do Vale do Amanhecer, em Planaltina, a diarista vai diariamente ao Lago Norte. “Quem pega quatro ônibus como fica? A linha que eu embarco para vir ao Plano Piloto não aceita o cartão integração. Por pagar todas as passagens, eu gasto R$ 20 por dia. O meu patrão me dá R$ 200. Se aumentar, vai pesar no bolso. Não vale pagar por isso. Sempre tem superlotação no transporte”, questiona.
Dívida
De acordo com o secretário de Transporte e Mobilidade, Valter Casimiro, a dívida do GDF com as empresas de ônibus chega a R$ 247 milhões, o que também teria motivado o reajuste das passagens. “Em 31 de dezembro de 2018, nosso débito era de R$ 257 milhões. Conseguimos diminuir R$ 10 milhões em um ano. Ainda é pouco, mas temos que considerar que o aumento reduz a necessidade de subsídio em R$ 161 milhões. Sem o aumento, teríamos que conseguir mais orçamento”, detalhou.Segundo a pasta, somente em 2019 o subsídio chegou a mais de R$ 700 milhões — dinheiro pago às empresas. Os valores incluem, além da tarifa técnica, a gratuidade (pessoas com deficiência e estudantes). No caso, com o modelo proposto, os financiamentos cairiam para R$ 540.294.421,45, uma economia de R$ 161 milhões ao ano. “Infelizmente, o reajuste é colocado no contrato para ser utilizada toda a parte de acréscimo de preços, de pneu a combustível. Isso é contratual e precisa ser incorporado”, ressaltou Casimiro.
Perguntado sobre o impacto que os reajustes poderiam causar no passe livre estudantil, o secretário esclareceu que “não há previsão para rever a gratuidade” e afirmou que pretende implementar melhorias no sistema de transporte público, como a substituição de frotas e a compra de 80 ônibus.
*Estagiária sob supervisão de Marina Mercante
Memória
Aumentos anterioresO último reajuste nas passagens de ônibus em Brasília ocorreu em 2017, no governo de Rodrigo Rollemberg (PSB). As tarifas nas linhas internas subiram de R$ 2,25 para R$ 2,50; nas de ligação curta, de R$ 3 para R$ 3,50; e de R$ 4 para R$ 5 nas viagens de longa distância, integração e metrô. O aumento foi proposto pelo GDF no último dia útil de 2016 e pegou os brasilienses de surpresa. À época, ocorreram manifestações contrárias à decisão em diversas regiões da capital federal.
Após os protestos, deputados distritais barraram a mudança com um decreto. O Executivo alegou que, sem os aumentos, só teria recursos para manter o sistema de transporte até maio daquele ano e, com autorização do Conselho Especial do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), conseguiu restabelecer o reajuste.
Esse foi o segundo reajuste do governo de Rollemberg. O primeiro, em 2015, implicou aumento médio de 40% nas tarifas. A alta, segundo o governo, foi uma forma de amenizar os impactos da crise orçamentária. Antes dessa, a última alteração havia ocorrido nove anos antes, em janeiro de 2006, no governo de Joaquim Roriz.
Povo fala
O que você achou do reajuste nas passagens?Patricia de Santana, 40 anos, empregada doméstica
“É uma surpresa, e eu não concordo. Acho muito injusto. Qualquer centavo que aumenta faz diferença para a gente. Se o salário aumentasse junto, seria bom. Mas não é assim”.
Eniuza Gomes, 57 anos, microempreendedora
“A passagem já é cara. O que tem que aumentar é a qualidade do ônibus. Passo horas esperando um ônibus para ir para o Guará 1 e sempre preciso andar com dinheiro trocado, porque os cobradores nunca têm. Os motoristas, no geral, são muito mal-educados também”.
Tatiana Lopes, 32 anos, vendedora de roupas
“Se a passagem aumentar mesmo, eu penso em tirar carteira e comprar uma moto pequena. Ter o próprio carro como meio de transporte tornou-se uma necessidade aqui em Brasília. É muito difícil, e eu não acho justo, não tem nem ônibus direito”.
Hitiel Machado, 25 anos, técnico em informática
“Pego quatro ônibus todos os dias, saindo de Sobradinho para o Setor de Indústrias Gráficas. Acho que, pela qualidade do transporte hoje, o aumento não é válido. Sempre são questões com trânsito, ônibus lotados e horários que não batem”.
Yasmim Almeida, 16 anos, estudante e menor aprendiz
“Não concordo com aumentar o preço. Isso faz gastar mais, e a gente já não recebe muito. O transporte está sempre lotado e demora, por haver poucos ônibus”.
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