Jornal Correio Braziliense

Cidades

'Política de cotas não privilegia ninguém'

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O ouvidor do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), Libânio Rodrigues, defendeu a política de cotas raciais nas universidades em entrevista ao programa CB.Poder, parceria do Correio com a TV Brasília. O promotor de Justiça considera esse sistema importante para uma sociedade justa e igualitária não só nas instituições de ensino superior, mas também no mercado de trabalho. Ele ainda destacou a paridade racial dentro das universidades públicas e federais, nas quais mais de 50% dos estudantes são negros ou pardos. Para ele, o impacto disso será refletido daqui a aproximadamente 10 anos.

Como está a situação dos negros no Brasil atualmente?
A situação do negro no Brasil passa por essa questão cruel, que se chama racismo. Desde agressão verbal até o racismo institucional, que impede a mobilidade das pessoas por conta da sua cor.

Existe muito racismo no DF em relação a outras unidades da Federação?
O que acontece no Distrito Federal é uma capacidade de reagir mais a isso. Então, a judicialização dessas situações ocorre porque as pessoas procuram o órgão que está preparado para isso. É muito difícil eu quantificar. É importante saber se essas demandas chegam ao judiciário em outras unidades da Federação.

A cota é realmente fundamental para dar mais oportunidade?
A política da cota é uma parte do que se chama de política de práticas afirmativas. As cotas estão sendo discutidas há mais de 20 anos, agora que a gente conseguiu um reflexo de paridade dentro das universidades. Há um preconceito, uma falta de compreensão sobre o que é a política de cotas. Política de cotas não privilegia ninguém, ela simplesmente cria um nicho falando: ;dessas tantas vagas, x serão para pessoas negras;. Você continua tendo que atingir um nível mínimo para ser aprovado nos cursos de qualidade. Ninguém consegue fazer medicina na Universidade de Brasília (UnB) se não estiver preparado.

Já é possível ver uma melhoria no mercado de trabalho?
Hoje a gente está vendo aí as estatísticas, o Censo (Demográfico, feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE) demostrou que um pouco mais de 50% dos estudantes nas universidades públicas e federais são negros ou pardos, e isso só vai refletir na nossa sociedade daqui a uma década. Quando essas pessoas estiverem no mercado de trabalho advogando, fazendo concursos públicos, sendo médicos, engenheiros, coisa que a gente não enxerga (agora) na sociedade.

Mas não existe um preconceito ali entre os alunos?
Cota não vai acabar com o racismo. Eu tenho essa concepção de que nós, negros, vamos ser sempre objeto de racismo, sempre vamos ser prejudicados pela cor da nossa pele. Mas não é o outro que vai decidir isso. Eu prefiro passar por isso dentro da universidade. Porque na universidade vou ter instrumentos para me defender, criar ideias que vão resistir a isso.

Chegam reclamações de racismo no MPDFT?
O Ministério Público tem um trabalho aqui no Distrito Federal muito importante de repressão ao racismo. Nós temos um mecanismo, que é o Núcleo de Enfrentamento à Discriminação, que, por muito tempo, foi o canalizador dessas demandas e, inclusive, promovia as ações penais. Atualmente, a ouvidoria recebe essas denúncias quando elas já não são mais inquéritos policiais e as encaminha para as promotorias criminais, que têm atribuições para atuar nessa área.