Jornal Correio Braziliense

Cidades

Esmorecer jamais

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Como tantos adolescentes, Gabriel Henrique Costa Amaral, 15 anos, quer ser youtuber. Fã do influenciador digital Felipe Neto, ele sonha em brilhar nas redes sociais, assim como o ídolo. Mas, para isso, a saúde dele precisa estar estabilizada. Gabriel tem paralisia cerebral do tipo tetraplegia. O maior desafio é a espasticidade ; uma alteração no tônus muscular que faz com que a pessoa contraia músculos e não consiga relaxá-los.

Mesmo assim, as limitações físicas não impedem que ele se divirta com celulares e tablets, vendo vídeos e jogando. Graças a um aparelho especial, ele usa o pé direito ; único que consegue controlar completamente ; para navegar nas redes. ;Gabriel tem muitos planos. Quer voltar ao Rio de Janeiro, onde nasceu. Mas falou que pretende morar fora do Brasil. Viajar, conhecer a Disney;, detalha a mãe dele, Luciana Costa Amaral, 42.

O adolescente nasceu prematuro, aos 7 meses, e teve icterícia, doença que provoca aumento da bilirrubina e pode causar paralisia. Com o início do tratamento, devido aos altos custos, eles se mudaram para Unaí (MG), município de origem da família. Hoje, a fonte de renda deles vem de uma lanchonete que o pai de Gabriel, Gilvan Amaral, 53, abriu na porta de casa.

No último ano, o quadro do menino se agravou. Com dificuldade de se sentar na cadeira adaptada, Gabriel passou a comer pouco e teve uma infecção de garganta, que resultou em uma internação no Hospital Materno Infantil de Brasília (Hmib). Os médicos que o avaliaram viram que seria necessário o uso de uma sonda para alimentação. Após 32 dias, Gabriel recebeu alta, mas os planos que tinha, para quando chegasse em casa, precisaram ser adiados, porque, dois dias depois, precisou voltar ao hospital.

Com nova infecção de garganta e quadro de diarreia, ele ficou internado. Pai e mãe fazem a vigília atenta 24 horas por dia, massageando pernas e braços do adolescente, na tentativa de aliviar as dores. ;Não sei de onde vem a força;, revela Luciana. ;O dia a dia vai nos deixando fortes. Não tem para onde fugir. Ele depende só de mim e do pai. Somos nós que corremos atrás da saúde, sonhos e alegrias dele. Tem de ter muita perseverança;, completa Luciana.

Autocuidado

O tratamento de doenças complexas provoca diferentes reações nos pacientes, a depender da idade. Segundo o médico Henrique Gomes, chefe da pediatria do Hmib, crianças menores, de até 2 anos, por exemplo, costumam ser mais tranquilas. Nas mais velhas, no entanto, é comum haver a incompreensão da doença, que as faz questionar as razões de não poderem ir embora do hospital. Entre os pais, a principal angústia é a demora ou a falta de um diagnóstico.

Diante disso, Henrique reforça a necessidade de acompanhamento psicológico. ;Quando a doença é nossa, a gente encara de uma maneira totalmente diferente de quando é com o filho. O estresse de um câncer em uma criança é muito maior do que em um adulto, e isso vale para toda a família;, destaca o pediatra. Outro problema é quando os pais não têm condições para contratar serviços de cuidado em domicílio. Entre as consequências, há o abandono. ;Há muitos casos em que os pais deixam os filhos no hospital e não voltam mais. As equipes de saúde acabam adotando aquela criança. Acontece com certa frequência, não é tão incomum;, lamenta o médico.

Especialista em psicologia hospitalar, Marla Ascenso explica que o primeiro passo da família deve ser entender, da forma mais adequada possível, do que se trata a doença. Em seguida, vêm a criação de uma rede de apoio e o trabalho da autonomia do paciente. ;Há pais, mães e responsáveis que tomam muito a doença para si e não têm com quem a dividir. Conversem, cuidem-se;, recomenda. ;Para o psicólogo, eles também são pacientes. Muitos cuidam muito da criança e não tem um bom autocuidado; vão ficando frágeis, adoecidos física e emocionalmente. Mas, para cuidar da criança, é preciso se cuidar no básico;, completa. (MM e JE)