Com mais de 50 mil casos suspeitos de dengue e com a volta das chuvas, o Governo do Distrito Federal começou a traçar estratégias para evitar nova epidemia da doença. O ano ainda não acabou, mas dados da Secretaria de Saúde revelam o pior cenário desde 2007, quando teve início a série histórica de registros da pasta. Entre janeiro e setembro de 2019, segundo o levantamento mais recente, o total de registros prováveis ultrapassou 44 mil, e 47 brasilienses morreram.
Em relação aos primeiros nove meses do ano passado, a quantidade de casos prováveis subiu 2.435%. Ao mesmo tempo, o número de mortes saltou de um para 47 (leia Monitoramento). Cátia Teixeira dos Santos, 45 anos, foi uma das vítimas. Em 30 de maio, a técnica em radiologia do Hospital Regional de Planaltina (HRP) deu entrada na unidade de saúde ; mesmo local onde trabalhava, mas morreu no dia seguinte. ;Ela começou a sentir os sintomas e fez os exames lá no HRP, em uma terça-feira. A médica avaliaria (os resultados) só na sexta, dia do próximo plantão. Mas, de tanta dor, ela (Cátia) não aguentou esperar e foi mais cedo para o hospital. Chegou à tarde e pediu para ser internada;, conta Magno Teixeira dos Santos, irmão da paciente.
Aos 92 anos, a moradora do Jardim Botânico Cydélia Hermes Rodrigues foi a única da casa onde mora com quatro familiares a contrair o vírus da dengue. Além disso, teve a forma mais grave da doença: a hemorrágica. No fim de agosto, Cydélia ficou cinco dias internada, sendo dois deles na unidade de terapia intensiva (UTI). ;(Tenho) 92 anos, e a dengue me escolheu. Tive muita febre e dor da cabeça aos pés. Não tinha uma parte do corpo que não me doesse. Perdi muito peso e fiquei acabada, mas resisti e estou aqui para contar essa história;, relata Cydélia, que ainda combateu uma pneumonia no período.
Com a residência recentemente vistoriada pela Vigilância Ambiental, Cydélia diz que não sabe onde pegou a doença, mas suspeita que tenha sido no imóvel. ;Só saio para (ir ao) médico, ao banco e para eventos de família. Mas acho que foi aqui mesmo, apesar de a moça (vigilante ambiental) ter vindo aqui hoje para examinar a casa e dizer que está tudo perfeito, sem acúmulo de água nem nada;, ressalta.
Prevenção
Com a chegada da chuva, o número de criadouros para as fêmeas do mosquito transmissor da doença, o Aedes aegypti, tende a aumentar. Para evitar que os ovos desses insetos deem origem a novos transmissores, o Governo do Distrito Federal intensificará as ações de combate. A Vigilância Ambiental promoverá ações de rotina, com manejo ambiental ; coleta de objetos sem utilidade nas residências e recolhimento de possíveis criadouros do mosquito em área pública ;, além de aplicação do fumacê.
O Executivo local ainda recorrerá a campanhas de educação ambiental e mobilizações em feiras, escolas, shoppings e unidades de saúde. Ao todo, segundo a Saúde, há 547 agentes de vigilância ambiental e cerca de 400 bombeiros envolvidos no trabalho. As iniciativas contam com o apoio de órgãos como Secretaria de Proteção da Ordem Urbanística (DF Legal), Serviço de Limpeza Urbana (SLU), Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap), Departamento de Trânsito (Detran), Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), Defesa Civil e Secretaria de Educação.
No entanto, quem teve a doença sabe que todo cuidado é pouco. Moradora de Sobradinho 2, a estudante de psicologia Yasmin Cavalcante, 23, contraiu o vírus em meados de junho e, hoje, tem medo de passar por um ciclo ainda mais grave. ;Aqui perto de casa deve ter foco, porque, às vezes, a rua fica muito suja e cheia de entulho. Daqui a pouco, começa a chover muito, e eu fico preocupada. A gente tem a cultura de esquecer as coisas rápido. A preocupação só vem quando acontece mesmo. Tenho medo de pegar a doença de novo e ter algo mais forte;, ressalta.
Criadouros
Locais propícios para o surgimento dos mosquitos, lotes vazios e imóveis abandonados são pontos estratégicos das ações da Secretaria de Saúde no combate à dengue. Em nota, a pasta informou que atuará com a Justiça para acessar esses pontos e evitar novos focos. ;A utilização desse instrumento deve ser feita com base em critérios técnicos, sempre preservando a integridade da propriedade privada;, acrescentou, em nota.
Em relação a pátios de instituições, como Detran, polícias Civil e Rodoviária Federal ; onde carcaças de carros e entulho podem servir de criadouro para o transmissor da dengue ;, a secretaria comunicou que ;são executadas ações de borrifação com a equipe perifocal, que utiliza pó molhável com poder residual de 90 dias, para prevenir a proliferação dos mosquitos;.
O médico infectologista Alexandre Cunha alerta que a dengue é uma doença de comportamento sazonal, com registro anual: ;Temos o gráfico de incidência ao longo de vários anos e, nos meses mais chuvosos, temos um aumento dos casos por causa da proliferação do mosquito e agente transmissor;. Ele reforça que o período de registro de mais casos costuma ser em abril e maio, com declínio até outubro. ;Mas, de novembro (de 2019) a abril do próximo ano, devemos ter um aumento no número de casos;, acredita.
Colaborou Rayssa Brito (estagiária sob
supervisão de Guilherme Goulart)