Thais Umbelino*, Mariana Machado, Rayssa Brito*
postado em 26/10/2019 07:00
[FOTO1]A Polícia Civil confirma que a morte de Noélia Rodrigues de Oliveira, 38 anos, será classificada como o 27; feminicídio do ano no Distrito Federal. A vendedora foi assassinada na noite de 17 de outubro com um tiro no rosto. O principal suspeito está preso, mas não confessou o crime. Almir Evaristo Ribeiro era vizinho da vítima e a suposição da polícia é de que ele e Noélia tinham um relacionamento extraconjugal havia quatro meses.
Registros telefônicos do celular da vítima mostram que ela e o agressor mantinham contato. As ligações entre eles duravam cerca de uma hora. Noélia foi vista com vida pela última vez por volta das 22h, ao sair de um shopping na Asa Norte, onde trabalhava havia dois anos, em direção ao Eixo Monumental. Câmeras de segurança da área registraram o momento em que dois carros se aproximam, ao que ela, aparentemente, esconde-se atrás de uma moita. Almir estaria em um dos veículos.
A delegada Adriana Romana, chefe da 38; Delegacia de Polícia (Vicente Pires), que investiga o caso, afirma que ainda não é possível dimensionar a intensidade da relação entre Noélia e o vizinho. Bolsa e celular da vítima estão desaparecidos desde 18 de outubro, quando o corpo dela foi encontrado no Assentamento 26 de Setembro, na região de Taguatinga.
A hipótese de luta corporal foi descartada, uma vez que não havia sinais compatíveis no laudo cadavérico. De acordo com a delegada, é possível que o caso com o vizinho estivesse se iniciando, e que ela talvez passasse por um período de vulnerabilidade em que Almir levantava a autoestima dela. ;Isso não significa que ela tenha sido leviana com o marido. Quem vai poder trazer essa informação agora para o inquérito é ele (Almir);, complementa.
Antes de concluir o inquérito, a Polícia Civil irá avaliar as provas da perícia e dos Institutos de Criminalística e Identificação, além de outros depoimentos para ajudar a desenhar o relacionamento entre os vizinhos. Além disso, os investigadores tentam resgatar as mensagens apagadas do celular de Almir.
Confiança
;Ela dizia que se tem uma coisa sem perdão, é traição;, afirma o segurança Marcos Paulo, 42 anos, viúvo de Noélia. Com mais de 11 anos de casamento, ele descarta a hipótese de que a vendedora tinha um caso com o vizinho. ;De fato, tinham as ligações, mas não há nada que prove essa relação. Tenho confiança de que ela não era uma pessoa assim, não fazia esse tipo de coisa;, ressalta.
Ao longo da década que passaram juntos, o marido garante que nunca houve suspeita de traição. ;Ela era bem criteriosa nesse ponto. A gente acredita que ela tenha pegado uma carona inocentemente. Vi as imagens (das câmeras) e ela não deixa nenhuma impressão de que fazia algo errado;, relata Marcos Paulo. ;Era sincera, uma pessoa que passava confiança.;
Ele lembra ainda que parte da rotina do casal era ela sempre informar a hora que saía do trabalho, quando entrava no ônibus e quando se aproximava de casa, por motivos de segurança. O gesto se repetiu no dia do desaparecimento. ;Eu continuo em choque. Ela era uma pessoa especial. A gente tinha nossos problemas, todo casal briga, mas a gente sempre resolvia.;
Noélia deixou três filhos: um menino de 16 anos, fruto do primeiro casamento, uma menina de 9 anos e um de 6, da união com Marcos Paulo. Segundo ele, a garota é quem mais tem sentido a falta da mãe. ;Ela fala que está com saudade, mas estamos trabalhando para que ela não fique com nenhum trauma pela situação. Estamos providenciando psicólogos e a escola está acompanhando com professores e assistentes pedagógicos;, detalha. ;Noélia era uma super mãe. Ela jamais faria qualquer coisa para deixar os filhos envergonhados.;
Eventos buscam soluções
Nenhuma a menos! Esse é o pedido urgente do conjunto de mulheres que mobilizam movimentos sociais no Distrito Federal na luta contra o feminicídio. A necessidade de chamar atenção para o assunto e cobrar providências eficazes do Estado é o que une iniciativas que acontecem na capital até o fim deste mês. A proposta de fortalecer o debate sobre as mulheres, instigou Cleudes Pessoa, 46 anos. Com ajuda de outras representantes, a assistente social marcou uma assembleia para discutir os caminhos de combate à violência doméstica e o assassinato em razão do gênero.
A Assembleia Popular das Mulheres contra o Feminicídio acontece neste sábado (26/10), às 15h, no Museu Nacional. A expectativa é de que as participantes cheguem a soluções para as inseguranças e necessidades das mulheres. ;É também um pedido de justiça para que casos sejam investigados e que existam medidas eficazes para enfrentar e acabar com o feminicídio;, explica Cleudes.
A também organizadora Fernanda Granja explica que a negligência e o sucateamento das políticas públicas de atenção à mulher, a desobediência do protocolo de segurança e a falta de investimento em medidas protetivas, além da cultura machista enraizada são alguns dos problemas que levam ao feminicídio. ;Queremos seguir nossos sonhos e caminhos sem violência, com segurança, sem apropriação dos nossos corpos, sem submissão, sem dominação. O nosso futuro? Construiremos. Luto é verbo.;
Em prol da segurança feminina, a Administração Regional do Recanto das Emas organiza uma caminhada contra o feminicídio. O ato está marcado para este sábado (26/10), às 8h. Os organizadores se reúnem em frente à Caixa Econômica Federal, próximo ao balão de acesso à cidade. O evento ;Recanto caminha pela paz; também alerta sobre a saúde feminina durante o Outubro Rosa. A passeata se estenderá pela avenida principal e tem como ponto final a sede da Administração.
Na próxima semana, de 28 a 31 de outubro, a Faculdade de Artes Dulcina de Moraes, em conjunto com a Fundação Brasileira de Teatro, promove o evento Conexão Femme. O espaço vai receber especialistas que abordarão temas femininos contemporâneos, além de refletir sobre Lei Maria da Penha. O evento gratuito será na sala 306 da faculdade. Os participantes receberão um certificado de participação eletrônico.
;Precisamos discutir esse tema tão urgente e atual por toda comunidade acadêmica e social, visto que a violência é o que mais afeta a sociedade brasileira, sobretudo as mulheres, diante do aumento significativo nos casos de feminicídio;, explica a organizadora Régia Diniz. O objetivo do projeto é mostrar que a violência precisa ser vista como toda forma de violação que causa dor física ou emocional. ;É preciso romper o ciclo de violência;, afirma Régia.