Jornal Correio Braziliense

Cidades

Crônica da Cidade

Parabéns

Não sou de comemorar aniversários. Tenho problemas com dias e calendários e chorei em muitas das minhas festas quando era criança. Lembro que, uma vez, me esqueci até do meu aniversário e perguntei desconcertado por que um amigo me dava parabéns logo cedo. Certas datas, no entanto, trazem memórias que importam, e a gente entende com o tempo que algumas coisas precisam mesmo ser lembradas e, por que não?, celebradas. Aniversários têm, portanto, um lado muito útil.

É o caso de hoje. Pensar neste 4 de outubro me trouxe alento. A distopia em que vivemos é cansativa e cruel. Às vezes, por sobrevivência, é preciso se fixar em memórias boas, nos lugares de conforto. O aniversário de Frutal me trouxe isso. É uma sensação meio caipira, não nego, sentir saudades da cidade natal por causa de uma data, mas me faz bem.

Narcisista que sou, penso em Frutal, mas falo, na verdade, da minha história. Saí de lá há 9 anos, com um monte de esperanças malucas e outro tanto de medos sem cabimento na cabeça para superar. Deixar o interior de Minas e chegar à capital federal, convenhamos, dá uns sustos. O número de alunos da UnB era mais do que a metade da população da minha cidade toda e confesso que me senti pequeno demais no meio de tanta gente.

Fiz grandes amigos em Brasília naquela época, mas era impossível não pensar nos churrascos na casa dos meus pais, nas pessoas fofocando sentadas em cadeiras de fio nas calçadas, nas pamonhas, no queijo Minas, na praça cheia de gente depois das missas. Aprendi, aqui, a amar coisas que detestava lá, e isso foi bonito. Senti saudades, não nego, dos karaokês desafinados no DVD lá de casa, mesmo que o povo insistisse nas músicas do Amado Batista ; que continuo a detestar, deixe-se claro ; e eu, adolescente, assistisse a tudo com ar de enfado e arrogância. Tive saudade também de comer abacaxi até minha gastrite gritar. Doeu.

Brasília sempre me pareceu linda, mas também muito estranha. Talvez porque troquei as ruas vazias às 10 da noite pela correria louca da W3 Norte. Do meu quarto em Minas, via as bicicletas passando, e olhe lá. Do meu quarto em Brasília, observava as prostitutas passeando pela avenida, ouvia as brigas e as risadas delas, ouvia aquele ruído infinito de carros. Tudo muito novo e impensável para o cotidiano de poucos meses atrás.

Aos poucos, fui me acostumando. Hoje, entendo que Frutal me deu um norte que, pensando bem, sempre apontou para cá. O coloninho do interior precisava do choque da cidade grande, da solidão das avenidas aos domingos, das ruas sem nome, da bagunça muito bem planejada deste quadrado. Quase dez anos depois, penso em tudo, nas angústias e também nas pequenas conquistas, como escrever aqui.

Neste 4 de outubro, agradeço a Frutal (parabéns, minha centenária senhora) e agradeço a Brasília (esta jovem a quem resolvi me entregar). Diante de tudo, só tenho a certeza de que continuo sendo aquele menino do interior com um monte de esperanças malucas na cabeça e outro tanto de medos sem cabimento para superar. Mas, hoje, graças a Brasília e a Frutal, sou aquele moleque numa versão um pouco, ao menos, melhor.