Laudos médicos indicam que o ex-professor de educação física Paulo Cesar Timponi, 61 anos, acusado de provocar uma batida na Ponte JK que matou três mulheres em 6 de outubro de 2007, está com Alzheimer. Segundo os exames do Instituto de Medicina Legal (IML), a doença teve início em 2014, sete anos após o acidente, e atualmente se encontra em estágio grave e irreversível. Cabe ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) dar prosseguimento ou não ao julgamento que se arrasta há quase doze anos.
À época, Timponi dirigia um Golf e teria batido na traseira do carro em que estavam Antônia Maria de Vasconcelos, Altair Barreto de Paiva e Cíntia dos Santos Sisneiros, além do motorista e marido de Antônia, Luiz Cláudio Vasconcelos. Com o impacto, as três mulheres foram arremessadas para fora do veículo e morreram na hora. Timponi fugiu sem prestar socorro.
Ele responde por homicídio doloso qualificado, mas o processo está suspenso desde outubro do ano passado devido à alegação de insanidade mental. O pedido foi protocolado pela defesa do réu depois que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu levar o caso a júri popular.
Quase um ano depois, o laudo concluiu que Timponi apresenta "um distúrbio neuropsiquiátrico grave e persistente, em que houve alteração completa de sua personalidade, comprometendo juízo de valor e de realidade, sua capacidade de entendimento e de autodeterminação". O documento também comprova que, à época dos fatos, "não havia qualquer indício de que se encontrasse alterada a sua capacidade de entendimento sobre o caráter ilícito do fato a ele atribuído e sua capacidade de determinar-se de acordo com esse entendimento."
A acusação protocolou uma petição alegando que os resultados não invalidam a necessidade do réu ir a julgamento. "Uma eventual doença mental posterior ao delito não pode impedir o julgamento e a condenação de um criminoso, já que a legislação brasileira prevê que se o indivíduo não puder cumprir pena, deverá ser internado em hospital psiquiátrico", afirma o advogado contratado pelas famílias das vítimas, Thiago Machado.
"O que não se pode tolerar é que o autor de três gravíssimos homicídios qualificados fique impunemente solto pelas ruas da capital federal sob a alegação de que estaria em tratamento domiciliar", acrescenta Thiago.
Já a defesa de Timponi sustenta que o processo deve continuar suspenso até que o réu tenha plena capacidade de autodefesa. "O laudo declara que ele tem uma doença progressiva e irreversível. Não há a menor possibilidade de exercer o direito de defesa. Sem potencial consciência da ilicitude, não há culpabilidade e, portanto, não há crime. Assim, não pode haver condenação", alega o advogado Eduardo Toledo. Ele afirma, ainda, que "a defesa nunca alegou a ausência de autodeterminação ou de compreensão à época da ação."
Desabafo
Ao Correio, Luiz Cláudio Vasconcelos, viúvo de Antônia, diz estar inconformado com a falta de decisão sobre o caso. "Matar no trânsito passou a ser uma prática comum, de mera estatística, com impunidade total a quem comete. Quando a minha mulher foi assassinada eu jurei que lutaria até o fim para que Paulo César Timponi e Marcelo fossem levados a júri popular", declara.
Ele espera que, mesmo com a constatação da doença, o caso não seja interrompido. "Agora, os advogados de Timponi alegam que ele está com problemas mentais e que não pode ser levado a julgamento. Isso é uma vergonha para todos nós que cumprimos a lei", diz.
Entenda o caso
Em outubro de 2007, Paulo César Timponi conduzia o Golf que bateu na traseira de um Corolla na Ponte JK. Na época, um laudo da Polícia Civil apontou que, no momento da batida, o Golf estava a 130 km/h enquanto o outro veículo obedecia a velocidade da via de 60km/h. No carro de Timponi foram encontrados uma lata de cerveja, uma garrafa de uísque e vestígios de cocaína.
Segundo denúncia do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), o acidente foi ocasionado por um racha. Testemunhas afirmaram ter visto, minutos antes do acidente, o músico Marcelo Costa Salles, que dirigia uma S10, disputando um pega com o Golf, conduzido por Timponi. Ele também responde pelo caso.
O ex-professor de educação física se apresentou à delegacia três dias depois do acidente e ficou preso preventivamente aguardando julgamento. Ele chegou a ser solto 104 dias depois, mas voltou à prisão, onde permaneceu de abril de 2008 a setembro de 2009. A defesa de Timponi conseguiu junto ao TJDFT a reclassificação da acusação para homicídio culposo ; sem a intenção de matar ; e, assim, também não seria mais levado a júri popular.
No entanto, em 2017, o STJ reverteu a decisão, mas não decretou uma nova prisão. Os advogados de defesa recorreram ao Supremo Tribunal Federal (STF), que indeferiu o pedido. O processo foi suspenso em 2018 após a indicação de que o réu estaria com Alzheimer precoce, com prejuízos à "comunicação semântica sem, necessariamente, afetar a compreensão", conforme consta em uma decisão da Justiça de 30 de agosto do ano passado.
O que diz a lei
Código Penal Art. 26
É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.