Jornal Correio Braziliense

Cidades

Debates expõem tensão

Pouco antes da condenação de Adriana Villela, representantes da defesa e da acusação fizeram sustentações por sete horas. De um lado, contestou-se o trabalho policial e o que fez a ré no dia do crime. De outro, explorou-se a suposta falta de provas

O décimo e último dia do julgamento mais longo da história do Tribunal do Júri de Brasília ficou marcado pelos debates acalorados entre defesa e acusação. Por cerca de sete horas, advogados e promotores expuseram pontos de vista e análises para tentar convencer os jurados da inocência ou culpa de Adriana Villela, condenada horas depois pelo triplo homicídio na 113 Sul, em agosto de 2009. Mais uma vez, o auditório do TJDFT atingiu a lotação de 224 pessoas. Cadeiras colocadas nos corredores do plenário ampliaram a capacidade, mas, mesmo assim, houve gente que ficou do lado de fora.

A argumentação do procurador de Justiça do Ministério Público do DF e Territórios (TJDFT) Maurício Miranda começou com ataques quanto ao poder econômico da acusada. ;Esse fato é notório: há uma dificuldade para julgar um rico. Por que não julgamos esse caso anteriormente? Observem a quantidade de recursos que colocaram para adiar esse sistema. Isso só a capacidade econômica que permite;, argumentou.

Ele também contestou as investigações da 1; Delegacia de Polícia (Asa Sul) e da 8; DP (SIA), que, segundo o MPDFT, cometeram atos ilícitos para inocentar a arquiteta. ;A Martha (Vargas, então delegada da 1; DP) já achava que o crime foi mandado pela filha, mas, de repente, o depoimento dela mudou de contexto. Encontrei na 1; DP tortura, supressão de objetos a serem recolhidos e policiais dizendo que o crime era latrocínio (roubo com morte);, alegou o procurador.

O MPDFT também criticou a delegacia do SIA, que prendeu Leonardo Campos, mesmo sem ter participado da apuração do crime. ;A 8; DP tentou mudar tudo com tortura. Esconderam documentos. Atendendo a quem? Todo mundo conhece a ligação umbilical que existia entre a doutora Martha e delegados desta delegacia, que trabalharam juntos;, detalhou Maurício. Quanto aos álibis de Adriana, o MP, rebateu explicando que há um vácuo temporal na linha do tempo montado pela defesa no dia do crime, em 28 de agosto. Para a acusação, os advogados de Adriana se basearam no depoimento de um amigo da acusada que estaria com ela em uma palestra, mas a testemunha saiu do evento antes do fim.

Ao assumir a palavra, Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, enfatizou a personalidade de Adriana como de alguém cercada de amigos leais e com forte espiritualidade. ;É uma pessoa completamente dedicada ao voluntariado, às causas sociais, e trabalhou em diversos lugares ao longo da vida. Tentaram mostrar na Adriana uma mulher que não tem nenhum tipo de laço amoroso com a família. Isso foi uma desfaçatez, um descompromisso com a verdade;, ressaltou. O advogado chegou a se emocionar e ficar com a voz embargada algumas vezes.

Ele também reforçou a sustentação de que a acusada nunca esteve no apartamento dos pais no dia do triplo homicídio. ;Tem de ter prova. Estamos mexendo com processo penal, estamos lidando (não só) com a vida dessa mulher e de todos os amigos dela, mas especialmente, com a liberdade dela. Não há um único vínculo que leve Adriana a ter estado naquele local;, sustentou. A defesa novamente lembrou que, desde o início, a filha do casal Villela insistia para que a Polícia Civil investigasse o ex-porteiro. ;É comum a pessoa que contrata apontar quem contratou (para matar)? Não. A menos que essa pessoa queira ser presa;, disse.



Dia a dia

Veja o resumo do julgamento mais longo da história do Tribunal do Júri de Brasília



23 de setembro

Adriana Villela é recebida por amigos e parentes no primeiro dia de julgamento. A sessão começa com o depoimento de uma testemunha de acusação, a delegada aposentada Mabel Alves de Faria Corrêa, à frente da antiga Coordenação de Crimes Contra a Vida (Corvida) em 2009. O esclarecimento dura quase 10 horas. Mabel critica inconsistências na apuração da 1; Delegacia de Polícia (Asa Sul), unidade chefiada, à época, pela delegada Martha Vargas.



24 de setembro

Quatro testemunhas são ouvidas. Renato Nunes Henrique, delegado de Montalvânia (MG), explica o trabalho durante diligências em 2010, quando três suspeitos de cometer o crime foram presos em Minas Gerais. Michele da Conceição Alves, filha de Leonardo, um dos três condenados pelo triplo homicídio, afirma que Adriana mandou matar os pais. Luiz Julião Ribeiro, titular da Corvida à época, confirma que Leonardo contou que Adriana estava na cena do crime.



25 de setembro

Ecimar Loli, delegado da Corvida em 2009, é a sétima testemunha interrogada e detalha o que ouviu dos suspeitos. O procurador Maurício Miranda lê uma carta de 2006, escrita pela mãe da ré, Maria Villela, que, segundo ele, comprovaria a má relação familiar. A primeira testemunha de defesa presta depoimento: Rosa Masuad Marcelo afirma que Adriana e Maria tinham bom relacionamento. Dia fica marcado por bate-boca entre representantes da defesa e da acusação.



26 de setembro

A defesa apresenta sete testemunhas. Enio Esteves, irmão de um ex-namorado da arquiteta, morto em 1983, diz que nunca presenciou brigas entre a arquiteta e os pais. Adriana se emociona com o depoimento dele. Marcos Menezes Barberino Mendes, primo de Adriana, e Célia Barberino Mendes Sena, tia dela, informam ao júri que a ré era amorosa. Elimar Pinheiro, professor de mestrado de Adriana, conta que a acusada era boa aluna e chamava a atenção pelo dinamismo.




27 de setembro

Rodrigo Meneses de Barros, papiloscopista do Instituto de Identificação da Polícia Civil do DF e testemunha de acusação, apresenta laudo que indica que Adriana mentiu quanto à última data em que esteve no apartamento dos pais. Juliano de Andrade Gomes, perito do Instituto de Criminalística da PCDF e testemunha de defesa, mostra parecer técnico sobre o primeiro laudo. A análise de Rodrigo, segundo Juliano, deixou de considerar variáveis que poderiam alterar os resultados.



28 de setembro

Ao passar de 60 horas, o julgamento de Adriana Villela é o mais longo da história da Justiça do Distrito Federal. No sexto dia de julgamento, prestam esclarecimentos cinco testemunhas de defesa. As testemunhas descrevem o dia de Adriana na data do triplo homicídio, cometido em 28 de agosto de 2009. Montar a linha do tempo é uma das principais estratégias da defesa para convencer os jurados da inocência da arquiteta.



29 de setembro

O principal depoimento do dia é dado pelo perito criminal Sami El Jundi, funcionário do Instituto Geral de Perícias do Rio Grande do Sul. Ele faz um ;exercício de retrospectiva sobre o caso;, técnica usada pelo FBI. Após analisar laudos da investigação, o perito identificou o uso de pelo menos dois tipos de arma branca no crime. Segundo o perito, criminosos teriam entrado no apartamento dos Villela para roubar. No entanto, por um motivo não identificado, mataram as vítimas.




30 de setembro

O oitavo dia tem exibição de vídeos dos condenados, até agora, pelo triplo homicídio: Leonardo Campos Alves, Paulo Cardoso Santana e Francisco Mairlon Aguiar. Em um deles, Leonardo leva policiais civis a locais relacionados ao crime, como a Praça das Fontes, em frente ao Conjunto Nacional. Lá, ele afirmou ter se encontrado com Adriana duas vezes: em 3 e 14 de agosto de 2009. Nas conversas, eles teriam acertado o valor pago pelos homicídios: US$ 27 mil e joias.




1; de outubro

Após nove dias de julgamento, Adriana Villela presta depoimento no Tribunal do Júri de Brasília. Além de alegar inocência, a ré critica a investigação realizada pela Polícia Civil. Adriana também detalha o que fez em 28 de agosto de 2009, dia do triplo homicídio. Ela também descreve o relacionamento com os pais e reconhece conflitos com a mãe, Maria Villela, uma das vítimas do crime.