O julgamento de Adriana Villela é o mais longo de um só réu registrado no Distrito Federal. No total, as sessões superam 60 horas e ainda não há previsão para término das sessões no Tribunal do Júri de Brasília. A arquiteta e artista plástica é acusada de ser a mandante do assassinato dos pais e da funcionária da família, em 2009. Ontem ; até o fechamento desta edição ;, cinco testemunhas de defesa foram ouvidas, sendo que duas acabaram dispensadas pelos advogados da ré. Hoje, haverá mais interrogatórios, possivelmente o de defesa de Adriana.
A principal estratégia dos advogados era apresentar uma linha do tempo sobre o dia do crime. Por meio dos relatos, eles mostraram o que Adriana fez em 28 de agosto de 2009, data dos assassinatos do ministro aposentado do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) José Guilherme Villela; da mulher dele, a advogada Maria Carvalho Villela; e da empregada Francisca Nascimento Silva. O primeiro a ser ouvido nesse sentido foi Francisco das Chagas Leitão, amigo de faculdade da acusada. Ao júri, ele contou que, no dia do crime, esteve com Adriana em um seminário no Instituto Cervantes, na Asa Sul. ;Encontramo-nos no hall, onde estava tendo uma exposição de fotografia. Saí outras vezes para fumar e, em todas as vezes, foi possível manter o contato visual com Adriana;, detalhou a testemunha.
Segundo Francisco, ele chegou ao evento por volta das 14h e foi embora no início da noite. ;A minha percepção foi de que Adriana esteve lá o dia todo, inclusive na hora em que fui embora;, completou. Apesar de não saber a hora que deixou o seminário, Francisco disse que foi à noite. Questionado sobre a personalidade da ré, ele afirmou que Adriana é uma boa pessoa. ;Na faculdade, ela assumia a interlocução da turma com os professores. Sempre foi muito assertiva e tinha uma postura firme;, recordou-se.
Após o seminário, segundo a defesa, Adriana seguiu para a Vila Planalto, onde morava Graziela Ayres Ferreira Dias, amiga de infância da acusada e segunda testemunha de ontem. ;Ela chegou (à casa de Graziela) no fim da tarde ou no início da noite e foi embora horas depois. Lembro que, quando entrei em casa, liguei a televisão e estava no fim do Jornal Nacional;, ressaltou. Consta no processo um ofício da Rede Globo detalhando que o programa terminou às 20h57 no dia do crime.
Álibi
Para a acusação, a presença de Adriana na casa dos amigos é incontestável. Entretanto, segundo monitoramento do sinal do celular da ré, há um intervalo, após as 20h13, em que não há registro da presença da arquiteta em nenhum lugar. ;A possibilidade de ela estar na cena do crime é bastante provável;, ressaltou o promotor do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios Marcelo Leite.
Porém, os advogados de Adriana afirmam que há o registro de um e-mail que ela teria enviado de casa, no Lago Sul, no dia do crime, após voltar da casa de Graziela, às 21h17. Entretanto, a acusação refuta essa alegação: ;A defesa usou de má-fé. Não há como afirmar que esse e-mail foi enviado da residência dela. Sabemos apenas que ele foi mandado por meio de um computador ligado a um modem DSL (ligado a uma linha telefônica comum);, destacou Marcelo.
De acordo com um dos defensores de Adriana, Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, a Promotoria falha em provar onde esteve Adriana. ;Não existe nenhum espaço de tempo. Temos a prova milimétrica de onde ela esteve naquele dia, desde o acordar até a noite;, reforçou.
Interrogatórios
Ex-companheiro de Adriana, Livino Silva foi a terceira pessoa ouvida no Tribunal do Júri ontem. O casamento entre os dois durou quatro anos e terminou em 1998. Mesmo assim, a amizade continuou. A testemunha deu detalhes sobre o dia em que o corpo das vítimas foi encontrado, no apartamento dos Villela, na 113 Sul. ;Ela (Adriana) me ligou, disse que os pais estavam desaparecidos e que precisava de minha ajuda;, contou. Após o telefonema, Livino afirmou que saiu de casa, no Altiplano Leste, e foi para a residência da ex-companheira. Os dois seguiram para o apartamento dos Villela.
Ronei Alves, ex-presidente de uma cooperativa de catadores do Riacho Fundo 2 ; onde Adriana desenvolvia um projeto de mestrado com foco no uso do vidro ;, foi a quarta testemunha da defesa do dia. Ele ressaltou que a ré sempre tratou bem os trabalhadores da empresa. No entanto, devido a essa relação, Ronei passou a ser investigado pela extinta Coordenação de Crimes Contra Vida (Corvida), delegacia à frente do caso à época. ;Os policiais foram ríspidos. Trataram-me como se eu fosse um bandido;, queixou-se.
Em seguida, testemunhou André Victor Espírito Santo, delegado aposentado e ex-integrante da diretoria de coordenação das delegacias circunscricionais do DF. À época do crime, ele mediou o contato entre família e polícia. André, segundo o Ministério Público, teria passado informações privilegiadas a Adriana e chegou a responder por quebra de sigilo funcional. A tese dele baseia-se no interrogatório de Leonardo Campos Alves, ex-porteiro do prédio do Villela e um dos três condenados pelo triplo homicídio. ;Estive com Leonardo e, mesmo após ser informado de que a pena cairia 20 ou 10 anos caso a acusasse, ele negou que Adriana tivesse participado (do crime);, frisou.
Colaborou Jéssica Eufrásio
Para saber mais
Júri de policiais militares
Em 29 de agosto de 2015, o Tribunal do Júri de Brasília absolveu nove policiais militares acusados de participar de um massacre na Estrutural, em 1998. O grupo era acusado de participar do assassinato de moradores de uma invasão. À época, testemunhas afirmaram que a truculência dos policiais causou dezenas de mortes e deixou sequelas em outras vítimas. O julgamento do grupo começou em uma segunda-feira e terminou no sábado, sendo, até ontem, considerado o mais longo da história do Distrito Federal.
Dia a dia
Júri popular de Adriana Villela começou na segunda-feira e seguiu ao longo de sábado no Tribunal do Júri de Brasília. Personalidade da ré, relação com os pais, investigações, laudos e álibis foram alvo de discussão. Confira:
23 de setembro
Adriana Villela é recebida por amigos e parentes no primeiro dia de julgamento. A sessão começa com o depoimento de uma testemunha de acusação, a delegada aposentada Mabel Alves de Faria Corrêa, à frente da antiga Coordenação de Crimes Contra a Vida (Corvida) em 2009. O esclarecimento dura quase 10 horas. Mabel critica inconsistências na apuração da 1; Delegacia de Polícia (Asa Sul), unidade chefiada, à época, pela delegada Martha Vargas.
24 de setembro
Quatro testemunhas são ouvidas. Renato Nunes Henrique, delegado de Montalvânia (MG), explica o trabalho durante diligências em 2010, quando três suspeitos de cometer o crime foram presos em Minas Gerais. Michele da Conceição Alves, filha de Leonardo, um dos três condenados pelo triplo homicídio, afirma que Adriana mandou matar os pais. Luiz Julião Ribeiro, titular da Corvida à época, confirma que Leonardo contou que Adriana estava na cena do crime.
25 de setembro
Ecimar Loli, delegado da Corvida em 2009, é a sétima testemunha interrogada e detalha o que ouviu dos suspeitos. O procurador de justiça Maurício Miranda lê uma carta de 2006, escrita pela mãe da ré, Maria Villela, que, segundo ele, comprovaria a má relação familiar. A primeira testemunha de defesa presta depoimento: Rosa Masuad Marcelo afirma que Adriana e Maria tinham bom relacionamento. Dia fica marcado por bate-boca entre representantes da defesa e da acusação.
26 de setembro
A defesa apresenta sete testemunhas. Enio Esteves, irmão de um ex-namorado da arquiteta, morto em 1983, diz que nunca presenciou brigas entre a arquiteta e os pais. Adriana se emociona com o depoimento dele. Marcos Menezes Barberino Mendes, primo de Adriana, e Célia Barberino Mendes Sena, tia dela, informam ao júri que a ré era amorosa. limar Pinheiro, professor de mestrado de Adriana, conta que a acusada era boa aluna e chamava a atenção pelo dinamismo.
27 de setembro
Rodrigo Meneses de Barros, papiloscopista do Instituto de Identificação da Polícia Civil do DF e testemunha de acusação, apresenta laudo que indica que Adriana mentiu quanto à última data em que esteve no apartamento dos pais. Juliano de Andrade Gomes, perito do Instituto de Criminalística da PCDF e testemunha de defesa, mostra parecer técnico sobre o primeiro laudo. A análise de Rodrigo, segundo Juliano, deixou de considerar variáveis que poderiam alterar os resultados.