A brutalidade do crime cometido contra o padre Kazimierz Wojno, 71 anos, reforça a sensação de insegurança de moradores da região central de Brasília, a poucos quilômetros do centro do poder. O latrocínio na Asa Norte, para moradores e fiéis, é uma confirmação do medo diário de que a criminalidade avance no local, mesmo que os índices oficiais registrem queda.
;Aqui na Asa Norte está terrível;, diz a economista aposentada Aidée Almeida, 62. Ela frequenta a igreja Nossa Senhora da Saúde ; paróquia que era comandada pelo padre Casemiro ; há cerca de 14 anos e chegou a trabalhar no local como voluntária, mas deixou o serviço por medo. ;Eu trabalhei um tempo na secretaria da paróquia, mas minha filha tinha pavor. Ela sempre dizia que aqui é muito deserto, mesmo de dia;, explicou.
A pedagoga Márcia Phillipi, 56, também compartilha a sensação de que a insegurança é constante nas áreas próximas ao local do crime. ;Nem a própria igreja é respeitada. Isso deixa uma dor na gente;, desabafou. Márcia trabalha em um colégio ao lado da paróquia e acredita que a educação pode ser uma das formas mais importantes de combater a criminalidade. ;Eu que trabalho em uma escola fico pensando sobre o que a gente pode fazer pela formação humana. Precisamos formar melhor as pessoas que ainda agem dessa forma violenta.;
Para uma fiel da paróquia e moradora da região, de 51 anos que pediu para não ser identificada, a segurança na Asa Norte gera preocupação diária. Um assunto que era, inclusive, tratado com frequência pela vítima. ;Aqui na igreja, a gente está totalmente vulnerável. O padre, em todas as missas, falava sobre a questão da segurança. Sempre pedia para a gente ajudar;, contou. Assim como outras áreas do setor central de Brasília, a região da igreja, destaca a mulher, é muito deserta e escura durante a noite.
Em nota oficial sobre o caso, o governador Ibaneis Rocha (MDB) frisou que a crueldade do crime, de fato, revela a sensação de insegurança que recai sobre toda a sociedade. ;Expõe uma dura realidade que precisamos enfrentar com determinação. Por mais preparada e equipada que esteja a polícia, por mais rigorosas que sejam as leis, a criminalidade violenta
expõe sua face onde e quando menos esperamos;, disse o chefe do Executivo local.
Registros em queda
Apesar da sensação de insegurança que acomete a população das regiões centrais de Brasília e das cidades do Distrito Federal, a Secretaria de Segurança Pública (SSP/DF) ressalta que os índices de criminalidade estão em baixa. De acordo com a pasta, de janeiro a agosto deste ano, foram registrados três casos a menos de latrocínio no DF em comparação com o mesmo período do ano anterior. Foram 15 em 2019 e 18 em 2018. Nas Asas Sul e Norte, um latrocínio foi registrado nos primeiros oito meses de 2018.
Segundo a pasta, homicídios, lesões corporais e roubos seguidos de morte são monitorados com prioridade. ;Esses compõem os Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLIs), que, nos primeiros oito meses deste ano, marcaram queda de 15,8%, o que representa 53 mortes a menos;, informou nota enviada pela assessoria de imprensa do órgão. A pasta ressalta que, para evitar que violações do tipo aconteçam, as forças de segurança atuam com base em estudos produzidos pela SSP/DF, que avaliam a dinâmica, o dia, o local e a hora em que cada crime é mais recorrente.
Aparente contradição
Parece incoerente que, apesar dos índices de criminalidade estarem diminuindo, a sensação de insegurança esteja em alta. Marcelle Filgueira, professora da Universidade Católica de Brasília (UCB), explica que as duas questões não têm correlação direta.
Segundo a especialista em segurança pública, os dois fatores, frequentemente, caminham em direções contrárias. ;Na sensação de segurança, pesam, por exemplo, questões como idade. Pessoas mais velhas tendem menos a ser vítimas de crime e, mesmo assim, se sentem mais inseguras. Jovens seguem no caminho contrário;, observa.
A percepção de segurança, de acordo com a especialista, deve ser levada em conta pelo poder pública a fim de formular políticas voltadas para a área. ;O governo, além das ações mais comuns, como mais patrulhamento, também deve buscar uma relação mais próxima com a comunidade e cuidar de equipamentos públicos, como a iluminação e poda de árvores;, afirma.
Artigo
por Paloma Oliveto
Como era fácil gostar do padre Casemiro!
Conheci o padre Casemiro com uns 5 anos de idade. Na época, a Paróquia Nossa Senhora da Saúde era um pequeno salão, um ;puxadinho;. Com um português sofrível, aquele polonês gorducho e rosado, com uma eterna cara de menino, se esforçava para agradar a comunidade, ainda ressentida da saída do padre que o antecedeu. Minha família foi uma das primeiras que o acolheu.
Como era fácil gostar do padre Casemiro! As dificuldades com o idioma não o impediam de fazer piadas ; que geralmente não dava para entender por causa do forte sotaque. Ele chorava de rir das próprias graças, com uma inocência comovente.
Padre Casemiro construiu a linda igreja que substitui o ;puxadinho; com as próprias mãos. Mal tirava a batina e corria para a obra. A essas alturas, já era extremamente amado pela comunidade e já falava bem o português (mas continuava contando piadas que só ele entendia;).
Sorria com os belos olhos azuis, que também lacrimejavam quando ele falava da Polônia. Nascido no pós-guerra, viveu os horrores de uma Europa devastada e viu seu país ser arbitrariamente anexado à União Soviética. Apesar das saudades, nunca falou em partir. Amava o Brasil e a numerosa família que fez aqui, seus paroquianos, seus filhinhos.
A notícia da morte dele ainda parece um pesadelo. A ficha não caiu. Tento não pensar no horror que aqueles olhos expressaram enquanto lhe roubavam a vida. Antes, visualizo os olhos risonhos, bondosos, cheios de amor. Ainda molhados de tantas gargalhadas depois de contar piadas. Adeus, ;do widzenia;, padre Casemiro! Agora vá fazer rir os anjos do céu.