Jornal Correio Braziliense

Cidades

O sorriso como remédio

Grupo Mamulengo Alegria leva espetáculo de comédia a pacientes em tratamento e acompanhantes. Primeira experiência foi no Hospital da Criança de Brasília



A história gira em torno do amor de um casal prestes a subir no altar. Tudo sairia bem se o pai da noiva, que manda e desmanda na região, não fosse contra o casamento porque o pretendente não tem dinheiro. Para ajudar os apaixonados, o primo da moça faz de tudo para salvar a união. Parece um conto triste e de difícil superação. No entanto, as cenas arrancaram sorrisos de crianças e adolescentes em tratamento no Hospital da Criança de Brasília José Alencar, na manhã de ontem.

O espetáculo O Casamento de Chiquinha Muito Prazer foi apresentado no corredor central do prédio e deve passar por outras 15 unidades públicas de saúde até o fim do ano ; de diferentes regiões administrativas. O projeto recebe o patrocínio da Fundação de Apoio à Cultura do Distrito Federal (FAC-DF).

Uma mistura de teatro de bonecos e música popular brasileira, a apresentação reúne 10 pessoas, entre artistas e produtores, com o intuito de deixar mais leve a rotina de quem vive nos hospitais e de seus acompanhantes. Há 20 anos, o grupo Mamulengo Alegria faz esse trabalho social no DF. Já passou por casas de acolhimento de crianças e idosos, e o foco, agora, é alcançar aqueles que não podem, muitas vezes, ter momentos de lazer, devido a alguma doença.

Produtora do espetáculo, Ana Carla de Menezes explica que a experiência em hospitais é peculiar, porque o público chega angustiado e retraído. ;Eles passam por procedimentos que trazem dor. E nós compreendemos isso;, afirma. ;Mas, aos poucos, as crianças se soltam, começam a interagir com os bonecos e relaxam. Não só nelas, os adultos que as acompanham também. É uma apresentação para todas as idades.;

Ana Carla lembra que muitos pacientes internados ficam completamente isolados do mundo. A depender do tratamento, não podem sair nem dos quartos. ;A gente busca o público com menos acesso e vai até ele. Acho que a sociedade tem de contribuir mais com essas pessoas. Dar alegria, divertimento. É o papel do cidadão. Nós fazemos por meio do mamulengo;, acrescenta.

Leveza no tratamento
A apresentação arrancou risadas da pequena Marcela Cammata, 6 anos, que trata de uma leucemia linfoide aguda (LLA) ; multiplicação anormal de células ; desde maio no Hospital da Criança. A ida à unidade depende dos procedimentos que ela precisa fazer. Ontem, por exemplo, foi a vez de trocar um curativo. Na próxima semana, a menina volta para tomar medicação. A rotina acaba sendo cansativa. Para o pai dela, o servidor público Luís Antônio de Araújo, 48, as apresentações no hospital ajudam a diminuir a tensão do tratamento. ;Deixa o ambiente mais confortável e leve. Traz alegria não só para ela, mas para mim também.;

Além de ser presenteado com o espetáculo, Arthur de Macedo, 9, ganha a companhia da família toda vez que precisa ir ao hospital. Os pais descobriram o autismo dele quando tinha 5 anos. Desde então, o acompanhamento é mensal. A mãe, a professora Beatriz Pereira, 42, já assistiu a vários espetáculos no hospital, mas esta foi a primeira vez que acompanhou um teatro de bonecos. ;É muito bom. Enquanto a gente espera a passagem pela triagem e a chamada para a consulta, ele vai se acalmando e entra no consultório mais tranquilo;, ressalta.

Apaixonado por música, Filipe Alcoeres Queiroz, 9, não gostou quando a apresentação acabou. ;Ele está internado aqui desde segunda-feira, porque precisa fazer exames e ver a válvula que tem na cabeça desde o nascimento. Eu e a mãe dele nos revezamos para acompanhar. Com essas apresentações, ele se distrai mais, porque acaba ficando muito preso aqui. A gente se distrai junto;, diz Sheila Pereira, 32, tia do garoto.





Patrimônio cultural
Em 2015, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) reconheceu o teatro de bonecos popular do Nordeste como patrimônio cultural imaterial do Brasil.

Para o mamulengueiro Josias da Silva, é gratificante levar mais da cultura do país para as pessoas. ;O intuito é oferecer momentos de alegria, nem que seja um pouco. A gente acredita que o sorriso pode ser o remédio para quem carrega uma carga pesada e cansativa. O meu coração fica cheio e satisfeito por saber que cumprimos algo que nos propusemos fazer;, avalia o artista.




"Enquanto a gente espera a passagem pela triagem e a chamada para a consulta, ele vai se acalmando e entra no consultório mais tranquilo;
Sheila Pereira, tia de Filipe, que faz tratamento no hospital




Próximas apresentações

23 de setembro (segunda-feira)
Hospital Regional de Ceilândia
14h


2 de outubro (quarta-feira)
Hospital Sarah Centro
14h