;Infelizmente, é mais um caso de feminicídio que chega à nossa delegacia em que um homem, tomado por ciúmes, acaba matando uma mulher covardemente;, lamenta a delegada responsável pelo caso, Jane Klébia, titular da 6; Delegacia de Polícia (Paranoá). Mas por que o assassinato de mulheres está virando uma rotina na vida dos brasilienses? Para Valeska Zanello, professora do Departamento de Psicologia Clínica da Universidade de Brasília (UnB), o aumento de casos se deve ao comportamento sexista da população brasileira, que ainda não perdeu força. ;Na nossa cultura, as mulheres são ensinadas que se deve arrumar um homem e manter a relação, por isso insistem em namoros e casamentos abusivos. No caso deles, a ideia de controle e misoginia são passados;, explica.
Jhonnatan Neto, assassino confesso, ficou preso anteriormente durante cerca de sete anos por uma condenação por roubo. Em uma saída temporária da penitenciária, o ;saidão;, ele conheceu a vítima e os dois começaram a se relacionar. O namoro terminou pela primeira vez quando ele voltou à prisão, mas, há quatro meses, eles se reencontraram e reataram. No mesmo período, o casal começou a trabalhar junto em uma chácara no Núcleo Rural Boqueirão, do Paranoá. Na última briga, no começo de setembro, ela não aceitou mais o comportamento dele e se separou de vez.
Possessivo
Eles continuaram morando na chácara, mas em casas diferentes, em que prestavam serviços e Jhonnatan passou a fazer ameaças à ex-namorada. ;Ele ficava falando para que ela não provocasse ciúmes nele, levando ninguém para casa. Mas ela era livre, não tinha mais um relacionamento e a casa também era dela;, ressaltou a delegada. Lilian tentou seguir sua vida por meio dos estudos. Matriculada na educação de jovens e adultos (EJA) do Centro de Ensino Fundamental I do Paranoá, ela trabalhava o dia inteiro e estudava no período noturno. No colégio, conheceu um jovem de 17 anos que estudava na mesma sala de aula e os dois ;começaram a ficar;, segundo o jovem. Na noite anterior ao crime, o rapaz visitou Lilian e dormiu na casa dela.
O dono da chácara, que pediu para não ser identificado, previu a reação de Jhonnatan e solicitou para que um vizinho, que é agente penitenciário, retirasse o jovem do local. Quando o policial chegou, o ex-namorado da mulher estava discutindo com o atual, o ameaçando de morte, dizendo que iria esfaqueá-lo. ;O agente não sabia da história dos dois e tentou esclarecer a situação, mas, antes que ele conseguisse, Jhonnatan já estava agredindo a Lilian;, detalhou a delegada. O vizinho deu dois tiros de alerta para o chão, depois tirou a faca da mão dele e socorreu a vítima, a conduzindo para o hospital, enquanto o dono da chácara mantinha o acusado no local para evitar a fuga. O próprio policial voltou e conduziu o assassino à 6; DP. Momentos depois, ele soube que Lilian não havia resistido aos ferimentos e morreu.
Vida interrompida
;Uma pessoa guerreira, que trabalhava, estudava e era muito inteligente;, assim Maria das Dores, 47, dona da chácara, descreve a vítima do feminicídio. Maria considerava Lilian como uma filha, tanto que cuidava do bebê da mulher, de 1 ano, enquanto ela ia para a escola. ;Nos conhecemos há uns três anos, quando ela começou a trabalhar para mim, entregando as marmitas que eu fazia. Desde então, fomos criando um apego muito grande;, conta Maria. Além dos serviços gerais na chácara, Lilian ainda fazia bicos como cabeleireira e manicure. Dos quatro filhos, dois ficavam com a mãe da jovem, um com o pai de uma das crianças e outro com a própria Lilian. Desolada, a avó dos garotos não conseguiu falar sobre o crime. ;Ficamos muito chocados com tudo, porque ele fazia o que ela queria, parecia ter amor. Mas lembro que uma vez o Jhonnatan chegou a dizer que ;em mulher não se bate, só mata;;, relatou Maria.