Passar por três relacionamentos abusivos marcou a vida de Malu (nome fictício), 31 anos. Apesar de ter denunciado dois ex-companheiros agressores, o medo não deixou de estar presente. No caso mais recente, um ex-namorado a agrediu durante um churrasco. Ele discutiu com ela, empurrou-a, intimidou-a e, quando Malu tentou fugir de carro, o ex-namorado quebrou um copo no rosto dela. ;Não fiquei ferida. Mas ele me chutou, bateu no pai dele e chutou um amigo meu. Ele não queria me deixar ir embora. Tenho certeza de que o que se passava na cabeça dele era: ;Quem manda aqui sou eu;;, conta.
Malu denunciou o agressor na Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam) por vias de fato, ameaça e injúria. Dois anos depois, ele foi condenado. ;Às vezes, é difícil perceber que estamos no lugar da vítima. Eu sei o que preciso fazer, mas tenho medo. É isso o que impede tantas mulheres de denunciar. Felizmente, tive apoio, e isso abriu a minha cabeça para acolher outras mulheres;, diz. ;Denunciei para que a próxima mulher não passe por isso. Fiz por aquelas que virão.;
Mais do que um crime do dia a dia, a violência sexual contra as mulheres é cultural, como explica a promotora de justiça Mariana Távora, coordenadora do Núcleo de Gênero do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT). ;Ainda há um julgamento moral enorme da mulher. Ela é perguntada se a roupa que usava era adequada. Há uma inversão do julgamento. O sistema de justiça é um reflexo da nossa sociedade.; O medo é fator decisivo para que muitas deixem de denunciar: ;Não só de que o agressor saia impune, mas também de que ela (a vítima) seja julgada ou ridicularizada;, explica Mariana.
A Secretaria de Segurança Pública reconhece que há subnotificação dos casos de violência, além da necessidade de promover a atualização dos profissionais que atendem as mulheres. A pasta trabalha com foco em campanhas para alcançar vítimas, parentes e testemunhas. ;Temos de capacitar mais pessoas. E esse é um desafio para nós. Nem todos estão preparados. Sabemos desse desafio e vamos superá-lo. Se conseguirmos entender realmente por que a pessoa não denuncia, conseguiremos fazer uma campanha eficiente;, assegurou o secretário executivo do órgão, Alessandro Moretti. (JE)
*Colaborou Mariana Machado