Com as contas no vermelho e a possibilidade de mais cortes, o Buriti apertou os cintos. A concessão de reajustes ao funcionalismo, por exemplo, está fora de pauta. ;São processos antigos. Diante da insegurança quanto ao FCDF, que corresponde a R$ 14 bilhões do orçamento, qualquer ação de aumento na folha de pessoal fica inviabilizada, assim como novas políticas de investimento e custeio em diversas áreas, a exemplo de educação, transporte e assistência social;, explicou o secretário de Economia, André Clemente. O titular da pasta acrescentou que o GDF dialoga com deputados federais e senadores do DF para buscar soluções para os questionamentos.
;Se pudermos dar mais clareza à lei que trata desse caixa, vamos provocar essa alteração;, adiantou. ;Em relação às duas primeiras derrotas, tentaremos revertê-las no Supremo Tribunal Federal (STF). Acreditamos que, em uma Corte imparcial, teremos sucesso. É o STF quem tem competência para solucionar os conflitos sobre interesses dos governos local e federal;, complementou. O procedimento em trâmite que pode causar maior impacto orçamentário aos caixas brasilienses trata do recolhimento das contribuições previdenciárias de servidores das polícias Civil e Militar, além do Corpo de Bombeiros.
Procedimento parado
O TCU analisa se o Distrito Federal precisa devolver ao Fundo Constitucional cerca de R$ 5,56 bilhões, arrecadados entre 2003, ano da criação do cofre, e 2015. A discussão começou depois que o então Ministério da Fazenda e a Advocacia-Geral da União (AGU) recorreram contra o acórdão que impediu o órgão ministerial de reter os valores mês a mês. Àquela época, a Corte entendeu que o montante não deveria retornar aos cofres do governo federal, nem ficar à disposição do DF.
A solução encontrada foi colocá-lo no Fundo Constitucional, vinculado ao pagamento das aposentadorias e pensões. Um grupo de trabalho, formado por órgãos federais e locais, ficou responsável por apresentar uma proposta e estudos, informando valores históricos, fundamentação dos acréscimos legais e valores corrigidos relativos às contribuições previdenciárias. Sob relatoria do ministro Aroldo Cedraz, está parado desde novembro de 2018 o procedimento relativo ao possível ressarcimento por parte do GDF da verba recolhida por 12 anos.
Auxílio-moradia
Outro processo estuda se o Fundo Constitucional deveria custear o reajuste do auxílio-moradia de policiais militares e bombeiros concedido em 2014, na gestão de Agnelo Queiroz (PT). O decreto n; 35.181/2014 estabeleceu os novos valores, com aumentos progressivos, até 2016. O benefício de um coronel com dependente, por exemplo, passou de
R$ 143,91, em agosto de 2014, para R$ 3,6 mil em setembro de 2016.
Em parecer, o Ministério Público junto ao TCU manifestou-se pela suspensão do pagamento da diferença entre o benefício previsto na Lei n; 10.486/2002 e o decreto de Agnelo, e recomendou a abertura de uma tomada de contas especial para a quantificação dos prejuízos do FCDF. À época, verificou-se um aumento de 317% nos gastos do GDF com auxílio-moradia entre 2013 e 2014 ; a cifra subiu de R$ 13,88 milhões para
R$ 57,87 milhões.
Após três anos, a conta chegou a R$ 459,11 milhões. Ou seja, entre 2014 e 2017, o acumulado atingiu R$ 948 milhões. O TCU estuda, agora, se esse montante deve ser ressarcido ao cofre mantido pela União. Sob relatoria do ministro Aroldo Cedraz, o processo chegou a ser incluído nas pautas de 27 de novembro e 4 de dezembro de 2018, mas, logo depois, foi retirado.
Cabo de guerra
Dois acórdãos do TCU deste ano deixaram as contas da capital no vermelho. Em março, a Corte de contas reconheceu que o Imposto de Renda incidente sobre o salário de servidores da Polícia Civil, da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros pertence aos cofres federais e, não aos distritais. A decisão implica em perda de R$ 680 milhões anuais na arrecadação do DF e em dívida de R$ 10 bilhões com a União, referente ao passivo acumulado. Para reverter o acórdão, a Procuradoria-Geral do DF recorreu ao STF. Em abril, o ministro Marco Aurélio de Mello atendeu o pedido do GDF e suspendeu, liminarmente, a determinação do TCU.
O tema, entretanto, ainda precisa ser analisado em plenário. No último dia 15, a Corte de contas impediu que o Buriti use recursos do Fundo Constitucional para pagar aposentadorias e pensões de novos inativos da saúde e da educação. Publicado na terça-feira, o acórdão prevê prazo de 180 dias para que o GDF apresente plano de ação para resolver a situação. A Procuradoria-Geral do DF aguarda o recebimento da notificação para acionar o STF. Devido às sequenciais derrotas, o governador Ibaneis Rocha (MDB) fez duras críticas aos ministros.
;Eles (ministros do TCU) têm de tomar vergonha na cara e parar de atrapalhar. Gastam bilhões por mês e não servem para merda nenhuma;, declarou Ibaneis, na data da última decisão. Com os acórdãos, o governo cortou gastos e descartou novas despesas. Decidiu-se, por exemplo, deixar de reduzir o interstício para a promoção de policiais militares e bombeiros ; tempo que o profissional deve cumprir na função antes de alçar um cargo mais alto.
Evolução de gastos
O Palácio do Buriti utiliza os recursos do Fundo Constitucional para investimentos, custeios e quitação de folhas de pagamento da segurança, saúde e educação. Confira os usos nos últimos anos
2017
Pessoal e encargos sociais
R$ 11.565.236.307,35
Outras despesas correntes
R$ 1.306.431.340,45
Investimentos
R$ 67.796.530,50
Total: R$ 12.939.464.178,30
2018
Pessoal e encargos sociais
R$ 12.216.101.810,52
Outras despesas correntes
R$ 1.501.171.945,57
Investimentos
R$ 94.724.130,70
Total: R$ 13.811.997.886,79
2019
Pessoal e encargos sociais
R$ 7.671.669.538,99
Outras despesas correntes
R$ 906.922.857,37
Investimentos
R$ 42.696.931,92
Total: R$ 8.621.359.328,28
Fonte: Portal Siga Brasil ; Senado Federal
Falhas encontradas
Ao longo dos últimos anos, o Tribunal de Contas da União apontou diversos usos irregulares do Fundo Constitucional que resultaram em impactos orçamentários para o Distrito Federal.
; Gratificações: em processo de 2002, a Corte de contas proibiu o uso de recursos do Fundo Constitucional para o pagamento de gratificações salariais criadas pelo GDF para servidores da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros. O acórdão obrigou o Buriti a ressarcir o caixa pelos repasses.
; Despesas: em 2010, o TCU instaurou uma Tomada de Contas para investigar o uso de dinheiro do Fundo Constitucional para a quitação de despesas da Secretaria de Segurança Pública e da Fundação de Amparo ao Trabalhador Preso do DF (Funap) entre 2004 e 2007. A decisão inicial estabeleceu a devolução de R$ 300 milhões ao cofre. Entretanto, depois, a Corte estabeleceu que ;o desvio de objeto em benefício da comunidade afasta a ocorrência de débito;.
; Superavit financeiro: em 2018, o GDF requereu que os recursos orçamentários do Fundo não empenhados em um ano fossem transferidos ao próprio cofre no exercício seguinte, por meio de créditos orçamentários. O TCU negou o pedido.
O que diz a lei
A Lei n; 10.633, de 27 de dezembro de 2002, instituiu o Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF), ;com a finalidade de prover os recursos necessários à organização e à manutenção da Polícia Civil, da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros Militar do DF, bem como assistência financeira para execução de serviços públicos de saúde e educação;. Conforme a legislação, em janeiro de 2003, os recursos correspondentes passaram a ser entregues ao GDF até o dia 5 de cada mês.