Aventura na feirinha
Sempre gostei das feiras, do clima de bagunça organizada, do burburinho, do cheiro de legumes e dos pregões bem-humorados. Deve ser efeito da ascendência nordestina. As feirinhas imprimem um colorido e acento telúrico ao artificialismo do Plano Piloto. Espalham-se pelas superquadras, pelas entrequadras e pelas cidades-satélites.
Quando viajava para o Nordeste, sempre costumava visitar as feiras. Lá, elas têm um elemento de humor muito vívido nos bordões para chamar a atenção dos compradores: ;O patrão morreu, e a viúva enlouqueceu. É pra acabar freguesa;.
Recentemente, voltei a frequentar as feirinhas. E posso assegurar que vale a pena sob todos os aspectos: da economia à qualidade dos alimentos, passando pelo contato com a riqueza humana. A primeira diferença é o gosto das frutas e dos legumes. Mesmo os que não são orgânicos apresentam distinção notável. É o caso das bananas, muito mais doces e saborosas do que as dos supermercados. Parece que germinaram da terra e não de um laboratório.
Um colega de redação a quem ofereci uma banana resumiu com agudeza: ;Muito boa, doce, diferente daquelas de supermercado, que têm um gosto artificial, gosto de isopor;. Fica a dúvida, sabe-se lá o que colocam nestas frutas para que elas cresçam e fiquem enormes.
As maiores são as que contém mais agrotóxicos ou, segundo a versão de autoridades do ministério da Agricultura, produtos fitossanitários. Os legumes também são mais saudáveis, percorrem uma distância menor, passam por menos intermediários para chegar até o consumidor.
Do ponto de vista econômico, as feirinhas das cidades-satélites são importantíssimas para as classes populares. Elas são uma riqueza. Com qualquer R$ 20 ou R$ 30, ninguém passa fome. Leva para casa um maço de cenoura, de couve, de alface ou uma abóbora. Ou, então, um quilo de feijão-de-corda, uma dúzia de laranja ou de ovos.
E existe a riqueza humana. Eu e minha esposa fomos à banca de uma angolana com cara de brava. Alguém que havia comprado bananas desistiu e pediu o dinheiro de volta. A dona da banca ficou indignada. Minha esposa tentou explicar e sobrou para nós: ;Ela tem coração ruim. E vocês também têm coração ruim;.
Logo em seguida, nos deparamos com outra angolana educadíssima e gentil que compensou todo destempero da outra. De qualquer maneira, inventamos uma brincadeira. Quando alguém nos nega algum pedido, replicamos com o argumento inapelável: ;Você tem coração ruim;. Domingo será dia de feirinha, de milho verde assado na brasa e de mixirica com gosto de quem apanha a fruta na árvore.