Jornal Correio Braziliense

Cidades

Armar pessoas sem preparo é perigoso


A deputada federal pelo DF Flávia Arruda (PL) criticou o decreto do presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL), que facilita o acesso ao porte de armas. Para ela, o país não está preparado. ;Armar pessoas sem preparo é, no mínimo, perigoso;, alegou em entrevista ao CB.Poder, parceria do Correio com a TV Brasília. A parlamentar é coordenadora da Comissão Externa de Combate à Violência Doméstica na Câmara dos Deputados. ;Estamos combatendo um crime como esse (feminicídio) e facilitar o acesso às armas vai contra tudo pelo que temos lutado;, observou.

Na semana passada, uma sugestão de Flávia para que policiais das forças de segurança do DF processados pela Lei Maria da Penha sejam afastados dos trabalhos de rua e tenham as armas confiscadas foi acatada pelo governador Ibaneis Rocha (MDB), que assinou decreto com a medida. ;Começamos pelo policial, porque é a forma mais rápida de agir. Existem projetos no Congresso para desarmar qualquer pessoa que responda por Maria da Penha;, explicou.


O que motivou essa proposta de retirar arma de processados por Lei Maria da Penha?
Ter a facilidade da arma na mão contribui para que, no calor do momento, ocorra o crime. Tem sido assim, por uma pura insatisfação, por ciúme, que essas coisas têm acontecido. Começamos pelo policial, porque é a forma mais rápida de agir, mas existem projetos no Congresso para desarmar qualquer pessoa que responda por Maria da Penha.

Como as corporações do DF receberam essa medida?
As forças de segurança receberam bem a ideia, porque não querem manchar a imagem da corporação com esses cidadãos que cometem crimes assim. Eu queria aproveitar a oportunidade para deixar claro que esses casos são minoria na segurança pública. No DF, temos a polícia mais bem preparada do país. Eles receberam de forma cordial, sabendo que é preciso fazer esse combate.

Como vai funcionar na prática?
No decreto do governador Ibaneis Rocha, isso está especificado. O policial que está respondendo a processo de Maria da Penha ficará afastado do trabalho na rua e passará para o serviço administrativo. A arma será recolhida. A partir do momento em que ele não responder a processo, a arma será devolvida.

O que é preciso para o policial receber essa punição?
Ele tem de estar indiciado, respondendo a um processo. Não podemos retirar de alguém que foi simplesmente denunciado. Tem de estar realmente respondendo por isso, porque nós temos de ser prudentes e responsáveis na aplicação das leis.

É um momento difícil para se tratar desse assunto, com decreto do presidente para facilitar o acesso às armas?
Muito difícil. A gente tem aí a bancada da bala, que defende suas posições. Respeito as posições de todo mundo, mas eu acho que o momento é muito ruim para pensar em armar a população. Nós temos visto índices altíssimos nos países em que foi liberado o porte de armas. O índice de criminalidade, o indício de homicídios... Aumentou. Não vivemos um momento fácil no país. Armar pessoas sem preparo é, no mínimo, perigoso. Não é o momento. Estamos combatendo um crime como esse (feminicídio) e facilitar o acesso às armas vai contra tudo pelo que temos lutado.

Em muitos casos, as mulheres têm dependência econômica dos agressores. Como ajudá-las a sair desse ambiente?
Grande parte dessas mulheres que permanecem nesse ciclo de violência intenso e de muitos anos é por questões financeiras, por dependência econômica e emocional. Estamos trabalhando muito, inclusive com a sociedade civil, para mudar isso. Há projetos maravilhosos de empreendedorismo para a mulher para que ela consiga ter independência. Precisamos ajudá-la a conseguir capacitação e entrar no mercado de trabalho.

Existe algum projeto pensado para as escolas?
Eu estou propondo isso para a Secretaria de Educação do DF. Estamos terminando de formatar um projeto para levar para escolas pensando justamente nos meninos para que eles entendam a questão da igualdade de gênero, do respeito com a mulher. A nossa ideia é trabalhar isso com crianças pequenas, dentro das escolas. Mostrar para eles que o que a mulher quer não é ser melhor do que ninguém, mas só ser tratada da mesma forma e com respeito. Sabemos que, em casa, a realidade que eles veem é outra; por isso a necessidade do trabalho educativo.

Como a senhora vê a questão das reformas que estão no Congresso?
São prioridade neste momento. O Brasil tem um estado fiscal muito grave, e precisamos tomar medidas para resolver isso. Essas reformas precisam passar, porque o país precisa sair do caos em que se encontra. Todo mundo tem suas questões quanto a alguns temas, mas a reforma tem de passar.

As manifestações de domingo podem atrapalhar a relação do Congresso com o Executivo?
Eu acho que não vão atrapalhar. As manifestações são legítimas. Todo tipo de manifestação pacífica faz parte da democracia. Todos podem se manifestar pelo que pensam, pelo que lutam. A maioria dos que foram às ruas foram para pedir um país melhor, mas o maniqueísmo é perigoso. Não podemos entrar na linha de, ou é do meu jeito, ou não dá. Precisamos de ponderação. Quando pedem fechamento do Congresso e do Supremo, é algo que não se pode nem discutir, fere a democracia, a Constituição, fere tudo que lutamos para conseguir.

A retirada do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) do Ministério da Justiça foi uma derrota para o governo?
No caso do Coaf, o meu voto foi técnico. O Coaf é um órgão de fiscalização financeira. Funcionou durante 20 anos muito bem no Ministério da Economia. É muito perigoso esse negócio de fulanizar os órgãos. O Coaf é um órgão de fiscalização que cabe ao Ministério da Economia, como em quase todos os países de primeiro mundo. Respeito muito o ministro Sérgio Moro, mas, se ele virar ministro do Supremo, ele não vai poder levar o Coaf com ele. Aí, entra outro ministro, será que a população vai gostar? Se não gostar, vamos ter de mudar o Coaf de lugar de novo? Temos de ser contra essa fulanização.