Jornal Correio Braziliense

Cidades

Prejuízo no comércio



Os problemas de infraestrutura em Vicente Pires têm gerado reflexos no comércio da cidade. No período de chuva, as construções inacabadas transformam as ruas em um mar de lama. Na seca, a poeira sobe e prejudica a saúde de quem mora e trabalha na região. O resultado é o desaparecimento de clientes. Sem movimento nas lojas, muitos empreendedores se viram obrigados a fecharem as portas.

Levantamento da Associação Comercial e Industrial de Vicente Pires (Acivip) calcula que, desde 2017, 962 empresas deixaram de funcionar. A situação piorou desde outubro do ano passado. O estudo também mostra que a quantidade de trabalhadores desempregados pode chegar a 4.645, considerando-se cinco empregados por loja ; dados contestados pela Administração Regional. A coleta de dados foi feita por pesquisadores contratados pela Acivip e ocorreu entre 8 e 11 de abril deste ano.

Segundo o fundador e presidente da entidade, Anchieta Coimbra, os clientes passaram a frequentar outras regiões, o que explica o prejuízo no comércio local. ;Como uma pessoa sai de casa para fazer compras na lama? Como qualquer empresa consegue sobreviver a isso?;, questiona.

A queda no movimento fez com que Maria do Perpétuo Socorro Torres, 59 anos, encerrasse as atividades do restaurante que mantinha na cidade há 18 anos. O estabelecimento foi um dos primeiros especializado em comida nordestina de Vicente Pires. A última vez que Socorro abriu as portas foi no Dia das Mães. ;Com as obras, o movimento só foi reduzindo. Tivemos que cortar gastos e demitir oito funcionários;, lamenta.

Ela ainda tentou resistir durante seis meses, fazendo o serviço de entrega de refeição. Mas as ruas alagadas e esburacadas tornaram-se empecilho para continuar a atividade. ;Daqui, muitas famílias sobreviveram. Fechamos com muita dor no coração, pois tivemos uma história bonita;, ressalta. Para manter o sustento da casa, a principal fonte de renda de Socorro é, hoje, outro restaurante da família, em Taguatinga.

Proprietário de imóveis e também morador de Vicente Pires, Alair de Lima Ribeiro, 77, aluga salas na rua 4B e perdeu a única fonte de renda. ;Quando as obras começaram, nos deram 30 dias de prazo, mas ela nunca terminou. O governo deixa a gente no caos e não se importa. Os inquilinos quebram, os proprietários, também;, conta. O empresário calcula R$ 9 mil de prejuízo todo mês. ;Com a obra mal planejada, a gente não ganha, só perde.;

O empresário Roberto de Castro, 65, morador da cidade, abriu uma padaria na mesma rua em 2017, mas fechou um ano depois. Entre os motivos que o fizeram desistir do comércio, estão a poeira em cima de produtos embalados e na loja, a baixa circulação de clientes por causa dos alagamentos e buracos, além da perda de produtos. ;Os consumidores não vêm comprar nada aqui. Tinha dias que eu perdia totalmente a produção. Foi um desastre econômico para Vicente Pires.;





Soluções

Administrador regional de Vicente Pires, Daniel de Castro refuta os dados do levantamento, alegando que os números da associação não são resultado de uma pesquisa científica. ;Foram índices coletados no olhômetro e 90% das lojas já estavam fechadas há quatro anos. Desde janeiro deste ano, mais de 1 mil empresas pediram a licença de funcionamento. Dessas, 700 foram deferidas e 300, renovadas;, garante.

Daniel reconheceu os impactos das obras, mas reforçou que a promessa do Governo do Distrito Federal (GDF) é finalizar de 70% a 80% das construções até o fim do ano e, o restante, até 2020. ;Quando assumimos, a cidade estava aberta, com lama, poeira e sem geração de emprego. Mas vemos a Vicente Pires do progresso. Quando toda a cidade estiver asfaltada e iluminada, será um polo atrativo de novas empresas para geração de empregos na cidade;, destaca.

Ele também discorda dos dados da Acivip de que o fechamento das lojas tenha causado quase 5 mil demissões, pois argumenta que nem todas têm ao menos cinco empregados. Até outubro, a prioridade do Executivo local será a pavimentação e a terraplanagem dos trechos de Vicente Pires.

Gabinete de crise

Diante dos estragos causados pela temporada de chuvas este ano, o GDF instalou, no início do mês, um Gabinete de Gestão de Crise na sede da Administração Regional da cidade. A principal atribuição é monitorar as ações emergenciais, coordenadas pelo subsecretário de Acompanhamento e Fiscalização de Obras (Suaf), Marcelo Galimbert. À época, o governo anunciou ainda que o titular da pasta, Izídio Santos, despacharia diretamente do local, às segundas e quintas-feiras. Mais de 10 órgãos públicos e secretarias fazem parte da força-tarefa.

Outra medida anunciada para atender com mais agilidade as reivindicações de moradores da região foi a criação de grupos de WhatsApp com a presença de pelo menos um assessor do GDF. Pela rede social, segundo o Executivo local, estão reunidos mais de 3,5 mil habitantes em 14 comunidades. A média de pedidos encaminhados por esse canal à Administração Regional é de 280 por dia.

* Estagiárias sob supervisão de Mariana Niederauer


Para Saber Mais

História da região
Vicente Pires começou com um processo da expansão da área rural da Colônia Agrícola de Águas Claras. Em 1989, um convênio intermediado pelo GDF e realizado por meio da Fundação Zoobotânica disponibilizou um contrato de uso do solo para a produção agrícola de 360 chacareiros. O prazo estipulado para o uso da região era de 30 anos. No entanto, diversos produtores parcelaram os terrenos irregularmente, dando início à construção de casas e condomínios. Rapidamente, a área rural se tornou uma área urbana e gerou impactos socioambientais para o local. A Lei n; 4.327, de 26 de maio de 2009, criou então a região administrativa Vicente Pires e a Administração Regional da cidade.


Entenda o caso

Captação de água pluvial

As obras de captação de água pluvial em Vicente Pires começaram em setembro de 2015, e a previsão inicial era de entrega em 2017. Ao custo de R$ 463 milhões, elas fazem parte do processo de regularização da cidade de 95 mil habitantes. A falta de um sistema de escoamento de águas é apontada como uma das principais razões para o surgimento de buracos em todas as ruas da região. Os recursos para a execução do projeto da rede de captação e de um novo asfaltamento, entre outros itens de infraestrutura previstos para a região, foram liberados pelo governo federal por meio do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).